8 de Março: Mulheres em luta!
Por Adriana Araujo
Práxis,
março 2008
O
8 de março foi conquistado à custa da morte de 129
trabalhadoras de uma fábrica de tecidos dos EUA que
reivindicavam melhores condições de trabalho e foram
queimadas vivas pelo patrão.
Não
se trata de um dia para flores e presentes, é um dia de
luta, porque ainda há muito a fazer: as mulheres ainda
sofrem com a jornada dupla de trabalho, são vistas como
responsáveis por tarefas do lar – tidas como
eminentemente femininas; sofrem com a violência doméstica;
são vítimas de assédio sexual e moral; recebem salários
menores que os homens, mesmo desempenhando as mesmas funções;
a figura feminina é exposta insistentemente como objeto
sexual; não têm acesso a serviços de saúde de qualidade;
são vítimas de discriminação; vivem sob ameaça da
diminuição da licença maternidade; têm o direito de
decidir sobre o seu próprio corpo constantemente ameaçado.
Infelizmente,
como em outras frentes de luta, a causa feminista durante o
governo Lula sofreu um grande processo de burocratização e
institucionalização, que se reflete no retrocesso das
bandeiras de luta e na constante crise no interior da marcha
de mulheres. Além disso, ainda durante
o governo Lula, apesar dos discursos dos setores do
movimento de mulheres ligados ao governo (PT e PcdoB) a
situação das mulheres pouco mudou: as mulheres estão
entre a maioria dos desempregados, dos empregos precarizados
e mal pagos. Além do mais, diante da atualidade das políticas
neoliberais, as mulheres sofrem primeiramente suas conseqüências,
seja por meio do desemprego ou da destruição dos serviços
públicos.
A
reforma da previdência não foi finalizada, a diminuição
da licença maternidade é uma ameaça, a universalização
do acesso à saúde ainda é um desafio, a falta de
qualidade na educação é crescente, todas essas questões
afetam diretamente a vida da mulher, tendo em vista que
recaem sobre ela as responsabilidades no cuidado da casa e
dos filhos.
Dentre
as históricas bandeiras do movimento de mulheres, sem
sombra de dúvida, o direito ao aborto tem se colocado como
bandeira central a ser defendida pelo conjunto das forças
socialistas e pelo conjunto do movimento feminista, sendo um
direito democrático básico que no Brasil assume características
de problema de saúde pública.
Hoje,
os setores mais conservadores da sociedade estão unificados
em uma aliança composta pela Igreja Católica, partidos de
direita e desgraçadamente Heloisa Helena, que
desrespeitando as deliberações do I Congresso Nacional do
PSOL, vem se prestando ao triste papel de dar sua
legitimidade a essa campanha arqui-reacionária.
É
nesse marco de ofensiva conservadora que se insere a
Campanha da Fraternidade de 2008, patrocinada pela Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que parte de um discurso moralizante,
superficial e preconceituoso, carregado com a idéia do
pecado e da punição, e tenta ganhar a opinião pública.
Em nome da defesa da vida, essa instituição secular
desconsidera os agravos à saúde, as dificuldades sociais e
econômicas e principalmente a capacidade da mulher decidir
se deve ou não levar uma gravidez até o fim.
Campanha
da Fraternidade 2008: Igreja ataca o direito ao aborto
A
CNBB lançou em 06/02 a Campanha da Fraternidade (CF) 2008.
O tema da campanha é “Fraternidade e defesa da vida” e
o lema é “Escolhe, pois, a vida”. O objetivo da
campanha é propagandear a posição da Igreja contra a
legalização do aborto, contra a realização da eutanásia,
contra a reprodução assistida e contra as pesquisas com células-tronco.
Ou seja, em pleno século XXI, avanços da ciência e
tecnologia no sentido de prolongar ou dar mais qualidade à
vida das pessoas são rechaçados pela Igreja Católica em
nome da “defesa da vida”.
Em
documento intitulado “Síntese do texto base” presente
na página da CNBB, são feitas várias alegações contrárias
ao desenvolvimento científico, ao aborto e a eutanásia,
tidos como ameaças à vida. É questionado o número
apresentado por entidades em defesa do aborto sobre mortes
maternas em decorrência de aborto ilegal – 300 mil mortes
no Brasil – e apresentado um dado do DATASUS, referente a
2002, que indica a ocorrência de 115 mortes maternas em
decorrência de abortos.
O
documento aponta que o aborto e a eutanásia são posturas
de não-acolhida à vida que tendem a gerar realidades cada
vez menos acolhedoras e mais violentas. A Igreja aponta a
necessidade de uma postura de acolhida incondicional, ainda
que com dor e sofrimento. Além disso, na iminência da
morte, sustenta que esta deve ser encarada como grande
momento da vida, como momento da redenção, dos cuidados
paliativos, da obstinação terapêutica e da resistência
à eutanásia.
A
Igreja entende a possibilidade de ter um filho como conseqüência
de um dom e não de um direito, condena, portanto qualquer
esforço na reversão da esterilidade
conjugal. No tocante ao direito ao aborto o texto aponta
como falso o discurso do “mal menor”, alega que um erro
não justifica outro, aponta o direito à vida para todos e
que tal conduta levaria à destruição da ordem. Por
fim, afirma a dificuldade crescente da consciência no
sentido de discernir entre o bem e o mal e o conseqüente
risco decorrente de tal dificuldade para a justiça e o bem
comum.
Respostas
às posições da CNBB
O
aumento da expectativa de vida, principalmente com maior
qualidade, o êxito no combate a determinadas doenças, o
diagnóstico precoce e a prevenção de doenças são ganhos
inestimáveis advindos do desenvolvimento científico que
beneficiam a sociedade. Existem usos menos nobres do
desenvolvimento científico, mas não servem como
justificativa para que se invalide seus resultados
positivos.
O
dado apresentado pelo documento sobre mortalidade materna é
claramente irreal e facilmente questionável por
desconsiderar que por ser o aborto uma prática ilegal,
muitos casos não alimentam as estatísticas oficiais. As
organizações de apoio às mulheres se confrontam
cotidianamente com uma realidade que os números oficiais não
conseguem penetrar, realidade marcada pelo abandono e pela
violência. Essa realidade a Igreja insiste em não
considerar, ela prefere fechar os olhos diante das mortes de
mulheres, na sua maioria pobres, em nome de uma moral
patriarcal que transforma as mulheres em meras reprodutoras
desprovidas de vontade própria, tendo que ser tuteladas.
A
legalização do aborto significa reduzir a mortalidade
materna ou as seqüelas decorrentes de procedimentos
realizados em condições desfavoráveis; significa dar à
mulher liberdade de escolha e poder de decisão sobre o seu
próprio corpo; significa entender a vida de maneira
ampliada, ou seja, cheia de potencialidades para uma vida
com qualidade, plena e feliz; significa evitar o sofrimento
de uma pessoa e das que a cercam por estar condenada a uma
vida de limitações, dores e sofrimentos.
A
legalização do aborto não pode prescindir da existência
do acesso à saúde pública com qualidade, de políticas de
orientação sexual e de distribuição gratuita de
contraceptivos.
Próximos
passos
É
preciso organizar um bloco socialista e classista para
levantar as bandeiras históricas do movimento de mulheres,
um bloco que seja capaz de ser uma alternativa para as
milhares de mulheres que todos os dias são vitimas dos
abortos de fundo de quintal, que são obrigadas a vender seu
corpo em troca de algum dinheiro e que recebem os menores
salários. Nesse sentido fazemos um chamado às companheiras
do PSTU e demais companheiras do PSOL para que reproduzamos
esse ano a vitoriosa coluna do ano passado e que juntas
demos passos a um movimento de mulheres socialista e
classista.
A
luta feminista não pode ser uma
luta apenas das mulheres, é necessário que os companheiros
e as organizações de esquerda e sindicatos integrem
uma campanha permanente contra todos os setores reacionários
e ajudem a organizar um 8 de março forte e guerreiro, cujas
bandeiras não sejam guardadas ao fim do dia, pois a luta
deve continuar durante todos os dias do ano.
Por
isto defendemos:
*
O corpo da mulher pertence à mulher
*
Contraceptivos para não engravidar, aborto livre e gratuito
para não morrer
*
Educação sexual laica e cientifica em todas as fases da
vida da mulher
*
Trabalho igual, salário igual
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