Compartir el post "O PT ganha a eleição, porém perde parte de sua histórica base eleitoral"
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Elementos inesperados (morte de Eduardo Campos) e tendências já anteriormente verificadas (recessão e desgaste político do lulismo) fizeram com que as tendências eleitorais sofressem muitos revezes. Até a divulgação do resultado, na noite do dia 26 de outubro, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ninguém em sã consciência fazia apostas categóricas sobre quem seria o/a vencedor/a.
É verdade que Dilma triunfou, e esse não é um dado menor depois de 12 anos de gestão petista. Porém, a pouca diferença de votos indica que os problemas que estavam colocados antes da eleição (deterioração económica, emergência da juventude nas ruas em junho de 2013 e etc.) não foram resolvidos.
O resultado da eleição presidencial confirmou tendências que já vinham expresando-se em eleições anteriores, ou seja, um profundo desgaste dos goverrnos do PT. Tendência que agora poderão expressar-se em um processo político de conflito ainda maior, isso não apenas no âmbito palaciano, mas também na luta de classes.
A campanha eleitoral de 2014 foi a mais polarizada desde 1989, quando Lula foi derrotado por Collor de Melo. A apertada vitória de Dilma Rousseff, com 51,6% dos votos válidos sobre Aécio Neves, que obteve 48,4%, reflete bem esse cenário de polarização política, além de indicar contornos políticos mais estruturais que podem ser decisivos no do próximo governo.
A eleição confirmou uma tendência que já vinha verificando-se desde a eleição de Lula para o seu segundo mandato, a partir de 2005. O PT na segunda eleição de Lula realiza uma importante mudança em sua base eleitoral, pois é a primeira vez que passa a contar com votos do proletariado mais empobrecido, notadamente das regiões norte e nordeste e das periferias das grandes cidades. No entanto, isto tem ocorrido a custas do esvaziamento da base eleitoral no interior da classe operária.
PT cada vez mais distante e de costas para a classe operária
Na eleição do dia 26 de outubro esse deslocamento eleitoral não apenas se mantém, mas também se aprofundou. No mapa eleitoral, Dilma aparece com uma votação esmagadora nas regiões norte e nordeste e derrotada nas regiões sul e sudeste. Mesmo nas regiões periféricas das grandes cidades e nos cinturões industriais de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, Dilma foi derrotada por Aécio.
Em São Bernardo do Campo, no ABC paulista, o mais importante cinturão industrial de São Paulo, berço do PT e do lulismo, Dilma foi derrotada: Aécio obteve 55% contra 44% de Dilma. Nessa região o governo só não foi derrotado em Diadema. Não podemos, com os dados que dispomos até agora, definir qual foi exatamente o percentual da classe operária que votou na oposição de direita, mas os números indicam claramente a tendência de perda de base político-eleitoral do PT na classe trabalhadora industrial.
É evidente que não se trata, como quer fazer crer o marketing político do PT, de que a eleição refletiu uma divisão entre pobres e ricos. Muito ao contrário, o PT, da mesma forma que o PSDB, é um partido que governa voltado para os interesses do grande capital, com a diferença que dá um pouco mais de ênfase para programas de compensação social; a realidade é que o PT sofreu uma espécie de “voto castigo” de uma parte fundamental da sua base social histórica: porções da classe operária industrial negaram-se em votar no PT, un dado chave que deve ser analisado com mais rigor mas que já está indicando uma decepção com a gestão deste partido, um posicionamento crítico pelo não cumprimento de suas promessas a respeito do núcleo fundamental da classe operária do país.
Enfrentamentos mais radicalizados entre as classes se avizinham
Tudo indica que o governo terá um segundo mandato mais difícil do que o primeiro. O arranjo político que está à frente do governo federal desde 2002 ganha contornos ainda mais marcantes com o deslocamento de uma maior parcela da burguesia para a oposição e devido à acentuação da perda de base eleitoral nos centros urbanos, inclusive entre a classe operária. O governo poderá manter a maioria no congresso nacional, mas com o crescimento da oposição – tanto no parlamento quanto no governo dos estados – e a fragmentação ainda maior dos partidos, a engenharia para montar a base de apoio será mais complexa e exigirá do governo mais concessões.
Como a economia nacional, a sua balança comercial e as contas públicas nos últimos anos, apesar do crescimento do consumo interno devido à popularização do crédito, aprofundou a dependência das exportações de commodities e do investimento externo, não podemos vislumbrar saídas para a estagnação capitalista sem soluções políticas que enfrentem interesses sociais. Porém, longe de enfrentar os interesses capitalistas, Dilma continuará a desenvolver políticas contra os trabalhadores, como cortes orçamentários nos setores sociais, aumento de preços, arrocho salarial dos servidores públicos, reformas trabalhistas e etc; suas primeiras declarações depois de ser reeleita têm sido para “acalmar” os mercados.
Entramos em um novo equilíbrio de forças que, mesmo findando a pseudo polarização que marcou a disputa eleitoral, terá repercussões no terreno político real da luta de classes. O próximo governo de Dilma aprofundará o seu perfil patronal, pois a economia nacional/mundial tende a se manter em recessão, cenário no qual será colocada em questão, de forma incontornável, a correlação de forças aberta em junho de 2013.
Temos que aferir no próximo período como a classe trabalhadora irá reagir diante dos ataques (desemprego, que já cresce na indústria, arrocho salarial e carestia) que, certamente, virão do governo e dos patrões. A derrota de Dilma no ABC, e nas regiões operárias, pode – contraditoriamente – significar um desgaste não apenas do governo, mas também da burocracia lulista, o que abririam melhores condições para a luta e para a construção de alternativas sindicais e políticas independentes da classe trabalhadora e da juventude, apesar destes mesmos trabalhadores terem votado em Aécio por não enxergarem outra alternativa.
Esquerda socialista tem que reorientar sua política
É por isso que a política da esquerda socialista tem que ser ajustada aos novos desafios da luta de classes. O enfraquecimento de Dilma em seu segundo mandato não significa que serão feitas mais concessões aos trabalhadores, ao contrário, ela já deu claros sinais que irá apoiar-se ainda mais na burguesia. Assim, entramos em um cenário político que redobra a necessidade de superarmos a fragmentação dos setores da classe trabalhadora e da juventude que já romperam com a burocracia lulista e, também, da esquerda socialista que hoje se encontra em diversas organizações políticas.
Não basta apontar genericamente para a necessidade de lutar e construir uma alternativa somente a partir de sua própria organização, como faz o PSTU que em seu balanço eleitoral, vejamos: “nas lutas, a outra grande tarefa da classe trabalhadora é construir uma alternativa política própria, independente da burguesia, que possa unir verdadeiramente todos os trabalhadores, a juventude, o povo pobre e oprimido desse país contra os ricos de verdade, os banqueiros, empresários e estes partidos patronais, de direita e de oligarcas com os quais o PT governa”[1]
É necessário superar esse estreitamento. A insistência do PSTU de que a solução da lacuna de direção política pode se resolver com um chamado a partir da sua própria organização e experiência militante é totalmente estéril. No Brasil, no limite da experiência política mais recente, não existe uma organização revolucionária que por sí só possa colocar-se na frente da construção de uma alternativa revolucionária única. Por isso, é necessário reabrir a discussão sobre a necessidade de construir um partido revolucionário com direito de tendência. Não se trata de um novo PSOL, mas de uma organização com um programa claramente revolucionário que possa agrupar o conjunto das correntes políticas para, a partir daí, realizar uma síntese que dê lugar a um partido revolucionário unificado sob a base do centralismo democrático.
Em relação à organização sindical, temos também que ter políticas para organizar ativistas em todo país que estão enfrentando-se com a burocracia em suas lutas; os rodoviários de São Paulo são exemplo de um setor que lutou recentemente e foi vitorioso, apesar e contra a burocracia sindical. Não podemos – como faz o PSTU – ficarmos acomodados nos marcos da CONLUTAS ou da ANEL (organização estudantil); é necessário aproveitar o desgaste da burocracia sindical e estudantil para construir organizações que abarquem os setores mais dinâmicos da luta de classes e que criem condições futuras para incorporar os bastiões mais importantes da classe trabalhadora, como os metalúrgicos do ABC, por exemplo.
O PSTU e a esquerda do PSOL devem convocar para o início do próximo ano um grande encontro nacional para organizar o conjunto do ativismo independente contra os ajustes capitalistas. A partir do Práxis, comprometemos todos nossos esforços militantes nesta perspectiva: lutar por uma iniciativa deste tipo que prepare a resistência contra o durísimo ajuste do novo governo de Dilma e do PT e que, seguramente, terá o apoio de Aécio Neves, do PSDB e demais partidos patronais.
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[1].- Ver no site www.pstu.org o texto “Dilma venceu, mas só a luta pode garantir mudanças e impedir retrocessos”.
Práxis – Socialismo ou Barbárie, 29/10/2014