Brasil

Não estamos diante de uma disputa entre “direita e esquerda”,
mas de dois projetos de direita

Nem Serra nem Dilma

Somar forças para lutar contra os ataques aos
direitos dos trabalhadores

Práxis, 24/10/10

Em um contexto internacional onde a crise financeira segue trazendo conseqüências nefastas para a classe trabalhadora, pois a classe dominante em todo o planeta busca impor políticas que visam atacar conquistas com o objetivo de transferir para os oprimidos o custa da crise capitalista, em vários países se desenvolve movimentos de resistência com uma clara tendência à radicalização. Após a onda que atingiu países europeus menos centrais como Espanha, Irlanda e Grécia, agora a nova onda de ataques da classe dominante européia começa atingir países centrais como a França.

Nesse último caso, o ataque passa agora pelo projeto de uma reforma previdenciária que dentre outras perversidades está incluso o aumento do tempo de trabalho em dois anos para que os trabalhadores obtenham o direito a se aposentar.

No Brasil e em outros países chamados “emergentes” a crise se manifestou de maneira menos dramática para os capitalistas, o que não deixou de provocar uma série de ataques como redução salarial, demissão em massa e redução de investimentos nos serviços públicos, pois o estado transferiu bilhões de dólares da economia através de empréstimos a custos baixíssimos além de isenção fiscal para que os capitalistas não amargassem prejuízos com o colapso da economia internacional.  Como era previsível nesse momento os partidos e as candidaturas que hoje estão no segundo turno assumiram postura idêntica diante da crise e das conseqüências (ataques) sobre os trabalhadores. 

Para aqueles que tinham dúvida sobre qual caráter de classe teria o governo petista, os dois mandatos de Lula foram mais do que prova empírica para classificá-lo como um governo da classe dominante. Não houve durante essa quase uma década nenhuma ruptura com os oito anos que precederam os dois mandatos de FHC. Os chamados fundamentos macroeconômicos foram mantidos na integra, não houve avanço algum nas reformas de base - Lula manteve a medida provisória que proíbe o INCRA iniciar o processo de desapropriação das terras ocupadas -, nos setores sociais (saúde e educação) a política de privatização e ataques aos servidores públicos se mantiveram, a relação com o capital financeiro se manteve intacta, na verdade houve um aumento significativo das verbas estatais dedicadas ao pagamento das dívidas externas e internas.

É claro que existem diferenças entre as duas legendas em disputa e os dois projetos, mas não se trata de diferenças que tornem uma candidatura ou outra progressistas ou que defenda um “projeto popular”. Não há uma disputa entre privatistas ou estatistas, entre democratas e autoritários, entre éticos e corruptos ou entre nacionalistas ou entreguistas como querem fazer crer as campanhas eleitorais de ambos os lados. Lula, por exemplo, manteve todas as privatizações do governo anterior, fez leilões para privatizar a extração de petróleo das bacias petrolíferas. Na extração do petróleo da camada do pré-sal, a Petrobras (que já tem a maioria das ações na mão do capital privado) será sócia majoritária dos investimentos para garantir às petrolíferas estrangeiras lucratividade. Com Dilma essa estratégia será mantida.

Dessa forma, no que pesem diferenças pontuais, a eleição de Serra (PSDB) ou Dilma (PT) não vai trazer nenhuma mudança real nas condições de existências dos trabalhadores e da juventude. Não estamos diante de uma disputa entre direita e esquerda, mas de dois projetos de direita, onde um quer dominar e garantir a lucratividade através do fortalecimento de determinados setores do estado e da relação privilegiada com os aparatos sindicais e outra através de uma maior liberalização do mercado.

Nesses dois mandatos de Lula, o primeiro serviu para conter a onda de descontentamento das políticas do governo FHC descontentamento que poderia se tornar uma rebelião generalizada como ocorreu em vários países da América Latina, através da continuidade e a ampliação das políticas de compensação social iniciadas no governo anterior o que somado ao bom desempenho das exportações às custas de uma maior primarização da economia brasileira gerou uma sensação de bem estar social, o que explica, em boa medida, a alta popularidade do governo Lula.

Entretanto, essas medidas começam a se esgotar como mecanismos de controle social, essa visão é compartilhada por analistas de políticas sociais de várias vertentes políticas. Cabe a esquerda aprofundar esse debate e dar a batalha política contra as ilusões criadas pelo governo que, em certa medida, contribuíram para a não ascensão do movimento de massa nestes oito anos de governo petista.

Nossa posição no primeiro turno foi de voto crítico no PSTU, por apresentar um programa anticapitalista. Na ocasião lamentamos a política equivocada de vários setores da esquerda (PSOL, PCB e PSTU) em não apostarem na construção da frente de esquerda, da posição nefasta de Heloisa Helena em não se candidatar a presidência - por uma “ironia do destino”, Heloisa Helena e Luciana Genro (PSOL), setores que sustentam uma posição claramente oportunista, não se elegeram.

Essa política jogou água no moinho de Marina Silva (candidata da direita) e em uma votação pífia da esquerda. O caso do PSTU, que obteve apenas 0,08 % na votação, reforça a nossa avaliação sobre o erro de não ter apostado na frente de esquerda. Essa posição levou, também, a maior fragmentação da esquerda que no limite causou o fortalecimento da direita nas eleições.

O próximo período provavelmente não será marcado pelo “otimismo” vivido nos últimos anos, principalmente porque, independente de quem vença, a exemplo do que acontece em toda Europa, os próximos passos, com Dilma ou Serra, será uma nova reforma da previdência que procurará aumentar os anos trabalhados para a obtenção da aposentadoria, assim como outras políticas de ajustes com o objetivo de reduzir o endividamento público com o aumento da transferência de riqueza para o capital privado.

Nenhuma das duas candidaturas irá vacilar na hora de atacar os direitos dos trabalhadores para garantir a lucratividade dos grandes capitalistas. A crise econômica foi um exemplo categórico do que afirmamos, Lula não moveu uma palha sequer para assegurar o emprego de milhares de trabalhadores, pelo contrário, só fez gestões no sentido de garantir os interesses dos patrões. Serra, como era de se esperar, não atuou de forma diferente. Por isso, discordamos veementemente da posição assumida pelos partidos (PSOL e PCB) que através do “voto contra Serra” contribuem com a ilusão de que se Dilma for eleita a situação para os trabalhadores no próximo período será melhor. Essa é uma posição que ultrapassa a linha de defesa de classe e desarma os trabalhadores e a juventude combativa para os grandes embates que se avizinham. Dessa forma, chamamos todos a votar nulo e a realizar uma frente de classe para resistir aos próximos ataques que já estão programados, com Serra ou com Dilma no governo.

Assim nós do Práxis-Socialismo ou Barbárie afirmamos nossa posição de voto nulo no segundo turno e fazemos um chamado após as eleições a retomar a ofensiv, perdida nos últimos anos, contra o capitalismo e as suas mazelas.