Situação nacional
A crise da democracia dos ricos
Praxis, Setembro 2009
O noticiário dos últimos meses – depois da crise das passagens aéreas
que envolveu todo o Congresso – tem se concentrado nas denúncias
contra José Sarney (Senador pelo PMDB, ex–presidente da
República e atual Presidente do Senado). Não há
novidade alguma no caso. Sarney está sendo denunciado
por nepotismo, tráfico de influência e desvio de dinheiro
público, o que também não é novidade nenhuma. Motivos
que levaram outros presidentes como Antonio Carlos Magalhães
(falecido coronel da oligarquia baiana), após várias
denuncias, a renunciar para não sofrer processo por falta
de decoro parlamentar; Renan Calheiros (PMDB e
ex–presidente do Senado e da “Tropa de Choque” de
Sarney), também denunciado por lavagem de dinheiro, dentre
outras falcatruas, nem sequer renunciou ao mandato, após um
acordo interno apenas renunciou à presidência da
“casa”.
Das onze representações feitas no conselho de ética do Senado, todas
foram arquivadas pelo seu presidente, deputado suplente do
PMDB... Da mesma forma que no episódio das passagens aéreas
quase a totalidade dos partidos estão envolvidas nas denúncias.
O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio, também foi
pego com a boca na botija. Um dos seus assessores foi
estudar na Europa com salário pago pelo Senado e o mesmo
senador teve suas contas pagas com dinheiro emprestado do
Senado durante uma viajem com a família na Europa. Vários
outros casos demonstram que o problema é generalizado, o
famoso “mar de lama” que permeia a política dominante
tem um manancial que parece ser inesgotável. Mas o problema
tem que ser observado mais de perto.
O Parlamento, como parte do Estado burguês e da sua característica divisões
dos poderes, em qualquer parte do planeta, representa os
interesses da classe dominante independente da forma que
possui (presidencialismo, parlamentarismo, monarquia
parlamentarista, com câmara baixa, com câmara única).
Desta forma, a tão propagada “maturidade” de outras repúblicas,
em geral européias, não impede que representantes da
classe dominante vez por outra caiam em desgraça;
recentemente tivemos o caso dos deputados ingleses
envolvidos em corrupção. A própria estrutura deste
Estado, fundado na propriedade privada dos meios de produção
e da opressão de uma classe sobre outra, na democracia
formal pela eleição de “representantes do povo”, na
irrevogabilidade dos mandatos e nos altos salários dos
representantes criam e recriam as condições favoráveis
para todas as formas de corrupção. Agora é importante
polemizar em duas frentes, tanto com aqueles que se
restringem à defesa de um congresso baseada em uma Câmara
Única de representantes – proposta correta, pois o Senado
existe apenas para enfraquecer as pressões populares sobre
o Congresso, mas extremamente parcial – como faz o PSTU e,
conseqüentemente, a CONLUTAS, quanto com os que elaboram
uma proposta de Assembléia Nacional Constituinte Livre e
Soberana para resolver “todos os problemas nacionais, as
formas de representação e as mazelas que afetam os
trabalhadores e o povo pobre”.
Na primeira formulação (CONLUTAS e o PSTU) se restringem ao “Fim do
Senado, por uma Câmara única”; esta formulação mal
arranha o problema. O “fim do Senado” não pode ser uma
bandeira em si, deve encontrar uma série de reivindicações
que conduzam a uma perspectiva de ruptura revolucionária,
ao contrário disto o programa para este momento fica
restrito aos marcos da institucionalidade burguesa. Por
outro lado, é importante encontrar as tarefas que sejam
pontes entre a situação atual e as reivindicações
transitórias. Na segunda formulação (Ler–qi) não se
leva em consideração que o Brasil tem uma série de questões
democráticas, como a reforma agrária, que ainda não foram
resolvidas, assim a proposta de Assembléia Constituinte tem
a sua validade enquanto articuladora entre a atual crise da
democracia burguesa e uma saída radicalmente estabelecida
pela luta dos trabalhadores. Mas esta elaboração não
deixa claro que as “tarefas democráticas” só podem
ser levadas a cabo de forma conseqüente pela luta dos
trabalhadores pelo poder político.
Acontecimentos políticos recentes na América Latina – como no caso da
burguesia insurgente da meia lua boliviana, que enfrentou o
poder central e a própria assembléia constituinte e
HONDURAS – demonstram que nenhuma Assembléia Constituinte,
sem a mais radical mobilização dos trabalhadores, pode
assegurar avanços democráticos. Por isso apresentamos a
formulação de Assembléia Constituinte Revolucionária como
meio tático para que os trabalhadores encontrem caminhos
para substituir a representação formal (burguesa) por uma
estrutura de poder baseada na mobilização e em organismos
de representação direta, fóruns que só podem ser construídos
na luta direta; estas são as condições necessárias para
a conquista do poder pelos trabalhadores que se materializa
no seu governo e Estado próprio.
Diante dos seguidos exemplos e experiências com o Estado burguês,
incluindo o seu parlamento, não apresentar uma proposta aos
trabalhadores que vá para além da democracia formal, como
faz CCONLUTAS e PSTU, consiste em um rebaixamento do
programa que só pode ser explicado pela adaptação desta
direção à lógica dominante da democracia formal. Por
isso, neste momento de crise no Senado, devemos construir um
sistema de reivindicações que passam pelo Fora Sarney,
Fim do Senado, por uma Assembléia Constituinte Revolucionária,
por um governo dos trabalhadores.
Fora Sarney, por uma Assembléia Constituinte Revolucionária baseada em
organizações independentes das massas e por um governo dos
trabalhadores!
Jornal Palavra Operária 61, p. 3
A democracia real deve ser baseada na participação
direta de milhões de trabalhadores não pode ser obra
de uma minoria; a sua constituição deve começar nos
locais de moradia, de trabalho e de estudo em um sistema
onde o centro de gravidade se inverta totalmente, ou
seja, se dê de baixo para cima; os seus representantes
devem ser eleitos e os seus mandatos revogáveis; os salários
não podem ultrapassar a média salarial de
trabalhadores. Está mais do que demonstrado que a
democracia formal (também conhecida como democracia dos
ricos) não serve para os trabalhadores. Qualquer forma
de representação indireta dentro do Estado capitalista
está a serviço da elaboração e imposição de leis
voltadas para manter/aprimorar a exploração e mais
vantagens para as frações dominantes. Vários exemplos
atuais da política do governo Lula e do atual
Parlamento vão neste sentido.
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