Mar - 17 - 2015

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As manifestações do último domingo, 15 de março, reafirmam que entramos em uma nova conjuntura que requer da esquerda um esforço de interpretação e de superação da inércia política se não se quer ser ultrapassado totalmente pela realidade.

Atos da direita mobilizam milhões por todo o país

No domingo, dia 15 de Março, estima-se que cerca de 2 milhões de pessoas estiveram presentes nos atos de oposição ao governo. Em todos os 26 estados da federação, em 160 cidades e em algumas cidades fora do país houve manifestações que levantavam a bandeira da luta contra a corrupção na Petrobrás e pelo impeachment de Dilma Rousseff.Grandes manifestações ocorreram em várias capitais. Dados da Polícia Militar (PM)- não confiáveis – dão conta de 80 mil manifestantes em Curitiba, 40 mil em Brasília, 24 mil em Belo Horizonte e 15 mil no Rio de Janeiro. Em outras cidades a concentração foi menor.

Em São Paulo aconteceu a mobilização mais numerosa. Por uma diferença metodológica a PM deu 1 milhão de pessoas e o Instituto Data Folha 210 mil. Esses atos,apesar do total apoio político não foram convocados diretamente pelos partidos da oposição burguesa (PSDB ou DEM) mas sim pelas redes sociais através de movimentos neoconservadores intitulados como “Brasil Livre”, “Vem pra rua” e outros. É inegável que o sucesso das convocações contou com a participação da grande mídia que dava notas constantes sobre as manifestações com tom de convocação.

No domingo à noite, após as manifestações, dois ministros de Dilma Rousseff, Miguel Rosseto (Secretaria Geral) e José Eduardo Cardoso (justiça), foram destacados para dar entrevista coletiva sobre os protestos. O centro da entrevista foi dizer que as manifestações vinham de setores que não tinham votado em Dilma (Rosseto), que o governo apoia as investigações de corrupção, que está aberto ao diálogo com todos os setores (Cardoso) e que irá enviar ao Congresso um pacote de combate a corrupção e impunidade.

Da mesma forma que ocorreu no domingo passado, quando Dilma falava em Rede Nacional de Rádio e TV, durante a entrevista coletiva houve panelaço e buzinaço em várias cidades. Diante ainda do impacto das manifestações, na segunda-feira, dia 16 de Março, a própria presidente, após um ato oficial para anunciar o novo Código Civil, acabou dando uma entrevista coletiva sobre o tema. Reafirmou o discurso dos ministros no domingo e acrescentou que o ajuste fiscal era fundamental para o Brasil e que irá anunciar medidas de combate à corrupção e breve.

Polarização política que tem como pano de fundo o esgotamento do “pacto lulista”

A derrota da greve dos metroviários, a dura repressão policial contra as manifestações na Copa do Mundo e o processo eleitoral cumpriram o papel de arrefecer as mobilizações populares. Mas, apesar da ofensiva do governo e dos patrões contra os trabalhadores durante a Copa e da vitória (apertada) de Dilma nas eleições os problemas políticos só se acumulam.

Após o processo eleitoral, no qual o governo foi reeleito com uma margem estreita de votos com o argumento que a oposição iria aplicar políticas neoliberais, cortar direitos e acabar com políticas sociais, a primeira medida do governo foi elevar a taxa de juros. Em seguida foi escolhido o notório economista neoliberal Joaquim Levy para como Ministro da Fazenda e anunciado um pacote que medidas que restringe o acesso ao seguro desemprego, pensão por morte e outros benefícios. Para coroar a linha abertamente neoliberal, o governo no final do ano contingenciou 30% do orçamento federal.

Além dos problemas econômicos, o governo vem perdendo sistematicamente a sua base de sustentação política. Arecessão, associada à alta inflacionária e à desvalorização cambial, encontra no rápido crescimento do desemprego um componente potencialmente explosivo. As baixas taxas de desemprego eram um forte ponto de apoio do governo entre as massas trabalhadoras.

Agora, além das denúncias de corrupção na Petrobrás, que atingem diretamente altos dirigentes petistas eda perda de controle da base governista no Congresso Nacional, o governo enfrenta milhões pedindo o seu impeachment nas ruas.

As manifestações de domingo tiveram como componentes indiscutíveis uma composição social de classe média, eleitores da oposição burguesa (em São Paulo pesquisa do Data Folha informa que 82% dos participantes votaram em Aécio Neves nas últimas eleições presidenciais) e que foram mobilizados a partir da defesa do impeachment e de um programa anticorrupção conservador.

Por motivos óbvios, os organizadores do 15M e os grandes meios de comunicação quiseram dar um caráter “apartidário” para as manifestações. Não teve espaço para figuras de ultra direita, como o Deputado Jair Bolsonaro (PP) que foi vaiado e impedido de falar durante o ato no Rio de Janeiro, e para outros representantes dos partidos burgueses.

Apesar do disfarce “democrático” e “antigovernista” das manifestações de Domingo elas jogam água no moinho do que há de mais conservador no cenário político nacional.

Além disso, fortalecem a linha do governo federal no sentido de impor duras medidas contra direitos dos trabalhadores, bem como cortes orçamentários e congelamento do salário dos funcionários públicos.

Não foi por acaso que o centro da fala de Dilma Rousseff na entrevista coletiva de segunda-feira foi que a política de ajuste fiscal é fundamental para o país. O governo, contraditoriamente, se apoia nas manifestações conservadoras para se fortalecer e aprovar no Congresso o ajuste fiscal que, como já apontamos anteriormente, tem centralmente um caráter antioperário.

Romper inércia da esquerda socialista é decisivo

Para além da massividade e do caráter político direitista das manifestações, o mais perigoso na conjuntura atual e o que mais causa preocupaçãoé que as manifestações galvanizaram não apenas a classe média branca e psdebista.

A conjuntura atual guarda uma importante dose de perigo, isto porque sem uma intervenção política da classe trabalhadora e da juventude se corre o risco de que a situação de maior polarização e politização aberta em Junho/2013 seja sequestrada pela direita. Esse, a nosso ver, é o principal problema com o qual deve se preocupar a esquerda independente.

Repetindo nas ruas o fenômeno das últimas eleições, na qual o PT perdeu apoio eleitoral em todas as regiões operárias, setores da classe trabalhadora descontentes também foram mobilizados pelas redes sociais e pela grande mídia nos atos de Domingo.

Por outro lado, desde o começo do ano uma série de lutas dos trabalhadores ocorre por todo o país. Podemos citar brevemente as greves, com ocupação parcial das fábricas, dos metalúrgicos da Volks (São Bernardo do Campo) e da GM (São José dos Campos) contra demissões em massa, greves e lutas dos trabalhadores da construção civil, a greve radicalizada dos professores do Paraná, a atual greve dos professores de São Paulo e outras lutas.

Mesmo na manifestação em defesa da Petrobrás e contra o impeachment no último dia 13 de junho foi trabalhoso para a CUT esconder o descontentamento com as políticas antioperárias de ajuste que o governo quer impor.

Então, o problema que temos aqui é que, apesar da classe trabalhadora estar mobilizada e até utilizando métodos radicalizados de luta, não dispomos até o momento de um instrumento capaz de organizar o descontentamento de amplas massas trabalhadores e populares com o governo pela esquerda e com uma plataforma política independente dos patrões e do governo.

O mais dramático do atual momento é que essa situação, na qual as forças reacionárias conseguem colocar milhões nas ruas enquanto a esquerda coloca poucas centenas, não acontece por razões de ordem objetiva, pela derrota da classe ou pela ausência de condições objetivas. A grande ausente aqui são as condições subjetivas, pois amplos setores das massas trabalhadoras já estão em marcha contra os ataques as suas condições de vida nas greves por emprego, salário ou direitos.

Por isso, é necessário construir um espaço de mobilização política que seja independente dos patrões e do governo. Espaço este que aglutine os setores que estão mobilizados e os que não estão diretamente para que se possa realizar ações políticas de massa e dar uma alternativa aos setores da classe trabalhadora que está sendo seriamente disputados pela direita.

Está conjuntura política tende a se estender, pois as condições políticas e econômicas não permitem uma solução rápida para este ou para aquele lado. Assim, a polarização entre governo e oposição de direita irá marcar o cenário político nacional nos próximos meses. O que não podemos permitir é que os trabalhadores fiquem encurralados ou mesmo sendo disputados pelo governo ou pela direita tradicional sem que uma alternativa classista seja construída em um momento de efervescência de lutas.

As maiores organizações da esquerda, como o PSTU e o PSOL, têm uma enorme responsabilidade na tarefa de lutar pela construção de uma alternativa classista ampla para os trabalhadores e para a juventude combativa. Precisamos romper com a inércia e dar passos concretos para nesse momento criar uma ampla frente de luta e uma plataforma política que represente os interesses fundamentais da classe trabalhadora.

Não podemos desconsiderar que hoje é a CUT que dirige a ampla maioria dos sindicatos e das categorias mais importantes dos trabalhadores. Em um momento de polarização dos trabalhadores pela direita temos que exigir que essa burocracia rompa com a política do governo e defenda os interesses dos trabalhadores. Sabemos que essa burocracia governista e pelega vai ter que dar alguma satisfação para a sua base diante das demissões, arrocho salarial e perda de direitos. Mas, não se trata de fazer uma exigência diplomática para que a CUT mobilize contra os ataques, temos que fazer essa exigência diretamente em sua base, nas fabricas e demais locais de trabalho e de estudo.

Pensamos que é necessário criar uma alavanca para mobilizar setores mais amplos dos trabalhadores e da juventude para poder exigir que os principais sindicatos mobilizem contra os ataques do governo. Assim, para criar as condições necessárias e disputar parte da base da CUT e do PT, CSP-Conlutas, Intersindical e demais organizações independentes devem convocar com urgência um encontro para organizar um calendário de lutas e uma plataforma política mínima alternativa frente o avanço da direita.

Declaração Práxis - Corrente Internacional Socialismo ou Barbárie, 17/03/2015

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