Brasil

Movimento estudantil

A saída para educação é ensino público e
de qualidade para todos

Por Marcela Militão e Rosi Santos
Praxis, setembro 2009

Crise no sistema financeiro, por conseguinte crise na educação... Com a crise que esta em plena vigência é natural que na ordem do capitalismo, este encontre formas para se salvar transferindo para os trabalhadores e para a juventude as conseqüências da crise. Perversamente atenta contra os serviços essenciais, aprofundando a exploração e a precarização[1], com arrochos salariais e o contingenciamento de verbas. Um desses serviços fundamentais mais atingindo é a educação, no qual professores e alunos estão submetidos a péssimas condições de ensino e de trabalho.

Trazemos nesta edição algumas reflexões sobre a atual situação da educação, principalmente aquela que deveria complementar e aprofundar o desenvolvimento intelectual e social dos jovens, a saber, o ensino superior, além de exemplos de universidades que vem passando por sérios problemas. Na região do grande ABC contamos com a contribuição de uma companheira estudante da Fundação Santo André, localizada no ABC paulista, para fazer apontamentos sobre esta instituição. Essa estudante nos informa sobre os graves problemas que esta universidade vem passando.

A Fundação Santo André (FSA) foi criada em meados dos anos sessenta surgiu como uma alternativa para a formação de trabalhadores e filhos de trabalhadores da região do ABC paulista, a data de sua Fundação foi dada num momento de grande ascenso do movimento operário na região. Tendo inclusive intelectuais de esquerda conhecidos, que se formaram na instituição. Este ambiente no qual foi criada, imprimiu na época a esta instituição um compromisso social e público possibilitando certo abrandamento dos problemas de exclusão ao ensino superior das classes não favorecidas da região.

Segundo Maria[2], quando fundada, em 1962, a Fundação era de direito público, ligada ao município e totalmente gratuita. Com o passar dos anos, vieram as mensalidades, mas, ainda, existia um subsídio municipal de 30% dos custos. Mas, este quadro piorou drasticamente com as sucessivas gestões petista, a última e mais polemicas delas foi a de Odair Bermelho [3]. Estas gestões resolveram inverter a ordem das coisas e transformar a instituição em uma Fundação de direito privado, ou seja, hoje a faculdade tem como fonte de financiamento o pagamento de mensalidades. Em suma, neste quesito hoje a Fundação se assemelha a qualquer outra faculdade particular. Mesmo que ainda seja gerenciada política e administrativamente pela prefeitura, sua manutenção financeira é totalmente oriunda das mensalidades pagas pelos alunos. “Resultado dessas más gerencia hoje a (FSA) está afundada em dividas e com o fim dos subsídios públicos, os gastos administrativos somam de 45 a 60% em relação às receitas, o aumento dos juros bancários pagos pela instituição é de 5162%” [4]. Nesta profunda crise que a Fundação se encontra não há outra saída para a instituição continuar existindo qualitativamente senão tornada pública. Maria aponta “que alguns cursos foram totalmente precarizados, ao ponto de no ano de 2008 dos 11 cursos de Licenciatura somente três abriram primeiros anos.”

Segundo a companheira, existe em alguns cursos uma tremenda perseguição política aos estudantes e professores que discordam da forma de administrar o “Centro Universitário”; a Fundação foi considerada a única possibilidade de acesso à universidade de qualidade e com baixo custo para os trabalhadores da região. Mas, as políticas que, infelizmente, esta instituição vem tomando são de caráter totalmente mercadológico e tecnicista, como: perseguição aos alunos inadimplentes, que na gestão anterior chegou ao extremo de fechar salas de cursos considerados não vantajosos para mercado como os de ciências humanas, aumento sistemático das mensalidades, além de processos contra aqueles que ousaram enfrentar o processo de sucateamento da instituição. No caso das perseguições, Maria diz que “tem amigos que declararão ter passado por constrangimento ao serem abruptamente surpreendidos com oficiais de justiça em sua porta, sendo questionados se possuíam bens para serem penhorados caso não pagassem o débito”. Devido a tais perseguições, há um levante do movimento estudantil desta instituição que luta pela gratuidade, ensino de qualidade e incentivo à pesquisa, sem que essa seja vendida às empresas como se pretende. Os estudantes entoam palavras de ordem como, “Não paguei, não pagaria. Educação não é mercadoria!”

O Império Anhanguera

Os estudantes desta instituição estão sofrendo brutais golpes por parte da direção. Podemos exemplificar isso citando a situação dos alunos da unidade Faenac em São Caetano do Sul, ABC paulista - que recentemente foi comprada pelo grupo Anhanguera -, estes estão sofrendo com medidas punitivas das mais constrangedoras. Os alunos que não conseguem arcar com as mensalidades, e por isso ficam endividados com mensalidades atrasadas, estão sendo barrados nas catracas e seus nomes são retirados da lista de chamada e impedidos de assistirem as aulas.

A Anhanguera foi a primeira empresa do “setor de educação” a ter capital na bolsa de valores. Só para termos uma idéia do potencial mercenário desta instituição, em menos de três anos realizou 20 aquisições e aumentou em seis vezes o número de alunos. A companhia hoje tem 220 mil alunos que representam grandes cifras, ou seja, educação para esta empresa é um grande negócio. Mas não para por ai, a instituição pretende crescer ainda mais à custa da não qualidade. É provável que suas metas sejam atendidas em breve já que o carro chefe da empresa é a LFG (setor especializado em pólos de ensino a distancia) que atua em várias frentes, ou seja, vale tudo pra ganhar dinheiro, de cursos pagos preparatórios para concursos até a prestação de serviços educacionais para a Microlins - de curta duração e totalmente voltado para o mercado de trabalho de baixa remuneração.

A Anhanguera se apresenta para os menos avisados como uma faculdade acessível, com mensalidades, supostamente, abaixo do preço de mercado. Mas, na prática, demonstra a sua tática de extração de mais lucro aprofundando a mercantilização do “ensino superior”, tratando a educação cada vez mais como uma mera mercadoria.

Como sabemos, estes relatos poderiam se enquadrar em uma série de outras instituições do ensino privado e também público. Em ambas percebemos práticas que visam por completo o sucateamento da educação dando ênfase ao ensino à distância, salas e laboratórios lotados e precários, projetos pedagógicos voltados ao lucro e não ao ensino, à pesquisa e à extensão. Políticas implementadas a partir de diretrizes de bases do Banco Mundial/FMI, cujos agentes no país são o MEC, os Governos Federal, Estadual e Municipal.

É vergonhosa a maneira que estas instituições vêm tratando a comunidade acadêmica e a própria educação. Chegando ao cúmulo de fechar ou abandonar salas de aulas com turmas quase formadas, por acreditarem que são cursos que não trazem retorno financeiro e (realmente não o trazem). Mas, sem duvida nenhuma, são os cursos que mais contribuem para elevação da criticidade, além de sua contribuição social valiosíssima. O fechamento destas salas e cursos traz também outro elemento, o político, pois os cursos de humanas são aqueles que historicamente questionaram a estrutura de poder e a burocracia da universidade.

Estas universidades, infelizmente, expressam hoje, assim como tantas outras universidades, um retrato perverso de como nosso país se relaciona com questões pertinentes à formação e ao desenvolvimento científico. Trazendo à tona um quadro de evasão e exclusão de estudantes de baixa renda para o ensino superior. Por isso, ressaltamos a importância de tornar públicas as instituições de ensino privado, pois quando privatizadas em nada se diferencia de qualquer outro comercio.

Dados[5] recentes divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) mostram que 737 mil estudantes universitários do país estudam em instituições reprovadas pelo MEC, O índice corresponde ao período de 2007 a 2008. Do número de instituições universitárias reprovadas na avaliação, reprovadas por falta de infra-estrutura, como laboratórios, bibliotecas, restaurante universitários etc. - estes dados comprovam que os tubarões do ensino[6] somente se preocupam em obter cada vez mais adeptos – boa parte destas universidades, contraditoriamente, são beneficiadas pelo Prouni. Ou seja, isso, estaticamente, comprova que verba publica deve ir para escola pública.

Neste sentido, apoiamos a federalização da Fundação Santo André, seguindo o exemplo da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), antiga FUNREI, que há poucos anos teve seu processo de federalização concluído. Mostrando, não só viabilidade do ensino público de qualidade para todos, mas toda urgência que tem a criação de mais e mais universidades públicas para atender a demanda crescente que temos.

A continuidade da mobilização passa por unificar estudantes e trabalhadores que lutam no país inteiro

Uns dos desafios do Movimento Estudantil (M.E) é fazer atividades concretas que se enfrentam com governo Federal contra o ReUni, contra a UNIVESP, pelo fim do vestibular e tantas outras demandas. O movimento deve se unificar com todos e todas que lutam por uma educação pública, gratuita e de qualidade.

Outro grande desafio: lutar e conquistar a real democratização e a autonomia universitária.

Está claro que o M.E já demonstrou sua grandiosa combatividade, mas é necessário avançar mais, pois as quedas dos Reitores da UNIFESP, UNB, entre outras, inclusive a FSA, não garantiram a democratização da universidade e nem mudanças substanciais. Por isso, o ME deve caminhar lado a lado com a reorganização dos movimentos sociais que ocorre em todo país e realizar duros embates contra o governo Lula a UNE, CUT e outras direções burocráticas. As velhas direções ao manterem seu caráter burocrático, ou pior, ao passarem para o lado do governo Lula, abandonam a luta da juventude e dos trabalhadores.


[1] Universidades como São Marcos tiveram os salários de docentes atrasados, greve de estudante e funcionários e trabalhadores na USP sem contar as diversas ocupações em varias universidade do país.

[2] Estudante de História do segundo semestre de 2009.

[3]Odair Bermelho, reitor envolvido em escândalos como desvio de verbas publica falsificações de notas ficais criação de cargos comissionados, corrupto deposto pelo Movimento.

[4] Dados do blog Ocupação FSA.

[5]  Dados obtidos em www.mec.gov.br

[6] Dados do MEC tratam que as universidades particulares são as que obtiveram o pior desempenho 39% receberam conceito de 1 e 2 consideradas insatisfatória pelo MEC, enquanto as universidades Municipais e Federais se destacam com até 52% pontuação de 4 a 5 consideradas notas máximas.