Brasil

Nos dias 5 e 6 de junho em Santos (SP), teremos a realização do Congresso da Classe Trabalhadora (Conclat), que discutirá a unificação da Conlutas, da Intersindical, do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), do MTL (Movimento Terra Trabalho e Liberdade), do MAS (Movimento Alternativa Socialista), MPRA, Terra Livre e representantes da Pastoral Operária de SP em uma mesma central. Nos dias que antecedem ao CONCLAT, dias 3 e 4 de junho, também na cidade de Santos (SP), a Conlutas realizará o seu Congresso. O principal ponto do Congresso será a unificação da Conlutas com a Intersindical e as demais entidades e movimentos envolvidas neste processo.

Pré-tese ao Congresso da Conlutas e ao Conclat

São Paulo, 4 de Maio de 2010

Apresentação

Apresentamos essa pré-tese ao Congresso de Unificação entre CONLUTAS e INTERSINDICAL como esforço inicial de elaboração sobre temas que julgamos fundamentais na luta de classes no Brasil e no mundo. Além desses temas também apresentamos uma visão sobre os principais desafios políticos e organizativos colocados para que essa unificação se constitua como uma alternativa de fato à total adaptação das demais organizações dos trabalhadores. Para que essa pré-tese possa ganhar maior concretude e amplitude, contamos com a contribuição do/as companheiros/as que estão inseridos no cotidiano da luta de classes em todas suas manifestações e lugares, nas escolas, fábrica e bairros.

Internacional: classe operária grega dá exemplo de resitência

A propaganda do fim da crise econômica e da volta do crescimento tem se demonstrado de fato mais propaganda do que realidade, as ameaças de novas turbulências generalizadas não estão fora de cogitação, o que pode significar uma nova onda de destruição econômica mesmo nos países que foram menos afetados no período anterior.

Os trabalhadores gregos levantaram uma onda de mobilização na Grécia, reagindo com fortes enfrentamentos de rua contra a política de transferir aos trabalhadores a crise que se instalou fortemente no país com a insolvência das contas públicas.

A resistência dos trabalhadores europeus demonstra que há um processo crescente de tomada de consciência de que as crises econômicas não devem ser resolvidas pelo aumento da taxa de exploração dos trabalhadores nem na redução de diretos e postos de trabalho, em resposta a isso vemos em seus cartazes dizeres como que os capitalistas paguem a conta da crise que o seu sistema econômico criou. Apesar de limitada, por não se tratar de uma clara consciência política socialista e revolucionária, está se gerando um ponto de partida muito superior ao visto em etapas anteriores onde a ideologia de que não havia uma alternativa classista era predominante.

Cuba: por uma revolução socialista dirigida pela classe operária

Outro ponto importante da conjuntura internacional, particularmente a da América latina, é a situação política vivida atualmente em Cuba - pela importância paradigmática que tem na mentalidade socialista de várias gerações de lutadores - e as posições políticas que se perfilam diante dos seus rumos conferem a análise da realidade cubana destaque. Cuba, da mesma forma que os demais países de estrutura econômica e social predominantemente agrária, realizaram revoluções de libertação nacional. A ausência da classe operária organizada politicamente em organismos de poder democráticos e autônomos, apesar das medidas anticapitalistas tomadas, fez com que esses estados se configurassem não como estados operários, mas como estados burocráticos.

As medidas anticapitalistas, apesar de levadas a cabo por um estado onde não há livre organização dos trabalhadores, permitiu a Cuba avanços no campo da saúde, educação, emprego etc. Entretanto, como aconteceu em todos os demais países, a emancipação real dos trabalhadores depende da sua atividade autônoma enquanto classe.  Por isso defendemos que é necessária uma nova revolução, dessa vez encabeçada pela classe operária organizada autônoma e democraticamente, para que as tarefas socialistas possam ser desenvolvidas até o final.

Ao contrário do que diz a organização internacional do PSTU (LIT)[1], Cuba não se constitui como uma “ditadura capitalista”, pois para tal deveria ter recomposto uma classe social proprietária e dominante, além do retorno total das regras de mercado, afirma também que “Nessas situações lutamos pelas mais amplas liberdades democráticas para todas as correntes opositoras, inclusive as burguesas”. Para nós o centro do programa vai ao sentido oposto, é a luta das massas trabalhadoras que devem derrotar a burocracia e impor a democracia operária e o aprofundamento das tarefas socialistas.

Honduras: Por uma campanha internacional contra os assassinatos políticos

Na conjuntura Latino Americana o golpe de Estado realizado em Honduras teve como principal objetivo conter a onda de lutas dos trabalhadores hondurenhos por reformas sociais. A eleição fraudulenta que colocou Porfirio Lobo no governo não fez a situação política em Honduras voltar à “normalidade”, pois apesar do refluxo do movimento pós-eleições e da capitulação de alguns setores que estavam na resistência, as marchas continuam acontecendo. E com o objetivo de esmagar a resistência uma série de assassinatos está ocorrendo em Honduras. Mesmo assim, Obama e outros governos da região estão dando passos para reconhecer um governo que se originou em um golpe de estado, e tem sido no mínimo, cúmplice dos assassinatos de figuras proeminentes da resistência.

Como parte da corrente Socialismo o Barbárie Internacional, o Práxis está impulsionando uma campanha para deter a ofensiva criminosa da classe dominante hondurenha, pelo esclarecimento desses assassinatos e pela prisão de seus autores materiais e intelectuais. Pela gravidade dos fatos, contamos com a participação de todas/todos e das organizações que defendem os interesses dos trabalhadores para encaminhar um abaixo-assinado, como parte de uma campanha mais geral, que será encaminhado, através de um ato político, à embaixada de Honduras no Brasil.  

Nacional: Pela redução radical da jornada de trabalho sem redução de salário

O governo Lula se demonstrou nesses quase oito anos na presidência como um verdadeiro guardião dos fundamentos neoliberais, superando de longe seu antecessor, FHC. A política econômica do governo não saiu um milímetro do “trilho” garantindo taxas de acumulação nunca vistas.

No auge da crise econômica o Brasil e outros países emergentes se tornaram altamente lucrativos para o capital especulativo. Com a redução - a praticamente zero - das taxas de juros nos mercados dos EUA e demais países centrais tornaram-se altamente lucrativos tomar dinheiro emprestado nesses mercados para investir no Brasil. Os patrões, apoiados pelas centrais sindicais governistas (CUT e  Força Sindical), aproveitaram a situação de defensiva em que se encontravam os trabalhadores diante da ameaça de demissões para reduzir salários e benefícios.

A crise econômica, que ainda não terminou e esta gerando novos ataques as condições de vida dos trabalhadores, deve ser respondida com campanhas que mobilizem os trabalhadores em nível nacional. Um setor que se propõe alternativo (CONLUTAS e INTERSINDICAL) ao governismo no movimento sindical não pode deixar de se posicionar diante de uma questão como a jornada de trabalho sob pena de perder mais um momento decisivo[2] de se apresentar com alternativa real à CUT e a Força Sindical. 

Diante de constantes e variadas ofensivas da classe dominante cabe aos trabalhadores encontrarem pontos de apoio para sua ação. Nesse sentido a questão da redução da jornada de trabalho merece toda a nossa atenção. O problema é que esse tema está sendo levado a cabo pelas centrais governistas que defendem a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reduz a jornada de trabalho de 44 horas semanais para 40 horas. CONLUTAS (central da qual nos reivindicamos) e a Intersindical até o momento não estão desenvolvendo uma campanha alternativa, aos encaminhamentos que as centrais governistas vêm dando a esse tema tão importante para os trabalhadores. Uma solução que interesse verdadeiramente aos trabalhadores passa pela redução da jornada de trabalho de forma permanente até que todos estejam empregados.

Defendemos que a jornada de trabalho deve ser reduzida para 30 horas por semana e novas reduções deveriam ser feitas até o fim do desemprego (mecanismo é conhecido como escala móvel da jornada de trabalho). A luta pela redução da jornada de trabalho deve ser seguida da luta contra as terceirizações, contra a precarização e intensificação da jornada de trabalho, pelo salário mínimo do DIEESE para todos trabalhadores, tudo isso deve ser acompanhado da luta pela reforma agrária e urbana radical sob controle dos trabalhadores, da luta pelo não pagamento da dívida externa e interna e pela ampliação de verbas públicas para saúde e educação. Essas propostas devem ser completadas pela luta pela organização autônoma no interior de todas as fábricas através da criação de Comissões de Fábricas independentes e democráticas.

Esquerda se divide diante da falsa polarização entre Dilma e Serra

A retomada da ofensiva dos trabalhadores passa, também, pelo campo político mais geral. As ilusões  criadas pelo PT de que bastava que representantes dos trabalhadores fossem assumindo cargos públicos até se chegar à presidência da república para que as mazelas fossem resolvidas se demonstram, na prática, totalmente superadas. Por isso, construir uma alternativa política/programática/partidária à altura das reais necessidades dos trabalhadores no próximo período é decisivo.

O processo eleitoral no atual regime de democracia dos ricos em que vivemos, tem como por objetivo a realização de consulta popular para saber quais seriam os melhores “governantes” do atual Estado. No entanto, este é um momento político importante para propagandear alternativas socialistas para transformação social. Criticamos a incapacidade de parte da esquerda socialista em compor uma frente de esquerda com um programa anticapitalista e socialista para as próximas eleições para ocupar o espaço monopolizados pelos partidos burgueses. Diante da falsa polarização entre Dilma e Serra, a construção de uma frente de esquerda, mesmo que com capacidade eleitoral reduzida, sem Heloisa Helena como candidata, com um claro programa anticapitalista, contribuiria para a disputa ideológica que as eleições permitem.

Nesse ano estamos diante do Congresso que irá unificar os setores que pretendem surgir como alternativa à CUT.  Pela importância do tema, o congresso de unificação não pode se furtar em fazer esse debate e apresentar aos trabalhadores uma posição diante das eleições. Somos a favor da construção de uma frente eleitoral da esquerda radical nas próximas eleições para se colocar entre as falsas polarizações entre Dilma e Serra e da falsa alternativa. Dessa forma, está sob a responsabilidade do PSOL e do PSTU, partidos que infelizmente tem se demonstraram incapazes de construir uma frente param polarizar com as alternativas burguesas, apoiados em um processo de discussão nos fóruns do movimento, construir uma frente eleitoral e candidaturas que apresentem a ruptura com o capitalismo através de um programa socialista com ênfase na auto-organização dos trabalhadores.

Educação: Lula aprofunda neoliberalismo na educação

As reformas educacionais do governo LULA dão continuidade e aprofundam as políticas de FHC. Isto pode se verificar em todos os domínios da política educacional. O Brasil é um dos países que menos investe neste setor, a porcentagem do PIB investido na educação não chega a 5%, índice que nos países imperialistas ultrapassa 10%.

O PROUNI constitui uma das maiores transferências de verbas públicas da história brasileira. Calcula-se que as verbas destinadas para este programa poderiam criar o dobro de vagas nas escolas públicas, sem falar na importância estratégica que tem a universidade pública no sentido da autonomia da produção científica local. É preciso realizar campanhas sistemáticas para desmistificar o caráter pseudo popular do PROUNI, que na prática atende mais as empresas privadas de ensino do que o acesso da população trabalhadora ao ensino superior. Neste sentido a levantamos a bandeira de que as verbas públicas devem ser destinadas apenas ao ensino público.

LULA mantém a mesma política dos fundos de manutenção de ensino de FHC, amplia o antigo fundo estadual criando o Fundo Nacional da Educação Básica (FUNDEB). A lógica é a mesma com a diferença de que neste fundo também é incluído o ensino infantil. A questão central é que as verbas destinadas ao ensino continuam muito aquém da necessidade de universalização de todos os níveis da educação básica e superior. Podemos constatar isso na política de extensão dos campi das Universidades Federais que tem sido realizada de forma totalmente precária, não garantindo as mínimas condições de funcionamento, estrutura de ensino e de alojamento dos estudantes.

Outro tema de destaque da política educacional é a avaliação. Assistimos na última década uma verdadeira febre de políticas voltadas para avaliação do ensino calcadas na ideologia de que a qualidade de ensino seria “puxada” pelos resultados obtidos nos exames externos. O governo LULA, acompanhando as tendências internacionais de controle burocrático sobre o processo educacional.

É dentro deste marco que se insere a política de extensão do ensino público superior condensado no programa federal denominado REUNI. Este é um programa de incentivo a expansão do ensino superior que está longe de atender às reais demandas de universalização deste nível de ensino. Desta forma, está colocada a luta por mais vagas no ensino superior e fim do vestibular. A ampliação das  vagas deve garantir todas as condições fundamentais de ensino, tais como: bibliotecas, laboratórios, restaurantes, alojamento, bolsas, enfim, todas as condições básicas de ensino e de pesquisa.

Organização: Superar falsas polêmicas e lutar contra corporativismo e pelo protagonismo da classe operária

O balanço apresentado, até agora, sobre o processo de unificação é bastante preocupante, não por compreender que a unificação não seja fundamental, mas porque neste processo de unificação nenhuma preocupação em superar a prática economicista e superestrutural, fortemente marcada pelos setores em unificação não é discutido e muito menos reconhecido pelas principais correntes envolvidas. A unificação entre CONLUTAS e INTERSINDICAL é sem dúvida fundamental para que se possa alavancar uma alternativa às burocracias sindicais no Brasil. Mas sabemos que uma unificação que não supere os equívocos de direção das duas entidades não interessa aos trabalhadores.  

A polêmica central em torno à unificação passa pela diferença em relação concepção organizativa  da nova central. A INTERSINDICAL defende uma nova central voltada para organizar “os que vivem do trabalho” e tem se negado a incorporar os estudantes na nova central. Já a maioria da CONLUTAS defende uma central operária, popular e estudantil. Não nos parece que nenhuma das duas formulações dá conta das necessidades político-organizativas atuais e históricas dos trabalhadores. A formulação de “central dos que vivem do trabalho” é uma formulação que peca pela sua generalidade. O fato é que o movimento operário deve incorporar centralmente o conjunto da classe trabalhadora, tanto os desempregados quanto os empregados, todos os tipos de contrato de trabalho, os trabalhadores contratados pela CLT, estagiários e os por contrato temporário. Mas a formulação da INTERSINDICAL não leva em consideração o papel central que tem os trabalhadores produtivos e assalariados na constituição da sociedade.

A formulação da direção da CONLUTAS, apesar de ser mais progressiva ao incorporar o conjunto dos setores oprimidos em uma única organização sindical, também não dá a devida atenção ao papel protagonista dos trabalhadores produtivos assalariados na luta de resistência e de superação do capitalismo. A polêmica entre CONLUTAS e INTERSINDICAL passa, também, pela questão da incorporação dos estudantes na nova entidade nacional. Precisamos ter claro que a luta contra o capitalismo deve ser feita com um programa que mobilize o conjunto dos explorados, mas não podemos perder de vista qual é o centro de gravidade político-organizativo deste movimento.

A classe trabalhadora assalariada, pelo seu papel e sua forma centralizada de organização é aquela identificada pelo socialismo científico, por razões objetivas, como a única que pode, ao se por em movimento colocar em cheque a sociedade capitalista e ao tomar o poder político com o apoio dos demais setores, levar a cabo a superação do capitalismo. A história política do século XX é farta em exemplos dos entraves provocados pela ausência da classe trabalhadora como protagonista no processo revolucionário (como já citado aqui o caso de Cuba). A partir daí cabe propor uma entidade que dê conta das especificidades de cada setor sem perder de vista a hierarquia concreta entre os setores sociais envolvidos.

Os processos de mobilização dos últimos anos forjaram uma nova vanguarda combativa que ocupou a cena do movimento estudantil brasileiro. Essa nova vanguarda sabe que a luta deve ser organizada de forma independente, democrática e ligada aos trabalhadores, e que esta organização não pode se limitar aos Centros Acadêmicos, pois os combates devem romper os muros da escola. A falência da UNE está dando lugar à criação de outras formas de luta nacional e internacional dos estudantes, a mais importante expressão deste processo de reorganização tem sido a criação da Assembléia Nacional dos Estudantes Livre (ANEL).

Além de impulsionar, de fato, campanhas em defesa da educação pública, o que significa o enfrentamento direto à política educacional do governo LULA, a outra grande tarefa da juventude é impulsionar a solidariedade direta à luta dos trabalhadores pela redução da jornada de trabalho, contra a precarização e intensificação da jornada de trabalho, pela implantação do salário mínimo do DIEESE para todos trabalhadores etc. Esta nova entidade que ainda esta em fase de formação deve possuir uma identidade classista além de ter alguns desafios se quiser, de fato, de despontar como alternativa a UNE um deles é a necessidade de romper com a lógica corporativista e superestrutural da corrente majoritária[3] que dirige a ANEL. 

A crítica que fazemos à direção da CONLUTAS pode ser estendida à parte das correntes que estão organizando o Congresso Nacional, pois a nova central deve romper com a política corporativista que vem desenvolvendo desde a sua formação, dizemos isto porque esta direção não se coloca a tarefa de construir campanhas nacionais e intervenções que permitam que trabalhadores e estudantes unificarem suas forças a partir de processos reais de mobilização. Um claro exemplo disso é a questão da redução da jornada de trabalho. Até o momento a direção da CONLUTAS não impulsionou uma campanha nacional em torno a esse tema,  isso permite que CUT e outra sindicais governistas monopolizem essa questão e a tratem dentro dos limites da ordem estabelecida. 

O Congresso de unificação de Junho na cidade de Santos - SP é um momento muito importante para os trabalhadores e para a juventude. Pois será um momento fértil para colocarmos as diferenças e acordos tendo como objetivo melhor encaminhar a luta dos trabalhadores e da juventude brasileira.

São Paulo, 4 de Maio de 2010

Assinam esta pré-tese: Antonio Soler (USP/Estudante e Professor), Alessandra Vieira (UNIFESP/ Estudante), Ana P. Lemos FSA/Estudante e Comerciária), Marcela Militão, (UNIFESP/Estudante e Agente Escolar), Lúcio F. Lemos (UNIFESP/ Estudante), Rosi Santos (UNIFESP/Estudante e Professora), Ramo Felix (FIA/Estudante e Comerciário), Vinicius Sanches (Metodista/Construção Civil).


[1] Declaração “Frente a la muerte de Orlando Zapata Tamoyo y las liberdades em Cuba”.

[2] Como as perdidas por ocasião das demissões na GM de São José dos Campos, onde esse setor (PSTU) foi incapaz de reagir à altura dos acontecimentos.

[3] PSTU.