Ene - 26 - 2015

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(  http://praxisbr.blogspot.com.br ) Após 11 dias de paralisação total da unidade da Volkswagen de São Bernardo do Campo,  uma das maiores montadoras de carros do mundo (conta aproximadamente com 12 mil empregados), a patronal foi obrigada a readmitir 800 trabalhadores.

Uma vez mais se demonstrou que com unidade os trabalhadores podem lutar contra os interesses da patronal e serem vitoriosos. A luta na Volks contou com o apoio ativo dos trabalhadores de todas as montadoras de São Bernardo do Campo (SP), ações de rua que paralisaram a cidade e uma solidariedade interna impressionante. Assim, por força da luta da base operária, a patronal foi obrigada a recuar e voltar atrás na demissão em massa.

Assim, começou o ano. Redução de direitos, aumento de tarifas, corte de gastos públicos, racionamento de água e apagões por todo o país. Dentro desse quadro que combina várias crises a previsão de todos os analistas é a de que no curto prazo a economia tende à recessão com altas taxas inflacionárias e aumento constante das taxas de juros.

Nesse cenário as demissões em massa serão o expediente mais usado pela patronal para continuarem lucrando às expensas das condições básicas de existência dos trabalhadores, ou seja, as demissões em massa tendem a se generalizar. Mas, a greve dos operários da Volks é um grande exemplo para a classe trabalhadora. Demonstrou que  é possível reverter demissões e sermos vitoriosos também em outras lutas, mesmo em uma conjuntura em que o governo e a patronal querem impor uma defensiva total para aplicar os seus «ajustes».

Outras vitórias podem ser conseguidas se prevalecer a unidade e a solidariedade entre os trabalhadores frente à fragmentação e ao isolamento provocado pelo governo, patronal e  burocracia pelega que dirige a maior parte dos sindicatos. Mas, para resistir e reverter as demissões em curso é necessário que sigamos o exemplo dos operários da Volks, ou seja, que tomemos medidas radicais, como: paralisação e ocupação total das fábricas que demitirem e construção da solidariedade ativa de todos os setores da classe trabalhadora e da juventude para apoiar as lutas operárias com grandes atos, passeatas e outras medidas para que nenhuma luta fique isolada.

Operários não podem baixar a guarda

Em dezembro do ano passado os trabalhadores da Volks não aceitaram uma proposta que foi feita pela patronal em comum acordo com a direção do sindicato dos metalúrgicos do ABC. Proposta que previa dois anos sem reposição salarial em troca de um bônus e um Plano de Demissão Voluntária (PDV) para 2100 tralhadores.

Como os trabalhadores disseram um sonoro não a essa proposta indecente, a patronal partiu para o ataque e demitiu 800 operários após as férias coletivas do final do ano. A direção do sindicato, que tinha acordo com a proposta da patronal, não mexeu sequer uma palha do início de dezembro com o objetivo de evitar as demissões. Assim, a importante vitória contra a patronal da Volks se deve única e exclusivamente aos trabalhadores que se mobilizaram por 11 dias de greve.

Parece que alguma coisa importante está mudando no cenário político nacional em relação a ruptura do longo ciclo de passividade dos trabalhadores assistido na última década. Ou seja, estamos vivendo um processo de indignação dos trabalhadores e da juventude que começou com a luta dos operários nas obras do PAC em 2011, explodiu em indignação popular em junho de 2013 e continuou com as greves radicalizadas (garis e rodoviários) no primeiro semestre de 2014.

Agora, com as demissões em massa na indústria por todos os lados, a greve da Volks pode ser o prenúncio de uma onda de lutas entre nos bastiões mais importantes da classe operária. Este setor da classe trabalhadora, que cumpriu um papel decisivo durante as décadas de 70 e 80, demonstrou que, apesar das mudanças geracionais vividas durante duas décadas, tem reserva de combatividade, principalmente frente a ataques como a demissão em massa vivida no começo do mês.

Vimos que o ABC pode voltar a se tornar um exemplo de luta para a classe e que pode se construir de forma rápida e efetiva a unidade entre os trabalhadores mesmo com uma direção totalmente colaboracionista frente a direção do sindicato. Foi isso que demostrou a greve da Volks. Os trabalhadores conseguiram ganhar essa luta não pela ação da direção do sindicato frente a greve, mas apesar dela. Em outras palavras, a greve foi fundamental para empurrar a estrutura sindical no sentido de contribuir para reverter as demissões.

Trabalhadores da Volks venceram uma batalha, virão outras

Apesar da greve ter sido claramente vitoriosa, pois o principal objetivo da luta era conseguir a readmissão dos 800 trabalhadores, o acordo assinado para reverter as demissões, apesar de ser um pouco melhor do que rejeitado no ano passado, mantém basicamente os mesmos ataques sobre os trabalhadores da fábrica. Vejamos: em 2015 será pago um bônus salarial que não será incorporado aos salários, em 2016 apena a inflação mais 1% de aumento salarial, além de ser mantido o PDV para 2100 trabalhadores.

É claro que com outra direção e com uma politica adequada a partir do sindicato se poderia ter um vitória mais acapachante contra a patronal. A CUT também não desenvolveu uma luta política nacional para que o acordo se desse em melhores condições para os trabalhadores da Volks, limitando-se a «pedir o penico» a Dilma. Esta central, totalmente adaptada e burocratizada, opera com a mesma lógica do governo (Dilma), quer encontrar um meio termo entre os interesses dos patrões e dos trabalhadores, como se fosse possível diante de interesses antagônicos encontrar um ponto de equilíbrio.

A burocracia cutista queria um acordo que fosse bom para “todas as partes”. Seria a melhor opção para não entrar em conflito com o governo, que não se dignou declarar absolutamente nada sobre a greve e as demissões que estão ocorrendo por todo o país, evidentemente porque é cúmplice da ação da patronal com sua política, e com os patrões. O que está demonstrado mai uma vez é que, ao contrário do que afirmam seus defensores, em momentos de crise Dilma se coloca a favor da patronal.

A CUT, em parceria com o governo de São Bernardo do Campo e do governo federal, não queria que a greve ocorresse, uma vez inevitável tentou que essa não fugisse dos limites do «sindicalismo cidadão». A direção do sindicato teve que ir para além da sua política ao ser pressionada pela base que esteve a frente de piquetes diários para resistir a pressão da patronal, garantindo assim uma paralisação de 100% da produção. De outra forma, sem esse método de luta, as demissões não seriam revertidas, é isso que vimos verificando em muitas outras fábricas. O papel da direção dos sindicatos na maioria das vezes acaba sendo o de colaboração com a patronal. Só nos casos que são ameaçados de perder a direção é que tomam alguma medida para não parecerem tão patronais.

Por certo, a patronal da Volks, apesar do acordo assinado e a depender da dinâmica da economia e da correlação política de forças, fará outras investidas contra os trabalhadores. Mas, a reversão das demissões foi uma batalha decisiva para continuar a luta tanto na Volks quanto nas demais fábricas contra a ofensiva patronal e governamental que está em curso.

É preciso aproveitar as possibilidades para o sindicalismo independente e combativo

Quando os trabalhadores superam os limites estabelecidos pela burocracia a esquerda tem maiores possibilidades de apresentar sua politica, denunciar as traições, emplacar no movimento uma politica que atenda as necessidades da luta para ajudar os trabalhadores a superarem as direções pelegas.

É o PSTU, como direção majoritária da Conlutas, a corrente que tem hoje as melhores condições de organizar a esquerda para uma disputa sem tréguas com a burocracia governista. Mas, infelizmente, tem perdido essa oportunidade ao não desenvolver uma luta política cotidiana contra a burocracia e nem aproveitar os momentos de radicalização para ampliar o diálogo com os trabalhadores que estão organizados na base da CUT.

Nos momentos em que os trabalhadores estão ultrapassando os limites da burocracia sindical como, por exemplo, durante a recente greve na Volks, não faz nenhuma critica consistente à direção colaboracionista. Claro que durante uma luta o mais importante é agir para que os trabalhadores sejam vitoriosos, mas muitas vezes a denúncia da burocracia é decisiva para a vitória imediata de uma luta.

Mas, mesmo após a greve, a formalidade com que tratou a questão da vitória dos trabalhadores é incompreensível. Não tece caracterizações fundamentais, ou seja: a vitória é decisiva para o atual momento político; o que exigirá um duro enfrentamento com o governo e com os patrões; que é necessário superar a colaborador da burocracia com a patronal; que a política do governo Dilma tem lado e esse lado é o da patronal; muito menos dá uma política para disputar a base metalúrgica do ABC, que depois de décadas está voltando a se mobilizar.

Infelizmente é um setor que parece estar amarrado à lógica de adaptação aos aparatos já conquistados e estabelecidos, o que significa uma relação diplomática com as centrais pelegas, uma espécie de respeito à «soberania do território sindical». É por isso que qualquer um fica surpreso ao ver o artigo «Greve na Volkswagen conquista a readmissão de 800 trabalhadores» ( http://www.pstu.org.br).

Não apresentam nenhuma proposta ou chamado para que os trabalhadores se organizem de forma independente da burocracia cutista, limitando-se a exigir que o governo proíba as demissões. O que é no geral é correto. Porém, essa exigência desconectado da denúncia do papel que Dilma tem cumprido nestes últimos anos acaba sendo uma política que alimenta ilusões e não prepara para a luta. Ou seja, a Conlutas, sob direção do PSTU, tem apresentado uma politica que não disputa os trabalhadores com a burocracia sindical,  não contribuindo assim para que os trabalhadores compreendam os desafios enormes que têm pela frente.[[1]]

Essa perspectiva fez com que o PSTU e a Conlutas não mobilizassem o aparato sindical que dirigem para realizar uma campanha nacional para dar maior visibilidade à greve da Volks. Sem se enfrentar com a burocracia governista não se pode criar condições para disputar a direção do movimento operário. Nos idos da década de 80, quando as condições de militância da esquerda revolucionária eram muitas vezes piores do que a atual, foi efetivada uma disputa muito mais efetiva com a burocracia lulista, mas isso se fez a partir de uma estratégia de enfrentamento político sistemático dentro e fora das fábricas.

Em momentos cotidianos, quando os trabalhadores não estão mobilizados e unidos em uma luta que ultrapasse o seu controle, a burocracia tem encontrado atualmente liberdade total  para colaborar com a patronal, defender as políticas entreguistas do governo e fortalecer o seu controle sobre a organização dos trabalhadores sem uma contrapartida classista a partir do sindicalismo combativo.

Contraditoriamente, hoje, mesmo dispondo de mais estrutura organizativa, a esquerda independente, particularmente o PSTU, tem cumprido um papel muito mais ameno no sentido de denunciar as manobras e armadilhas que a burocracia monta contra a luta dos trabalhadores. Mas, os metalúrgicos do ABC estão a partir da sua experiência de luta demonstrando que podem ultrapassar a burocracia cutista. Então, nesse momento, se a esquerda independente não quiser ser também deixada para traz, deve romper com toda a acomodação e se colocar à altura da nova fase de lutas que está se abrindo.

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[1].- [1]. A LER-QI, grupo muito menor do que o PSTU, vai no mesmo caminho em seu artigo, não critica a CUT e nem o PSTU que dirige a Conlutas.

Práxis - Socialismo ou Barbarie, 23/01/2015

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