Brasil

Divisão da esquerda fragmenta opção política independente nas eleições

Chamamos o voto em candidaturas socialistas e
comprometidas com as lutas dos trabalhadores
e da juventude

Declaração eleitoral do Práxis - Socialismo ou Barbárie, 16/09/10

O cenário interno da economia brasileira, que não passou pela crise com a mesma intensidade vivida nos países centrais, é de crescimento do PIB e de uma “sensação” que as coisas vão bem, é nisso que se sustenta a altíssima popularidade do governo. Com reservas internacionais acumuladas no período anterior à crise e com a redução das taxas de juros que estavam em patamares estratosféricos, uma das mais altas do mundo, o governo conseguiu conter o aprofundamento da crise.

Mas, o fundamental no processo de recomposição econômica foram os ataques à classe trabalhadora: demissões massivas em vários setores da economia, com a redução salarial, redução de impostos para as transnacionais da redução salarial, do aumento da dívida pública e da precarização das condições de trabalho. Por outro lado, está claro que diante de um novo repique para baixo da economia mundial essa situação pode mudar completamente, na medida em que o crescimento do PIB se deve, em grande medida. às exportações.

A manutenção das políticas de compensação e as políticas anticíclicas permitiram ao governo manter sua popularidade em patamares altíssimos: a aprovação do governo Lula atinge 78% segundo dados do instituto Sensus publicados no dia 14 de setembro. É claro que essas políticas atuam única e exclusivamente no âmbito das conseqüências, ou seja, da pobreza provocada pelo regime.

Mas, em um país onde 30% da população vive em situação de pobreza e 10% em situação de extrema pobreza - dados também dão conta que cerca que 35% da população brasileira já passou fome pelo menos uma vez na vida, o que indica que há no imaginário da população um profundo temor em voltar a passar fome -, as políticas assistencialistas de Lula não dão conta nem das necessidades vitais da população. Políticas como a bolsa família geram uma sensação de que as coisas estão melhorando quando, na verdade, apenas 3% do PIB é gasto com educação[1] e 3,4% é gasto com saúde.

Na contra mão disto, o marketing governamental esta sendo extremamente eficiente na construção de uma imagem de que “o Brasil é um pais de todos”, como se isso fosse possível no capitalismo, Na verdade, a desigualdade social no Brasil continua sendo uma das mais altas do mundo, de 2004 a 2008 segundo pesquisa do IBGE a media nacional caiu muito pouco, passou de 0.521 para 0.518 de acordo com o Gini[2].

Não nos iludimos diante da falsa polarização que representam as candidaturas burguesas

Dentro desse cenário de estabilidade se enquadra a disputa eleitoral de 2010. A classe dominante local e seus sócios maiores desde o inicio do atual governo vem acumulando taxas de lucro maiores do que no governo anterior. Durante o primeiro mandado de  Lula o lucro das grandes empresas aumentou 394%. Isso se deve ao bom cenário econômico internacional do primeiro mandato de Lula e, também, pelo controle sobre o movimento social exercido pelo governo através dos sindicatos pelegos (CUT e CIA). Durante a crise econômica não foi diferente, a redução dos IPS, a redução salarial, os empréstimos a juros baixos, para os grandes empresários, fizeram a “alegria geral”. Em uma situação como essa a oposição burguesa ficou sem chão, sem eixos políticos para se diferenciar do governo Lula, pois que mais poderia prestaria melhores serviços à classe dominante? Assim, as criticas ao governo ficaram no âmbito dos gastos públicos, mas, contraditoriamente, os gastos públicos com o capital foi um dos principais responsáveis pelo combate aos efeitos da crise mundial no Brasil.

Nestas circunstancias não é de se estranhar que não exista uma polarização real entre as candidaturas com maior visibilidade. As três candidaturas que correm na frente representam a classe dominante, cada uma mais propensa a essa ou aquela fração da mesma classe, pois todas defendem a manutenção do capitalismo e do atual regime político que o sustenta.

Dilma, a candidata de Lula, é a candidata da continuidade se apresenta como a legítima continuadora do projeto iniciado pelo se chefe/antecessor. Assim, nenhum dos fundamentos da macroeconomia será afetado se eleita. Serra, candidato principal da oposição burguesa, não pode apresentar nenhuma critica contundente ao governo sob pena de perder votos e porque não tem de fato um projeto diferenciado. Sua única diferenciação é o controle fiscal, mas que não pode ir para o centro da campanha porque isso significaria reduzir gastos. Marina Silva, candidata do PV, se coloca como a candidata da defesa do meio ambiente sem que essa esbarre um milímetro nos interesses dos capitalistas, não é por acaso que o seu vice é dono da maior fábrica de cosméticos do Brasil (Natura). Procura catalisar um setor médio da população que não se vê representado pelas maiores legendas, parte desse espaço era ocupado por Heloisa Helena do PSOL que de forma oportuna não viu espaço para sua candidatura no marco da alta popularidade de Lula preferiu se candidatar ao Senado pelo seu Estado.

Divisão da esquerda fragmenta opção política independente dos trabalhadores nas eleições

As eleições estão marcadas pela estabilidade política e a momentânea estabilidade econômica. Dessa forma, as candidaturas que se opõem frontalmente ao regime estão enfrentando o isolamento das camadas mais amplas dos trabalhadores. Somado aos  elementos mais objetivos da realidade, não podemos desconsiderar que escolhas políticas têm contribuído para agravar o isolamento da esquerda radical. Trocando em miúdos: a políticas levadas pela direção do PSOL e do PSTU ao não apostar na unificação da esquerda nas eleições diante da falsa polarização entre o PT e o PSDB agravou o quadro de isolamento da alternativa socialista diante das eleições e do atual regime. Também não foi diferente a posição do PCB, primeira organização com legenda eleitoral - que foi parte da frente de esquerda nas eleições anteriores - a lançar candidatura própria.

Mas, pelo peso político os principais responsáveis pelo fato dos trabalhadores não disporem de uma candidatura única nas eleições são os PSOL e o PSTU.  As razões já são amplamente conhecidas. Parte da direção do PSOL pretendia apoiar a candidatura de Marina Silva. Manobra política com objetivo de aprofundar o curso oportunista desse partido. Essa tática atuava assim em duas frentes principais: 1) Realizar mais uma inclinação política à direita se coligando com um partido da ordem; 2) Liberar Heloisa Helena para concorrer com mais facilidade ao Senado, uma vez que esse núcleo dirigente não consegue sobreviver sem estar fora dos aparatos, principalmente os do estado burguês. Mas, essa manobra não vingou. Marina Silva e o PV não abriram mão da coligação com o PSDB no Rio de Janeiro, o que inviabilizou as intenções iniciais da direção do PSOL. A partir daí se travou a disputa para quem seria ao candidato dessa legenda. Após um verdadeiro vale-tudo anterior à conferencia eleitoral que contou até com denuncia de fraude na eleição dos delegados, seqüestro do site do partido e de uma conferencia onde os delegados ligados a Heloisa Helena não compareceram. Nesta crise interna do partido foi escolhido Plínio Sampaio como pré-candidato.

Já o PSTU, diante da recusa de Heloisa Helena em ser candidata se apressou em construir argumentos contra a construção da frente de esquerda. Argumentos que tinham como apoio principal o fato de Plínio Sampaio não ser o candidato reconhecido pelo partido uma vez que houve uma divisão na conferencia eleitoral desse partido. Argumento claramente insuficiente levando-se em consideração a atual conjuntura de polarização entre as duas candidaturas que representam os interesses do capital e necessidade de fortalecer candidaturas operárias e socialistas diante da atual correlação de forças.

Não se trata apenas de um cálculo quantitativo, pois uma nova experiência de frente de esquerda, evidentemente, com um programa anticapitalista e para defender as lutas imediatas dos trabalhadores poderia contribuir para a unificação em outras frentes, como a sindical, por exemplo.

A questão é que vemos em organizações distintas - PSOL, PSTU e PCB - a mesma lógica política, ou seja, a crença de que a autoconstrução política se faz em detrimento a necessária unidade entre os setores que resistem aos ataques da classe dominante e do seu governo, hoje representado pelo PT e por Lula. Isso se manifesta em toda a linha política desses setores. Como, por exemplo, o congresso de unificação em Santos no mês de maio desse ano - do qual o PCB se recusou sequer em participar - que implodiu pela incapacidade dessas organizações em construir plataformas políticas e formas de organização que dêem conta das atuais necessidades do sindicalismo combativo, é um claro exemplo do que estamos dizendo.

Chamamos o voto crítico nos candidatos do PSTU

Mas, mesmo nesse quadro de fragmentação da esquerda não podemos nos furtar em apresentar uma alternativa para os trabalhadores nas eleições. Com a clareza de que o processo eleitoral nos limites da democracia dos ricos, na verdade, não passa de uma ditadura disfarçada. Portanto, é necessário dar o combate político apresentando claramente propostas anticapitalistas e socialistas que visem à transformação profunda da realidade. No caso específico brasileiro, apesar de toda propaganda do governo e da classe dominante, não poucas as mazelas pelas quais passam os trabalhadores, basta ver os dados relacionados ao desemprego, aos salários, a falta de moradia, a saúde e educação e aos problemas sociais de forma geral.

É necessário romper imediatamente com essa situação, com propostas como a redução da jornada de trabalho, sem redução de salário, a reforma agrária radical e sob o controle dos trabalhadores, o não pagamento das divida externa e interna, a suspensão das estatizações e que as empresas sejam colocadas sob o controle dos trabalhadores e outras. Mas, o conjunto de propostas anticapitalistas devem se apoiar na necessidade da mobilização dos trabalhadores e da juventude. Dessa forma, a campanha eleitoral dos socialistas revolucionários não pode prescindir do chamado constante à mobilização, insistir que qualquer mudança real dependa da luta e do enfrentamento aos patrões e ao regime é fundamental. Nesse sentido, apesar das insuficiências programáticas apresentadas –não se dá peso algum para a questão da democracia operária e da autogestão da classe trabalhadora no processo de luta anticapitalista, por exemploe da posição equivocada ao se colocar contra a constituição de uma frente de esquerda, a candidatura que mais se aproxima de uma plataforma socialista e que tem alguma representatividade no movimento operário é a de José Maria de Almeida. Por essa razão, chamamos o voto crítico nessa candidatura e nos candidatos do PSTU.


[1] A candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, propõe apenas 7% de investimento do PIB na Educação valor ínfimo de acordo com a demanda.

[2] Nesseíndice quanto mais próximo do número um maior a desigualdade.