Brasil

Os acontecimentos na Universidade de São Paulo (USP)

Um balanço inicial

Práxis, 20/06/09

Os acontecimentos que se seguiram a partir do dia 5 de março na Universidade de São Paulo (USP), data em que foi deflagrada a greve dos funcionários, por seu profundo significado merecem que façamos um balanço inicial

No dia 20 de maio foi realizada uma importante Assembléia de Estudantes, com mais de 300 companheiros, na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo[1] (FAU). Apesar de uma parcela importante dos estudantes demonstrarem uma crescente disposição de luta, devido principalmente a intervenção claudicante da direção (PSTU, apoiado pelo PSOL) do Diretório Central dos Estudantes (DCE), se limitou a votar por mais uma Assembléia na próxima semana. Era possível votar uma proposta concreta de paralisação e outras atividades (atos, passeatas) em solidariedade aos funcionários, em greve há 5 dias, e pelos eixos comuns, tirados entre funcionários, professores e estudantes, e específicos dos estudantes.

As resoluções, pela política claramente antimobilização da direção do DCE, não apontaram para lugar algum. Este resultado tem dois responsáveis diretos, por um lado, o PSTU, que dirige o DCE e que tinha maioria na assembléia. O problema é que predominou – e irá predominar em ouros momentos – um calculo mesquinho, ligado a interesses estranhos aos da luta, fez com que os estudantes não saíssem armados com uma data de inicio da greve estudantil, bem como com um calendário de luta que possibilitasse aos estudantes da USP em conjunto com dos demais estudantes das estaduais paulista enfrentarem os ataques da reitoria e do governo Serra. Por sua vez, um importante setor encabeçado pelo Movimento Negação da Negação (MNN) sustentou durante toda assembléia uma posição sectária, isto é, que a greve deveria ser votada naquele momento, sem demonstrar nenhuma preocupação com a sua preparação.

Também nos chamou atenção a passividade dos companheiros de A Plenos Pulmões (LER–QI), sobretudo se levarmos em conta sua responsabilidade como co–direção do SINTUSP. Suas intervenções giraram em torno de questões gerais, se abstendo de uma luta direta para votarmos uma data concreta para o início da greve. Ante a passividade burocrática do PSTU e ao sectarismo do MNN, ao invés de proporem a greve a partir da próxima semana, se abstiveram na principal votação da assembléia que foi a de iniciar a greve ou não. Desta forma, foi aprovada apenas mais uma assembléia para o dia 28 de maio e a participação no ato dos funcionários em frente a reitoria no dia 25 de maio.

DCE da USP deixa vazio político, cria divisão entre estudantes e mantém política antimobilização

Mediante a tendência crescente de mobilização e enfrentamento dos estudantes o vazio político deixado pela direção do DCE causou uma perigosa fragmentação do movimento frente aos enormes desafios colocados pela truculência de José Serra (governo do Estado de São Paulo pelo PSDB) e Suely Vilela (Reitoria da USP). Assim, diante da truculência da reitora, que não permitiu a entrada de Brandão (líder sindical demitido por perseguição política) na negociação no dia 25 de maio e da ausência – inclusive física – da direção do DCE, um setor dos estudantes que participaram do Ato ao não ter uma única orientação para lutar realizaram uma ocupação parcial da reitoria. A ausência política da direção do DCE, e de outros setores que têm responsabilidade efetiva na direção do movimento e a política sectária (MNN e outros) levaram os estudantes à divisão frente a esta ação. Para coroar a sua ação antimobilização, a direção do DCE se ausentou politicamente da cena e logo após a ocupação da reitoria e da divisão notória entre os estudantes aprece e convoca uma plenária para “organizar” os estudantes em uma plenária que acabou votando pela retirada das dependências da reitoria.

A assembléia do dia 28 de maio a direção do DCE não mudou de postura política e continuo com a tática de adiar o movimento grevista dos estudantes. Agora a proposta da direção do DCE (Pstu apoiado pelo Psol) era a de um “indicativo de greve para discutir nos cursos”, ou seja, mais uma vez apostaram nas tendências contrárias à luta. Outros setores (MNN e CIA) propunham a “greve imediata com radicalização” e a Lerq “greve a partir do dia 4 de abril”. A formulação a nosso ver, que captava melhor a dinâmica ascendente da mobilização era a da “greve imediata” tendo claro que a dinâmica e as necessidades do movimento são os que definem melhor as táticas a serem adotadas no decorrer da luta. Votou, assim, pelo indicativo de greve. A partir daí a direção do DCE apresentou uma proposta escandalosa, a de fazer a próxima assembléia apenas no dia 10 de junho, véspera de feriado e do Congresso Nacional dos Estudantes. Esta proposta se passasse colocaria o movimento na geladeira durante duas semanas, sendo que os enfrentamentos com a reitoria já indicavam uma radicalização do processo. Felizmente essa proposta foi derrotada e a próxima assembléia foi marcada para o dia 4 de junho.

Mediante a repressão policial contra a liberdade de organização dos trabalhadores da USP estudantes votam pela greve

No dia 1 de junho, a “força tática” da polícia militar do Estado de São Paulo, sob as ordens da reitoria e do governo Serra, atentou contra o direito democrático de livre organização sindical dos funcionários da USP, dispersando os grevistas que realizavam o piquete (método histórico, democrático e legítimo de efetivação da vontade da maioria dos trabalhadores em luta) em frente à Reitoria. Este fato é a gota d’água! A greve dos funcionários, que articula uma série de reivindicações decisivas para a manutenção do caráter público e democrático da USP, tais como, a liberdade de organização sindical e estudantil (violentada pela demissão de Brandão e pela enxurrada de processos e indiciamentos de estudantes e funcionários), mais verbas para a educação, manutenção dos postos de trabalho, qualidade de ensino (hoje sintetizada na luta contra a instituição da Universidade Virtual), deve ser coberta de solidariedade pelos estudantes e professores.

A Assembléia do dia 4 de junho já se deu em um patamar totalmente distinto de mobilização, pois a ação da tropa de choque sob as ordens da reitoria fez o pêndulo se voltar para a proposta de greve. Infelizmente devido a votação de encaminhamento das discussões de ir direto para as defesas de propostas se perdeu uma grande oportunidade de fazer um grande exercício de avaliação da situação geral da luta na USP. Mas, de qualquer forma, a assembléia foi fundamental, pois acabou votando pela greve dos estudantes, o que coloca em outro patamar a mobilização pela derrubada da reitora, pelas eleições diretas, pelo fim da Univesp, pela reincorporação de Brandão e pelo atendimento a todas as pautas econômicas dos funcionários.

Após ataque da Tropa de Choque direção do DCE age de forma burocrática

Após os ataques da tropa de choque, parte dos alunos se refugiou no interior do prédio da História e Geografia, parte tomou a avenida em frente aos prédios da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) para realizar uma assembléia/vigília e exigir a libertação dos presos políticos e discutir novos encaminhamentos. Mesmo com a maioria dos estudantes a favor de realizar uma assembléia na avenida ocupada a direção do DCE após discussões no interior do prédio da história não encaminhou a vontade da maioria. Um membro de DCE simplesmente impediu que estudantes falassem ao microfone para encaminhar a proposta vitoriosa de realizar a assembléia na avenida.

A Assembléia foi instalada e prontamente uma mesa de coordenação dos trabalhos foi eleita pela assembléia. Passados vários minutos do início da assembléia membros do DCE tentam uma manobra para estabelecer burocraticamente a direção da assembléia. Após um encaminhamento tumultuada a maioria dos estudantes repudiou a proposta que os membros da direção do DCE assumissem a mesa da assembléia. 

Temos, aqui, mais um exemplo do modus operandis desta direção. É impressionante a regularidade da conduta burocrática desta corrente estudantil. Durante todo o processo nunca procurou desenvolver políticas que fossem pontes para impulsionar a mobilização dos estudantes, pelo contrário, se dedicaram a serem os porta–vozes do atraso e os dirigentes da vontade de não–lutar. Sem falar nos vazios políticos que levaram à fragmentação dos estudantes. Houve assembléias em que impuseram o expediente do decurso de prazo impondo o fim da assembléia com uma série de questões importantes a serem discutidas e votadas. No episódio mais difícil até aqui desta jornada de luta contra a reitoria tentam boicotar a assembléia soberana dos estudantes e como não conseguem querem tomar a força a direção da assembléia com uma manobra primária. 


[1] Que já vivia um processo de mobilização de estudantes e professores devido às intervenções no prédio – símbolo internacional arquitetura – sem nenhuma consulta à comunidade acadêmica.