V
Encuentro Anual del CEL: “La Guerra del Paraguay:
historiografías, representaciones, contextos”.
Buenos Aires – 3 de novembro de 2008
Mesa Historiografia: Francisco Doratioto (Instituto Río Branco); Mario Maestri (PPGH - UPF); Laura Reali (U. Paris VII)
A
Guerra Contra o Paraguai
História
e Historiografia: Da instauração à restauração
historiográfica [1871-2002]
Por
Mário
Maestri (*)
Enviado por el autor, diciembre 2008
“En
la guerra del Paraguay ha triunfado no solo la República
Argentina sino también los grandes principios del libre
cambio [...].Para el comercio se han derribado las
fortalezas que amenazaban las costas [...]. Cuando nuestros
guerreros vuelvan de su campaña, podrá el comercio ver
inscrito en sus banderas victoriosas los grandes principios
que los apóstoles del libre cambio han proclamado.”
Bartolomé
Mitre
[Arengas, 297].
I.
A Instauração Historiográfica: A Historiografia
das Trincheira
A guerra contra o Paraguai foi acontecimento central da
história do Brasil da segunda metade do século 19. Em um
sentido lato, as ações militares iniciaram–se em 16 de
outubro de 1864, com a intervenção armada do Império no
Uruguai, contra o autonomismo blanco, exigida pelos
criadores rio–grandenses instalados no norte daquele país
e pela política de hegemonia imperial no Prata, e concluíram–se,
em 1º de março de 1870, com a morte de Solano López, em
Cerro Corá, com
o Paraguai já sob ocupação militar do Império.
Dos 150 mil brasileiros que teriam participado no
confronto, talvez até cinqüenta mil morreram devido aos
combates ou por doenças. Uns 0,5% dos dez milhões de
habitantes do Brasil em 1872. Os gastos com o esforço
militar comprometeram por mais de uma década as finanças
brasileiras, ainda que o país tenha recebido indenização
de guerra até a Segunda Guerra, conquistado importantes
territórios ao Paraguai e estabelecido relação hegemônica
sobre o país. Com talvez quatrocentos mil habitantes, o
Paraguai teve sua população sobretudo masculina dizimada
– os autores mais contidos falam de 15% a 20% de mortos. O
país foi ocupado militarmente, amargou perdas territoriais
significativas, arcou com indenizações de guerra, teve
suas terras públicas privatizadas, foi obrigado a endividar–se
internacionalmente, com seqüelas permanentes.
A guerra mostrou o anacronismo geral do Brasil
escravista para enfrentar esforço militar moderno, apesar
da sua dimensão territorial e econômica. Durante o
confronto, a luta abolicionista, o grande movimento nacional
em gestação, foi imobilizada pela retórica da união
diante do inimigo externo, retardando possivelmente a abolição
da escravatura. 1 Os partidos liberal e conservador apoiaram
uma luta rejeitada pelas classes populares e subalternizadas,
sem que qualquer força institucional se opusesse
explicitamente a ela. Positivistas republicanos como
Benjamin Constant divergiram eventualmente da orientação
da Guerra, mas não com a própria guerra. 2
As forças armadas imperiais conheceram salto
qualitativo e quantitativo
com o confronto, transitório sobretudo no relativo
ao Exército, primeira embate significativo contra exércitos
estrangeiros que ocuparam marginalmente o território do
Brasil [Mato Grosso e Rio Grande do Sul]. Até então, o exército
imperial participara apenas de combates internos e de operações
intervencionistas no Plata. A guerra ensejou a gênese da idéia
do Exército–oficialidade como encarnação da honra e dos
destinos do país, proposta que se expressou fortemente nas
artes plásticas e na historiografia.
Ao lado da Descoberta e da Independência, a Guerra do
Paraguai foi objeto de representações patrióticas
excelentes da pintura brasileiras de fins do século 19 e inícios
do século 20. Pedro Américo [1843–1905] consagrou–se
com a "Batalha de Campo Grande" [1871] e a "Batalha
do Avaí" [1872–77]. Em 1972, a exposição do
primeiro quadro na Corte recebeu sessenta mil visitantes.3
Victor Meirelles [1932–1903] consolidou–se com as
encomendas pelo Estado imperial,
em 1868, de "Combate Naval do Riachuelo"
[1882–3] e "A passagem de Humaitá" [1886].
Historiografia de Trincheira
As primeiras obras brasileiras de cunho memorialista
sobre a Grande Guerra Sul–Americana foram realizadas
durante e imediatamente após o conflito.4 Trataram–se
sobretudo de narrativas sobre o heroísmo e a abnegação
das forças armadas nacionais em defesa do Brasil e da
"civilização", agredidos por "barbárie"
corporificada no ditador paraguaio, responsabilizado
exclusivamente pelo confronto. Comumente produto de ex–combatentes,
essa produção registrou uma leitura dos fatos desde a
trincheira brasileira. 5 Paradoxalmente, são raras as
correspondências dos combatentes aos seus familiares que
chegaram até nos, como as enviadas por Benjamin Constant,
escritas de setembro de 1866 a agosto de 1867, sobretudo
para sua esposa e sogro. 6
Destaca–se nessas obras a célebre Retirada da
Laguna: episódio da Guerra do Paraguai, do jovem engenheiro–militar
Alfredo de Escragnolle–Taunay [1843–1899], publicada em
1871, em francês, "por ordem do governo brasileiro".7
Seu sucesso de público transformou os fatos narrados em
legenda paradigmática do confronto. Ela narra a expedição
que, enviada do litoral, no início da guerra, para abrir
segunda frente no norte do Paraguai, invadiu em janeiro de
1867, com 1.600 homens e quatro peças de artilharia, pouco
mais de vinte quilômetros daquele país, até a fazenda da
Laguna, para empreender a seguir, por pouco mais de um mês,
desastrada retirada, sobretudo em território mato–grossense,
fustigada pelas frágeis tropas paraguaias. 8
O relato desvela cenários em contradição com a retórica
patriótico–militarista habitual nessa literatura: operação
arriscada e mal planejada, decidida por oficiais sedentos de
consagração; o medo, o suicídio, a indisciplina e a deserção;
o abandono de combatentes doentes pelos soldados e pelo
comando; o hábito das tropas imperiais do saque, que o próprio
Taunay justificou em alguns casos – "Este saque, aliás,
era legítimo [...]." 9
Fora algumas referências depreciativas a Solano López,
o livro registra comumente a admiração com a belicosidade,
disciplina, engenhosidade e operosidade dos guaranis, vistos
como excepcionais "campeiros"; "grandes
mateiros"; ativos trabalhadores; soldados fiéis;
coesos e disciplinados na luta. 10
A obra registra igualmente a cultura habitual nessa
produção memorialista de defesa intransigente pela
oficialidade da honra e dos brios do país feridos pela
"agressão" paraguaia. Mesmo quando o autor
critica oficiais da coluna, apresenta–os como abnegados
patriotas – uma outra característica dessa primeira
literatura sobre o confronto, ausente nas cartas de Benjamin
Constant aos seus familiares e amigos, prenhes de duras críticas
sobretudo a Caxias. Como
habitual nessa produção, ao igual que nas cartas recém–citadas,
não há quase descrições dos soldados, jamais nominados,
a não ser no geral, como combatentes, como doentes, como
desertores, etc.
Apesar da informação paradoxal fornecida sobre os
fatos, A retirada da Laguna ensejou narrativas patrióticas
subseqüentes apresentando a patética operação como feito
bélico e humano superior aos mais heróicos atos militares
universais. Em maio de 1952, no "Prefácio" à 13ª
edição, o historiador Afonso de E. Taunay [1876–1958]
refere–se às façanhas narradas pelo seu pai como um dos
"mais elevados feitos dos anais militares das nações
do Ocidente".11 A
obra prosseguiu e prossegue motivando estudos, pinturas,
esculturas, monumentos, comendas, concursos, celebrações
patrióticas, jogos educativos, etc., patrocinadas sobretudo
pelo Exército e pelo Estado.
A narrativa memorialista sobre a guerra contra o
Paraguai foi produzida em geral por oficiais e profissionais
liberais que participaram da Guerra, sem grandes informações
sobre suas razões profundas, sobre o Paraguai e sua
sociedade e, não raro, sobre o próprio Império, uma
entidade na época sobretudo política, devido à sua fortíssima
regionalização.
Historiografia Republicana
O golpe republicano de novembro de 1889 expressou os
interesses dos grandes proprietários provinciais,
desobrigados pela superação da escravatura, em maio de
1888, da sustentação do centralismo monárquico.12 Ele deu–se
sob a égide da alta oficialidade do Exército, interessada
na consolidação e radicalização das propostas das forças
armadas como representantes dos interesses da nação,
fortalecendo–se a seguir a historiografia nacional–patriótica
sobre o grande confronto.13
A proposta de identidade nacional republicana, elitista
e autoritária, com as forças armadas como guardiãs dos
interesses magnos da nação, apoiou–se fortemente nas
narrativas nacional–patrióticas sobre a Guerra. A elevação
dos oficiais monárquicos maiores que intervieram naquele
conflito ao status de figuras luminares da nação
republicana levou a que praticamente todos os patronos das
diversas armas e corpos do Exército e da Marinha sejam
oficiais enobrecidos pelo Império que se destacaram nos
combates paraguaios. Nesse processo, foram simplesmente
sufocadas as duras críticas à condução do conflito, como
as feitas por Benjamin Constant, em sua correspondência
pessoal, ao marquês de Caxias, acusado de inepto e de
covarde, ou as feitas a Osório, por André Rebouças, em
seu diário. 14
O marechal–de–exército Lima e Silva, duque de
Caxias, tornou–se o patrono do Exército; Manuel Luís Osório,
marquês do Erval, da Cavalaria; marechal Emílio Mallet,
barão de Itapevi, da Artilharia; Antônio Sampaio,
comendador da Imperial Ordem da Rosa, da Infantaria; Joaquim
Marques Lisboa, marques de Tamandaré, patrono da Marinha de
Guerra. Apenas a Força Aérea Brasileira não se encontra
tutelada por um alto oficial consagrado em 1864–1870,
talvez porque os balões cativos então utilizados
pertencerem ao Exército.
A historiografia republicana consolidou a instauração
da narrativa nacional–patriótica construída através da
seleção–organização das apologias do Estado e das
classes dominantes imperiais sobre o conflito. Essa produção
despreocupou–se com as razões e os cenários sociais e
nacionais da Guerra, privilegiando a apresentação cronológico
de confronto, definido como choque entre a civilização e a
barbárie, promovido pela agressão ao Brasil motivada por
Solano López, que seguiu sendo apostrofado de
"tirano", "ditador", "megalômano".
etc., como já o fora, durante os combates, sobretudo pela
imprensa.15 Em
abril de 1864, o jornal mitrista Nación Argentina propunha:
"El Brasil representa la civilización y Paraguay la
barbarie." 16
Para corroborar a visão de embate essencialmente
querido pelo ditador paraguaio, essa historiografia
consolidou comumente como ponto zero do confronto o
aprisionamento do vapor mercante brasileiro Marquês de
Olinda, em 12 de novembro de 1864, em águas paraguaias, sem
declaração de guerra, e não a invasão pelo Império, um
mês antes, do Uruguai, apoiado pela Argentina mitrista,
fato anunciado anteriormente pelo governo paraguaio como
casus belli, pois condicionava a saída ao mar do Paraguai
à vontade do Império e da Argentina, nas mãos da
oligarquia bonaerense, nações com as quais possuía
problemas de fronteiras, de navegação dos grandes rios e
de autonomia nacional. Essa historiografia ignorou
olimpicamente o fato de que o Império preparava–se para
guerra com o Paraguai, se possível com o apoio e a
participação do unitarismo argentino, que sequer
reconhecia a independência paraguaia, considerando ainda
aquela nação como província desgarrada. 17
Em Invasão paraguaia na fronteira brasileira do
Uruguai, escrito após a retomada de Uruguaiana, o cônego
João Pedro Gay reconhece ainda as razões gerais do
confronto, ainda que em forma parcial: "O General
Francisco Solano Lopez [...] vendo em meados de 1864 travar–se
a luta entre o Império do Brasil e o Governo [...] do
Uruguai, estremeceu [...], temendo que o Brasil, com quem não
tinha contas justas, lha espedaçasse, derrubando seu
governo despótico [...] logo que houvesse derrotado os
blancos de Montevidéu, e em seu furor, resolveu ele
declarar a guerra o Brasil.". Em 1944, comentando o
livro, o historiador rio–grandense major Sousa Doca
agregava candidamente que com "a intervenção do
Brasil no Estado Oriental [...] nenhuma ameaça sofria o
equilíbrio do Rio da Prata [...]." 18
Historiografia Paraguaia
A historiografia republicana brasileira propôs que a
guerra fosse apenas contra Solano López, retomando a retórica
justificativa do Tratado da Tríplice Aliança, que pactuou,
no início do conflito, o fim da autonomia real paraguaia
através da apropriação de parcelas dos seus territórios;
de pesadas reparações de guerra; do desarmamento do país;
da sua ocupação por cinco anos; da formação [contra o
direito internacional] de Legião Paraguai; da
internacionalização de sua navegação interna; da
constituição de governo colaboracionista; de rendição
incondicional, etc. Lançou a responsabilidade pela dizimação
da população sobre o ditador e sobre o próprio povo, por
segui–lo na aventura. Essa literatura encerra–se com a
morte de Solano López, em Cerro Corá,
olvidando a aplicação impiedosa das condições do
Tratado, que apontavam para as razões estruturais do
conflito.
Comumente em forma obliqua, essa narrativa registrou
quase perplexa a singular resistência paraguaia, paradoxo
que jamais superou, devido à impossibilidade de explicar o
imenso esforço bélico e as enormes baixas do Império para
vergar uma nação de menor importância, em aliança com a
Argentina mitrista e com o apoio simbólico dos colorados
uruguaios de Venancio Flores [1808–1868]. Realidade em
geral apresentada como produto da preparação militar
paraguaia prévia e do fanatismo e
desprezo pela vida, se não da selvageria, de população
de origem guarani vista, até hoje, com menosprezo pelas
classes médias e dominantes brasileiras.
A marcialidade paraguaia seguiu como enigma sem resolução.
Ela dificultou que a guerra galvanizasse o imaginário
popular brasileiro, que se manteve em geral infenso à retórica
nacional–patriótica, alimentado por lembranças tênues
das tristezas que o conflito ensejara aos
combatentes e à própria população. Jamais foi
escrita história da participação popular brasileira na
Guerra, que continua sendo cultuada sobretudo pelo Estado e
pelas forças armadas.
Ultimamente, ensaia–se com dificuldade a construção
de legenda da história regional do confronto e da participação
popular no mesmo.
As interpretações nacional–patrióticas brasileiras
de inspiração estatal sobre a Grande Guerra Sul–Americana
prosseguiram plenamente hegemônicas até a década de 1970,
sem questionamentos por parte da historiografia acadêmica
ou extra–acadêmica nacional, desde 1964 sob o peso de
ditadura militar. A própria literatura histórica inspirada
pelo Partido Comunista Brasileiro, forte após a II Guerra
Mundial, condicionada pelas suas visões
nacional–populistas, pouca importância deu à Guerra,
reforçando comumente a proposta da transformação do exército
imperial em força nacional de tendência democrática
durante aqueles sucessos, devido à captação de segmentos
médios em seu oficialato.
Em História militar do Brasil, de 1965, o historiador
e general Nélson Werneck Sodré [1911–1999], militante do
PCB, propunha, referindo–se a uma inverossímil
democratização racial das forças armadas imperiais
durante o confronto no Paraguai: "Fora sempre frouxo,
na tropa regular [o rótulo da pele], e a guerra [do
Paraguai] o liquidou quase totalmente." Porém, o autor
ressalta a não alteração da "composição" da
"oficialidade" e lembra que após o conflito os
efetivos do Exército foram reduzidos drasticamente,
chegando, quando da República, a um máximo de treze mil
homens, sua dimensão antes daqueles combates. 19
II. O Revisionismo Historiográfico: Por uma História
dos Povos
Em um sentido lato, o revisionismo historiográfico,
como interpretação contraditória às explicações
justificadoras do Império brasileiro e da Argentina
mitrista, é contemporâneo à própria guerra, expressando–se
poderosamente sobretudo através de intelectuais argentinos
federalistas como Juan Bautista Alberdi [1810–1884] e José
Hernández [1834–1886], que denunciaram o confronto como
uma agressão do Império do Brasil e do Unitarismo liberal
portenho contra os direitos provinciais argentinos e contra
a autonomia uruguaia e paraguaia. 20 Em pleno confronto,
Aberdi propunha, em total oposição à retórica da
oligarquia liberal portenha: "Paraguay representa la
civilización, pues pelea por la libertad de los ríos
contra las tradiciones del monopolio colonial; por la
emancipación de los países mediterráneos; por el noble
principio de las nacionalidades; por el equilibrio, no sólo
del Plata, sino de toda la América del Sur." 21 Essa
narrativa dissidente pouca repercussão teve no Brasil, à
exceção da sua utilização no brilhante trabalho do
historiador Raul de Andrada e Silva, de 1978, sobre o
Paraguai do dr. José Gaspar de Francia, que passou
praticamente até hoje despercebido da
historiografia brasileira especializada. 22
Apoiado também nessa leitura do conflito, o
revisionismo sobre a Grande Guerra Sul–Americana tomou
igualmente pé no Paraguai. A reorganização liberal do país
sob ocupação militar do Brasil
promoveu a extensão–adaptação das interpretações
imperiais pelas primeiras narrativas paraguaias, com enorme
ênfase na responsabilidade pelo conflito de Solano López,
decretado "traidor a la patria"
pelo governo colaboracionista, em agosto de 1869,
antes mesmo de sua morte. Desde início do século passado,
revisionismo histórico, impulsionado inicialmente sobretudo
por Juan E. O´ Leary [1879–1969], sob a oposição
governamental, empreendeu resgate daqueles sucessos desde ótica
nacional paraguaia, que destacou o heroísmo do soldado
guarani e de Solano López, elevado à posição de herói
nacional. 23
Condicionado pela época e realidade do país, o
lopismo alcançou enorme repercussão, ao interpretar
contradições profundas sobretudo dos sentimentos dos
segmentos populares paraguaios com as narrativas oficiais
dos vencedores e das classes liberais do país sobre a
Guerra Grande. É violência analítica apresentar esse
movimento, de complexidade e dimensão social, como mero
produto de mega–operação imobiliária empreendida pelos
herdeiros de Solano López. Ou deslegitimá–lo devido à
sua utilização política pelo Partido Colorado e à elevação
do lopismo à ideologia oficial, sobretudo por Alfredo
Stroessner [1954–98], falecido no exílio, no Brasil, em
2006. 24
O revisionismo paraguaio, de fortes vertentes patrióticas,
propôs que a guerra, desejada pela Inglaterra, destruíra
um país, antes da guerra, forte e feliz. Nesse sentido, em
20 de novembro de 1932, no artigo "El Paraguay, lo que
fue, lo que es y lo que será", Manuel Domínguez
(1868–1935) propunha que, quando dos López, "no había
una sola familia sin hogar [...]. En instrucción [...] se
adelantó a Europa y a América [...]. Era el único país
sudamericano que no estaba en bancarrota, el único de
moneda sana [...] ninguna nación americana le igualó en
producción". 25 Destaque–se que após a guerra, sob
governos paraguaios liberais e ditatoriais, as terras públicas
foram privatizadas e transformadas em geral em latifúndios,
comumente de propriedade de estrangeiros, em boa parte
argentinos, desorganizando profundamente o
campesinato paraguaio já dizimado pelos combates.
Essa produção revisionista foi praticamente desconhecida
pela historiografia brasileira.26
Desde os
anos 1950, no contexto de fenômenos mundiais essenciais
como o fortalecimento do movimento de libertação nacional
na Ásia e na África; as revoluções argelina, vietnamita
e cubana; o fim da hegemonia stalinistas nas ciências
sociais marxistas; as jornadas mundiais de 1968, etc., novas
leituras revisionistas procuraram superar as narrativas
patrióticas das classes dominantes nacionais sobre a Grande
Guerra Sul–Americana, desvelando suas causas essenciais
partir da ótica das classes subalternizadas, na construção
de uma história unitária dos povos americanos.
Nesses anos, destaca–se sobretudo o revisionismo
historiográfico argentino sobre a Grande Guerra, como os
ensaios de Enrique Rivera, José Hernández y la Guerra del
Paraguay, de 1954, e de Milciades Peña [1936–1965],
La era de Mitre: de Caseros a la Guerra de la Triple
Infamia, de 1955–7, de corte marxista, e os artigos de
inspiração revisionista, americanistas e antiimperialistas
de José Maria Rosa [1906–1991], de 1958–1959, reunidos
no livro La
guerra del Paraguay y las Montoneras Argentina, de 1964.27
Em geral, esses autores aprofundaram e radicalizaram as
interpretações federalistas, em estudos de grande
complexidade. Por exemplo, Milciades Peña refutou
totalmente a explicação da guerra como iniciativa inglesa,
responsabilizando por ela plenamente o Império e a
oligarquia liberal e unitária portenha. "Ni la monarquía
coronada brasileña ni la oligarquía mitrista hicieron la
guerra del Paraguay por encargo de Inglaterra, aunque al
terminar la guerra el principal beneficiario de la destrucción
del Paraguay y la miseria de sus vencedores fue el capital
londinense." 28
Ausências Importantes
Essa produção, que se apoiou na crítica federalista
coeva à guerra e no revisionismo paraguaio – e teve forte
repercussão naquele país –, passou igualmente quase
totalmente despercebida no Brasil, devido aos frágeis laços
culturais entre as duas nações e ao Golpe Militar de 1964,
que desorganizou a intelectualidade progressista brasileira
e tornou aquele confronto tema praticamente tabu, devido à
sua importância para a ideologia oficial e para as Forças
Armadas. Em verdade, até mesmo os escritos clássicos de
Juan Bautista Alberdi [1810–1884], da época do confronto,
eram de difícil acesso ao grande público e são ainda
pouco conhecidos no Brasil.
O livro Il Napoleone del Plata, do jornalista Manlio
Cancogni e do historiador Ivan Boris, publicado, em 1970, na
Itália, e traduzido, em 1975, pela Civilização Brasileira,
tradicional casa editorial de esquerda, primeiro estudo
revisionista de larga divulgação no Brasil, integrou à
explicação do confronto o estudo da história do Paraguai,
destacando a orientação autárquica e anti–oligárquica
de José Gaspar Rodriguez de Francia y Velasco [1766–1840]
para assegurar a independência paraguaia questionada pela
oligarquia comercial de Buenos Aires, política que teria
favorecido o campesinato de origem guarani.29 Sobre o
sentido dessa autonomia, Alberdi propusera: "El
aislamiento del Paraguay [...] es simple resistencia a la
política de aislamiento y colonial de Buenos Aires
[...]."30
Uma orientação autonomista inicial em processo de
superação tendencial no longo governo de Carlos Antonio López
[1970–1962], que abriu relativamente o país ao exterior e
ao capital mercantil, sem romper os laços sociais com o
campesinato, política seguida no geral por seu primogênito,
Francisco Solano López [1827–1870]. Apoiados em uma
escassa informação sobre as raízes guaranis do Paraguai,
os autores destacam a importância das missões jesuíticas
e, a seguir, das "fazendas estatais" na formação
daquela nação.
O estudo maximisa o desenvolvimento conhecido pelo
Paraguai, a partir da propriedade pública de grande parte
das terras do país, arrendadas aos camponeses, e do monopólio
do comercio exterior, que ensejou a indiscutível modernização
relativa da nação, apesar da sua relativa pobreza
– fundição, ferrovia, telégrafo, ensino público,
etc. Apresenta leitura inovadora ao público brasileiro:
narrativa cronológica dos combates desde ótica simpática
aos paraguaios; sugestão do país como Estado–nação em
consolidação, de sólidas raízes guarani–camponesas;
esboço de análise desde as estruturas sociais paraguaias;
uma mais equilibrada apresentação de Francisco Solano López,
mesmo sendo o livro claramente antipático a ele, etc.
Apesar do seu caráter inovador e qualidade literária,
a publicação italiana teve limitada repercussão no
Brasil, conhecendo apenas uma edição, segundo parece
devido à proibição de reedição pela ditadura. Na orelha
do livro, o editor Enio Silveira [1925–1986] apresentou em
forma apologética Solano López como "verdadeiro
condutor de povos, chefe militar de grande brilho e coragem
incomum", "patriota paraguaio", "político
em busca de efetiva independência nacional e contrário às
oligarquias postas a serviço do imperialismo britânico então
dominante". Realizava radicalização e modernização
da ação do presidente como liderança nacionalista e
americanista estranha ao proposto na obra que lançava.
Revisionismo no Brasil
Em 1968, León Pomer lançara na Argentina La guerra
del Paraguay: gran negócio!, publicado no Brasil sob o título
A Guerra do Paraguai: a grande tragédia rioplatense, anos
depois, em 1979. O livro se despreocupava dos confrontos bélicos,
empreendendo ampla análise das razões políticas, diplomáticas
e econômicas da Guerra, destacando as contradições entre
o caráter autárquico e autônomo do Paraguai e as
necessidades de penetração do imperialismo no Plata, através
das ações dos governos da Argentina e do Império do
Brasil. Para o historiador, a Inglaterra seria a
"grande beneficiária da guerra".31
O livro conheceria uma segunda edição em 1980 e o
autor publicaria, a seguir, um outro breve ensaio sobre o
tema, Paraguai: nossa guerra contra esse soldado. 32 Esse
seria praticamente o único livro conhecido amplamente no
Brasil da significativa e refinada
publicística argentina sobre a guerra.
Como assinalado, em 1978, o historiador e professor de
história da América da USP, já aposentado, Raul de
Andrada e Silva [1905–1991], publicou sua tese de
doutoramento, defendida no Departamento de História da
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas daquela
universidade – Ensaio sobre a ditadura do Paraguai
[1814–1840]. 33 Dividido
em três partes – "A crise da Independência"
–; "O remate da crise: a ditadura"; "O
sistema ditatorial" –, e apoiado em uma muito rica
bibliografia platina e paraguaia, sobretudo editada, o
estudo apresenta uma complexa análise do processo que
ensejou a gênese e consolidação da ditadura autárquica e
estatal–monopolista do dr. Francia, como expressão de
movimento autonomista paraguaio contra Espanha e o
colonialismo portenho, apoiado nos pequenos criadores,
plantadores e no largo e amplo campesinato de origem guarani,
fortemente interpretados pelo regime francista.
O fato de que esse trabalho sobre a fundação do
Paraguai independente, que determinou tão profundamente os
regimes de Carlos Antonio e Francisco Solano López e a própria
guerra, de singular equilíbrio, erudição e densidade,
tenha sido desconhecido por praticamente todos os trabalhos
brasileiros posteriores, ensejou grandes e importantes
lapsos analíticos sobre as causas da Guerra e sobre o próprio
conflito, em um indiscutível e desnecessário processo de
empobrecimento da historiografia brasileira especializada.
Em março de 1979, com Genocídio americano: a Guerra
do Paraguai, o jornalista Júlio José Chiavenatto,
retomando algumas das teses revisionistas, superava as
apresentações factuais nacional–patrióticas dos combates com ampla discussão das
razões do confronto, apresentado como agressão do governo
brasileiro e argentino contra a nação e o povo paraguaio,
em vez de produto da vontade de líder desvairado.
Lançado dias após a posse do último general–ditador,
o estudo conheceu enorme consagração, esgotando–se a
primeira edição em uma semana e quatro outras em três
meses, sem referências na imprensa. O livro teve 32 edições
na prestigiosa editora Brasiliense, fundada por Caio Prado Júnior
[1907–1990], e sete, na Editora Moderna, conhecendo tradução
ao espanhol e edições piratas no México e no Paraguai [em
guarani]. 34
Com talvez mais de cento e cinqüenta mil exemplares
vendidos, o livro tornou–se referência da historiografia
brasileira, pautando os futuros estudos e debates sobre a
Grande Guerra Sul–Americana. A redação para o grande público,
sem notas de roda–pé, em linguagem jornalística erudita,
facilitou o enorme acolhimento, determinado sobretudo pelo
momento da publicação, que condicionou a própria feitura
do trabalho, quanto à forma, linguagem e conteúdo. As seqüelas
da crise mundial de meados de 1970 embalavam a retomada das
mobilizações sindicais e democráticas, trincando a
hegemonia construída pela ditadura apoiada no "Milagre
Econômico" e na repressão. Sob os golpes da depressão
salarial e dos investimentos, a população enfarava–se da
retórica da ordem militar da qual entrevia os interesses
que representava.
Chiavenatto desconstruía a grande narrativa
militar–patriótica da história do Brasil,
em 1979, ano em que a retomada das lutas sindicais
alcançou o apogeu, colocando o mundo do trabalho como referência
por mais de uma década no país. A volta das lutas sociais
brasileiras levaria a seguir à fundação do PT e da CUT,
então anticapitalistas e classistas. A nova realidade político–social
exigia representações do passado interpretando as
necessidades dos trabalhadores e criava condições para a
sua recepção. Em 1978, Jacob Gorender, ex–preso político
e ex–militante do PCB e do PCBR, publicara O escravismo
colonial, estudo erudito sobre a escravidão, que galvanizou
o mundo acadêmico ao superar o impasse em terno das origens
capitalistas ou semi–feudais do Brasil. O livro conheceu
uma segunda edição em 1978. 35
Produção e Recepção
Não dispomos de análises das fontes, produção,
recepção, epistemologia, etc. de Genocídio americano, que
o autor apresenta nas páginas introdutórias como "reportagem,
escrita com paixão" e não como obra historiográfica,
produto do esforço de historiador de profissão. 36
Teceremos algumas considerações sobre a obra apenas para
enquadrá–la na presente apresentação. Quase constrange
assinalar a deslegitimação e liquidação a que o estudo
foi objeto, a partir de crítica sumária das suas insuficiências,
no contexto da ignorância do sentido de obra quase parida
por necessidade histórica que transformou o jornalista em
historiador autodidata, a partir do nível de conhecimento
sobre a guerra no Brasil. Os críticos extremados jamais se
perguntaram por que a historiografia acadêmica não pariu
leitura semelhante; por que do enorme silêncio que se fez
sobre um trabalho como o de Raul de Andrada e Silva; sobre
as razões da necessidade de quase 25 anos para a produção
de questionamento essencial daquele ensaio, através de
apresentação geral do confronto.
Ter nascido fora de Academia então emasculada pelas
derrotas sociais de 1964 e 1969–1970 e por quinze anos de
ditadura ajuda a compreender as grandes qualidades e as
enormes limitações dessa obra, nascidas as últimas
sobretudo da absolutização–simplificação de tendências
que se materializam através de complexas mediações e da
ênfase desmedida de fenômenos e processos históricos
objetivos. A mais célebre expressão da primeira tendência
é a defesa da guerra como resultado direto das necessidades
do imperialismo, em oposição à interpretação marxista
argentina, dos anos 1950, como assinalado. Essa tese
transformava os governos do Império do Brasil e da
Argentina liberal mitrista em meras marionetes inglesas.
Aqueles governos teriam
feito a guerra "por um só motivo: defender os
interesses econômicos da metrópole–mãe [...]." 37
Super–determinação imperialista que resta qualquer
importância aos processos endógenos das nações periféricas.38
A vontade das classes hegemônicas do Império e do
mitrismo, representante da oligarquia portenha, essencial no conflito, foi potenciada, ao confluir com o
interesse inglês de imposição do liberalismo na região.
Em Cartas dos campos de batalha do Paraguai, o diplomata
britânico sir Richard F. Burton [1821–1890] registrou a
visão da grande potência da guerra: "Minhas simpatias
vão para o Brasil, pelo menos enquanto sua 'missão' for
desaferrolhar [...] o grande Mississipi do Sul."39
A crítica da radicalização de Chiavenatto da
guerra como exigência dos interesses ingleses serviu para
que o imperialismo britânico e os interesses livre–cambistas
fossem em forma ainda mais arbitrária absolvidos de toda
responsabilidade no confronto, em movimento de conteúdo político–ideológico
que chegou a propor a impugnação da própria categoria
"imperialismo".40
No livro, são recorrentes as radicalizações–absolutizações
enfáticas, de fenômenos em geral objetivos e com referências
documentais: autarquia inicial absoluta do Paraguai; país
moderno, de população totalmente alfabetizada e avançada
siderurgia, ferrovias, telégrafos, etc. 41 Questões em
geral colocadas em suas dimensões reais pelo citado
trabalho de Raul de Andrada e Silva.
São comuns extrapolações de fenômenos: "arianização"
do Brasil com o arrolamento de afro–descendêndentes;
um branco para cada 45 soldados negros, o que levaria
a que só uns três mil brasileiros europeus tivessem lutado
no Paraguai; soldados paraguaios sobretudo
euro–descendentes ["cinco brancos para um mestiço ou
negro"], apesar da base guarani das tropas e do povo
paraguaio.42
É também comum a utilização de categorias contemporâneas
na descrição de fenômenos do passado, tais como
"nacionalismo", "consciência nacional",
"indústria de base", "parque
industrial", etc., para facilitar a compreensão e
promover reflexão sobre a realidade da época da publicação
do trabalho. Esses anacronismos reforçaram a tendência à
extrapolação das realidades analisadas. 43 Tais pecadilhos
não anulam as importantes superações sugeridas: razões
materiais da guerra; importância da intervenção no
Uruguai, também como agressão à autonomia paraguaia;
discussão da formação social paraguaia; dificuldades
estruturais do Império escravista de livrar guerra
nacional; derrota objetiva dos povos envolvidos no conflito;
privatização das terras públicas paraguaias; satelitização
do Paraguai; crítica à diabolização de López; avaliação
histórica dos atos de guerra, etc.
Genocídio americano foi o primeiro trabalho historiográfico
brasileiro a realizar crítica geral desde a ótica das
populações envolvidas no confronto, desorganizando as
representações hegemônicas. Por além dos lapsos e
insuficiências assinalados e não assinalados, conformou o
imaginário histórico brasileiro porque galvanizou a difusa
memória popular do rosário de horrores que fora aquela
guerra, semi–soterrada pelo discurso nacional–patriótico.
A obra exigia superação [hegeliana], através de sua crítica
sistemática, a ser realizada em grande parte coma a simples
recuperação de produção já pré–existentes, com
destaque para a historiografia argentina, processo que
jamais ocorreu, devido sobretudo à dissolução das condições
históricas que geraram o movimento revisionista.
Chiavenatto seria objeto de enorme campanha de
deslegitimação, por parte de intelectuais orgânicos do
Estado, da grande mídia, da Acadêmica, etc. hoje concluída,
realizada sobretudo através de negação de suas negações
que ensejou verdadeiro restauro das narrativas
nacional–patrióticas. Praticamente trinta anos após sua
edição, nos encontramos ainda terçando armas em torno de
Genocídio americano, o que já registra sua importância
histórica. Mesmo assim, gostaria de aproveitar a
oportunidade para registrar a homenagem a esse intelectual
que enfrentou, como os combatentes paraguaios, com as armas
e condições que dispunha, em forma destemerosa, combate
historiográfico e ideológico crescentemente desigual e difícil
com as bem apetrechadas forças auxiliares do Estado
brasileiro.
III. A Restauração Historiográfica: Retorno às
Trincheiras
O impulso do mundo do trabalho dos anos 1960 refluiu
nos anos 1970 e foi batido em fins de 1980 pela maré
contra–revolucionária mundial que consagrou a hegemonia
mundial da produção capitalista, hoje em franca crise econômica.
Esse movimento promoveu fortíssimo recuo das representações
ideológico–culturais que procuravam interpretar o passado
desde a ótica do mundo social. No campo historiográfico,
decretou–se a impossibilidade de interpretação do
passado, e portanto, o fim da história como ciência,
substituída pelo relato da "vida privada", do
"imaginário", do "singular", do
"exótico", etc. Os defensores de esforços analítico–interpretativos
do passado para a transformação do presente tiveram suas
trincheiras plenamente assaltadas.
A rejeição
das "narrativas totalizantes" valorizou as novas
histórias política e cultural, em restauração das velhas
interpretações idealistas do passado, com ênfase na a
narrativa política factual. A história voltou a ser lida
como produto da ação errática de protagonistas excelentes
e os fenômenos sociais, como produto de determinações
ideológico–culturais. Esse processo de restauro foi geral
à historiografia, destacando–se no Brasil no que se
refere à escravidão colonial, onde se impôs impugnação
e deslegitimação dos avanços obtidos com a definição da
estrutura escravista
colonial brasileira e a compreensão da oposição entre
escravizadores e escravizados como luta de classes. 44
Quanto à guerra contra o Paraguai, movimento
historiográfico restauracionista apoiado pelas forças
sociais triunfantes e impulsionado pela mídia,
desqualificou igualmente o revisionismo anterior como mero
produto de ideologia "autoritária",
"populista", "socialista", etc.,
centrando as impugnações nos lapsos factuais e
interpretativos, potenciados ao absurdo, sobretudo da obra
de Chiavenatto, e ignorando os avanços obtidos, como
assinalado, e sobretudo, a toda a produção que não se
enquadrava às críticas restauracionistas. Definimos esse
processo de restauracionista pois, mesmo quando apoiado em
recursos metodológicos refinados e ampla informação, não
conseguiu superar essencialmente a modernização, atualização
e refinamento das narrativas inspiradas nas visões de mondo
das classes dominantes das épocas dos sucessos, ancestrais
sociológicas dos segmentos hoje dominantes, devido à
dependência ideológica e epistemológica a esses últimos.
Historiografia de Transição
Dois anos após a "Queda do Muro de Berlim",
Ricardo Salles publicou A Guerra do Paraguai: escravidão e
cidadania na formação do Exército,
refinado trabalho de inspiração marxista, de
sentido transicional, que, apoiado em avanços e temas
revisionistas, desembocou na recuperação da tese do caráter
progressista do Exército surgido no confronto. 45 Esse
estudo, que apenas avançou sugestões sobre a sociedade
paraguaia, que Raul de Andrada e Silva analisara
substancialmente, empreendeu refinada definição do caráter
escravista do Brasil, apoiado nos avanços assinalados das
ciências sociais marxistas. Salles critica a ignorância
dos interesses singulares do "Estado imperial
brasileiro", representante de classes escravistas que
confrontaram o ataque britânico ao tráfico internacional,
e assinala a vontade inglesa de obstaculizar "potência
regional hegemônica" no Plata, fosse o Brasil ou a
Argentina.46 Visão que não lhe impede de retomar no geral
a tese de León Pomer da determinação do confronto pela
"expansão do capitalismo da época, especialmente do
capitalismo britânico na região platina".
Salles impugna a definição do Paraguai como "nação
independente do imperialismo" e igualitária,
ressaltando apenas sua diversidade em relação aos "vizinhos,
em especial do Brasil escravista". Assinala a
incapacidade da elite crioula paraguaia de se impor quando
da Independência e o dinamismo da "comunidade guarani",
que propõe em dissolução tendencial durante os governos
dos presidentes perpétuos. No geral, aponta – no mesmo
momento que elide – o necessário estudo da sociedade
paraguaia para a compreensão dos sucessos.
Sua grande contribuição é a ênfase do caráter
escravista do Estado brasileiro que, em momento de grande
estabilidade, na luta pela hegemonia no Prata, necessária
para a sua afirmação no Brasil e na América do Sul, não
deixou espaço ao Paraguai que a solução militar,
empreendida por Solano López, em grande parte devido à
superestimação relativa das contradições internas da
Argentina, do apoio do governo uruguaio blanco e da
fragilidade interna do Estado escravista brasileiro.47
Destaque–se que os blancos uruguaios e o governo
paraguaio esperavam a sublevação dos cativos do Brasil.
Expectativa talvez superestimada, mas não fantasiosa, como
comprovam a movimentação das escravarias do meridião rio–grandense,
quando da invasão de Jaguarão pelos blancos, em janeiro de
1865, e o movimento insurrecional servil de Porto Alegre, em
junho de 1968, com envolvimento de prisioneiros paraguaios.
48 Não era também descabelada a esperança no apoio dos
federalistas argentinos, como sugerem a deserção maciça
da cavalaria entrerriana, as sublevações provinciais
antimitristas e as violentas montoneras que convulsionaram o
interior argentino durante a Grande Guerra.
Fragilidade Estrutural
Ricardo Salles ressalta a fragilidade estrutural do Exército
e da Guarda Nacional, milícia dos escravistas, capazes de
enfrentar ameaças internas e confrontos do Plata com países
sem "estrutura bélica centralizada". A indefinição
da sociedade paraguaia leva o autor a explicar a
marcialidade guarani como devida a uma precoce e ampla
militarização e à "centralização do poder",
em reflexão profundamente insuficiente e claramente
circular. 49
Retomando propostas da historiografia
nacional–populista, Salles defende que a necessidade de
construir "exército profissional", apoiado na
"Guarda Nacional", nos "corpos de polícia
das provinciais" e na convocação dos "Voluntários
da Pátria" levaria o governo imperial a empreender
"esforço de recrutamento de dimensões nacionais",
fortalecendo oficialidade imbuída de missão moralizadora e
civilizadora nacional, então expressão dos "anseios e
aspirações de grupos sociais emergentes". 50 Abraçando
as visões da conquista–cooptação dos dominados pelo
consenso, propõe que o arrolamento popular–patriótico não
foi "simples mentira para escamotear a coerção do
recrutamento", obtendo "sucesso e um grau satisfatório
de aceitação".51 Na defesa da tese da formação de
exército nacional semi–consensual, em um sociedade
escravista pré–nacional, minimiza o arrolamento dos
libertos, sugerindo não ultrapassarem "10% do conjunto
das tropas", contra os 20% proposto por Robert Conrad.
Uma questão que permanece ainda em aberto. 52
Com frágeis dados empíricos, escora sua proposta em
reflexões lógicas e circulares, propondo que "mobilização"
geral para criar a "nova instituição nacional" não
poderia se apoiar no "uso maciço da população
escrava", pois isso "abalaria a própria essência
do poder escravista", motivando revolta servil ou
inviabilizando a "ideologia do Voluntário da Pátria".
53 A coesão da ideologia do Voluntariado é tese a ser
comprovada, e a guerra farroupilha e registrou a capacidade
dos escravistas em servir–se de cativos, talvez em maior número,
na defesa de seus interesses. 54
Apesar da fragilidade das fontes, as múltiplas formas
de arrolamento e de origens dos soldados ["recruta,
voluntário, substituto ou liberto"; homens livres;
africanos livres; cativos crioulos e africanos; libertos;
aborígines; caboclos; estrangeiros, etc.]
registram o caráter não–cidadão e não–nacional
das tropas. Nos fatos, o Império recorreu aos cativos por não
poder mobilizar homens livres suficientes, apoiado na retórica
patriótica, na convocação coercitiva, na emulação
material [soldo, gratificação, terra]. Salles reconhece
que o eventual "ardor patriótico" inicial
decresceu logo, certamente quando se compreendeu o caráter
violento de uma guerra que não terminaria como se cria em
alguns meses, levando
a que "o grosso da tropa" fosse "organizado
coercitivamente". 55
Mesmo assinalando o estranhamento entre os oficiais
combatentes e a tropa, Ricardo Salles termina concluindo:
"A guerra mostrou a esses oficiais o lado podre da
laranja; colocou–os em contato e proximidade com o soldado
enquanto expressão do povo [sic]." 56 Como dito,
defende a constituição de "exército nacional
profissional", reformista, descontente com a "classe
dominante" e "elites dirigentes do Império",
de oficialidade portadora de "sementes de inquietação
e questionamento social". 57
Exército Cidadão
Um novo exército que – formado com "conceito
mais amplo de cidadania", identificado com os "interesses
gerais da nação", devido à "ligação
constitutiva com os setores médios" – desempenharia
"papel de peso no início do processo de transição
para uma economia capitalista", como porta–voz das
"camadas médias" "de populares e escravos e
mesmo fazendeiros não escravistas", de "setores
dissidentes das oligarquias." 58 Proposta em oposição
à idéia de inexistência de povo na escravidão, na acepção
moderna do termo, e com uma oficialidade escolhida e educada
nos princípios e nas práticas da desigualdade civil e
racial, normas comportamentais e funcionais das forças
armadas imperiais, que contribuiriam para o caráter
elitista e autoritário da república brasileira. Fenômeno
que ensejou, como assinalado, a referida quase absoluta ausência
de descrições sobre
as tropas das narrativas memorialistas. Em sua correspondência
familiar, nos raros casos em que se refere aos soldados,
Benjamin Constant anota indignado que chamavam
"criminosos", "facínoras condenados às galés",
"escravos", "estúpidos e miseráveis cativos"
para defender a "honra e os brios da nação brasileira".
Ou seja, soldados não dignos da nação.
59
Em rápida abordagem do desempenho real das forças
armadas imperiais, Salles
descontrói a sua própria proposta de
exército como expressão de vontade nacional, devido
à forte concorrência da classe média ao oficialato, ao
descrever tropas mal transportadas, mal alojadas, mal
vestidas, habituadas ao roubo de oficiais e ao saque de
militares e civis inimigos, não raro para poderem se
alimentar.60 Tropas apáticas e em permanente processo de
defecção, mantidas na disciplina por constantes e cruéis
castigos físicos, tratados duramente pela oficialidade, à
qual respondiam não raro com atos de sangue.
Um caráter não–nacional e não–cidadão dos exércitos
imperiais que se expressou na recomendação de Caxias de
manter os soldos dos oficiais em dia, para que fizessem
frente às necessidades, e os dos soldados, atrasados três
meses, para que não desertassem, já que com as algibeiras
cheias, e para economizar os salários dos mortos por doença
e combate! 61 André Rebouças, arrolado de maio de 1865 a
junho de 1866 como engenheiro–militar, registra oficiais
comandantes com três meses, oficias de tropa com até seis
meses e soldados com um ano de soldos atrasados! O soldo
era, lembre–se, fundamental para literalmente sobreviver
no front. 62
Assinalando a profunda distinção de classe nas forças
armadas imperiais, o jovem engenheiro–militar Alfredo
Taunay lembrava que, já no final da campanha, para
alimentar–se bem, associara–se a um pequeno grupo de
oficiais, formado sobretudo por rio–grandenses,
contribuindo para o rancho, preparado por subalterno,
"excelente cozinheiro", com "cota mensal"
de 7 a 12 livras esterlinas! 63
Tropas imperiais que, segundo o próprio Caxias, não
sofrendo a "influência moral" dos oficiais, aos
quais eram, folga dizer, em quase tudo, estranhos, deveriam
ser tratadas duramente, sobretudo durante os combates,
quando sua "indisciplina" e "tibieza"
causariam perdas de "oficiais prestimosos, cheios de
inteligência e de coragem".64 Caráter não–nacional
que se materializava igualmente na oposição social, mesmo
violenta, entre inferiores a superiores, como registram os
três atentados à oficiais, em apenas oito dias, no
acampamento de Tuiuti, assinalados por Caxias. 65
Restauração Historiográfica
Em fins de 1990, com a consolidação do movimento
geral de restauração historiográfica no Brasil,
impulsionada pela mídia; por programas de pós–graduação;
por agências financiadoras; por grandes editoras, etc.,
criavam–se as condições ideais para a concretização
desse processo quanto à Guerra do Paraguai, de singular
importância, devido o caráter central daqueles fatos para
a ideologia de Estado e ao sucesso de público de Genocídio
americano: a Guerra do Paraguai, de J. J. Chiavenatto.
Em 1889, Francisco Doratioto defendeu a dissertação
de mestrado "As Relações entre o Império do Brasil e
a República do Paraguai. (1822–1889)", na
Universidade de Brasília. Em 1991, publicou
estudo de divulgação, pela Editora Brasiliense – A
guerra do Paraguai: 2ª visão – e, em 1996, ensaio mais
alentado, pela Editora Ática – O conflito com o Paraguai:
a grande guerra do Brasil. 66 Os cinco anos de diferença
entre os dois trabalhos registram importante evolução na
leitura dos fatos pelo autor.
Na "Introdução" de A guerra do Paraguai: 2ª
Visão, Doratioto prometeu superar as limitações da "historiografia
tradicional" que "personalizara" a história,
ao "apontar as ambições do ditador Solano López
como causadoras da guerra" e
da "teoria 'imperialista'", então
"dominante", que responsabilizara a Inglaterra
pelo confronto. Para o autor, o conflito seria
essencialmente produto da "formação e definição do
caráter dos Estados nacionais, em que setores da classe
dominante seriam hegemônicos na organização estatal e,
portanto, mais beneficiados por ela, na região do Rio da
Prata." 67 Portanto, uma proposta de análise que se
dispunha superar a historiografia nacional–patriótica e
os lapsos das leituras revisionistas brasileiras.
Em análise sobretudo político–nacional, Doratioto
apresenta sinteticamente a conjuntura do Prata quanto aos países
envolvidos nos acontecimentos, da crise do regime colonial
ao início da guerra, enfatizando a tentativa da burguesia
mercantil portenha de impor sua hegemonia regional, grande
razão da independência e do isolamento paraguaio, como
proposto.68 Assinala que a vontade de domínio hegemônico
do Prata levou igualmente Império a obstaculizar a
reconstituição nacional do Vice–Reinado do Prata em
torno de Buenos Aires.
O autor analisa o relacionamento entre o Império e o
Paraguai, determinado pela vontade do último de demarcar as
fronteiras a partir da situação quando do fim do regime
colonial, enquanto o Império, interessado na livre navegação
dos rios paraguaios para escoamento da produção
mato–grossense, defendia delimitação apoiada no princípio
do uti possidetis de facto, ou seja, na ocupação dos
territórios por seus habitantes em contínua expansão.
Ressalta que o
Império e a Argentina mobilizavam–se para que o Paraguai
não se tornasse potência regional.
Em 1852, a queda de Rosas e a consolidação da
oligarquia mercantil portenha criaram nova situação. Na década
seguinte, o esforço autonômico do governo uruguaio blanco
levou a que o Brasil se aproximasse da Argentina
liberal–mitrista que concordou com intervenção apoiada
nos colorados uruguaios, associados à manutenção da
submissão em relação à Argentina e sobretudo ao Império.
Ao contrário, os blancos uruguaios contavam com o apoio ou
simpatia da província de Entre Ríos, dos federalistas
argentinos e do Paraguai, interessado em garantir uma saída
ao mar. 69
Hegemonia Compartida
A aquiescência da Argentina mitrista enfraquecida à
intervenção imperial selaria a sorte do Paraguai. Segundo
o autor, "no final dos anos 1850 e inícios da década
seguinte, a hegemonia do Império só não era completa no
Prata devido à resistência do governo de Assunção."
70 O controle do Uruguai e do porto de Montevidéu punha fim
à possibilidade de livre saída ao mar do Paraguai e
assentava golpe terrível no federalismo argentino,
ensejando que o governo paraguaio determinasse, conseqüentemente,
a intervenção no Uruguai como casus belli.
Em 1864, a intervenção no Uruguai ensejou o envio de
tropas paraguaias para ocupar as terras em litígio com o
Brasil, no atual Mato Grosso do Sul, e pedido à Argentina,
nas mãos dos liberais portenhos, de direito de passagem de
tropas por Corrientes, para atacar ao Império. Em 1856, a
Confederação Argentina acordara aquele direito ao Império,
contra o Paraguai. A esperada negativa de Mitre de conceder
a autorização motivou declaração de guerra à Argentina
que enfraqueceu o apoio paraguaio naquele país.71
Apesar da
ênfase nas relações político–diplomáticas, o ensaio
esforça–se em definir sociologicamente os grandes
protagonistas históricos, em superação de historiografia
meramente político–descritiva. Juan Manuel de Rosas é
proposto como
"líder dos produtores de charque para exportação",
apoiado pelos "comerciantes e financistas portenhos,
monopolizadores do comércio exterior." 72 Propõe que
os colorados uruguaios representassem sobretudo os
"comerciantes" e as "potências européias"
vinculados às "idéias liberais", enquanto os
blancos, os "proprietários rurais" "que se
opunham à intervenção européias no país". 73
Os unitários argentinos são definidos como
"basicamente" "comerciantes de Buenos
Aires", que "defendiam um modelo
centralizado", enquanto os federalistas, como grandes
estancieiros, "pequenos manufatureiros e comerciantes
vinculados ao mercado regional", favoráveis à
descentralização. 74 Afirma–se que "apenas a
burocracia imperial" era capaz de defender a escravidão,
ao dispor "de meios diplomáticos e políticos capazes
de se oporem às pressões britânicas" anti–tráfico
e possuir a capacidade de confirmar as "prerrogativas
dos grandes proprietários rurais" de "manter a
ordem" e seus "privilégios". 75 Portanto, um
conflito que envolvia as principais classes sociais da região,
mais do que as nações nas quais se organizavam.
O autor propõe sobre o governo de Carlos López:
"Na ausência de um setor social com experiência
administrativa e capital financeiro para tanto, o Estado
assumiu essa dinamização, passando a representar os
interesses da nascente burguesia rural, ligados à expansão
do regime capitalista, com base na exploração da agropecuária
e mão–de–obra barata e disciplinada, visando ao mercado
externo." 76
Dois Caminhos
Sobretudo nas páginas finais, o ensaio empreende
justificativa sistemática da ação do Império,
acompanhada sempre da apresentação da busca de hegemonia
pelas "classes dominantes" do Império e da
Argentina que desembocou no terrível drama. É também
clara no estudo a tendência a uma leitura relativista da ação
das nações, como jogo normal de defesa de seus interesses,
estranho a qualquer valoração ética: "A guerra
iniciada em 1865 interessava, por diferentes motivos, a
todos os Estados envolvidos."77 Visão em contradição
com a apresentação da forte pugna no interior de Estados
como a Argentina e o Uruguai.
Como prometera o autor, o ensaio supera
substancialmente as apresentações maniqueísta da
historiografia nacional–patriótica brasileira do dr.
Francia, de Carlos Antonio López e, sobretudo, de Francisco
Solano López, apresentados como estadistas interessado na
promoção de suas nações. Em Guerra do Paraguai: 2ª Visão,
não encontramos sequer uma das tradicionais demonizações
do chefe de Estado paraguaio ou de suas tropas, próprias à
literatura tradicional brasileira.
Ao contrário, o autor tenta circunscrever as razões
objetivas da derrota paraguaia, que se deveria,
"basicamente" a "dois motivos". "De
um lado, Urquiza faltou aos compromissos que contraíra com
Solano López, privando–o de apoio efetivo dentro do
Argentina. Por outro, no Uruguai, os blancos não se
mantiveram numa resistência prolongada em Montevidéu, como
era esperado [...]." 78
Na conclusão, o autor retoma a crítica à tese
"imperialista",
apresentada como "resultado de bandeiras das
lutas políticas dos anos 60 e 70 – como o
antiamericanismo e terceiro–mundismo –, projetadas na análise
do passado, em busca de fundamento histórico". Visão
não de todo incorreta, apesar de redutora e imparcial, de
uma tese inglesa esposada por apenas parte da literatura
revisionista, em geral de corte popular–americanista.
Lembra pertinentemente que a superestimação do
imperialismo sugere a incapacidade dos povos e estados periféricos
de determinarem sua própria história.
Uma crítica a
[parte do] revisionismo [brasileiros] que não impede o
reconhecimento da sua importância historiográfica:
"Cabe, porém, ao revisionismo o mérito de demonstrar
a fragilidade da historiografia tradicional sobre o tema e
questionar a utilização dessa guerra na construção de
mitos. Enfim, o revisionismo fez ressurgir o interesse pela
guerra [...], a qual, no Brasil, até então era quase
exclusivamente motivo para comemorações, nas datas das
grandes batalhas, e de referência ao se buscar as origens
da construção do Exército que derrubaria a Monarquia em
1889."
Na sua brevidade, A Guerra do Paraguai: 2 ª Visão, de
1991, constituiu
importante contribuição ao conhecimento histórico
daqueles acontecimentos que apontava para duas grandes
possibilidades de desdobramento: a radicalização crítica
da leitura revisionista ou a recaída na defesa apologética
das ação do Estado imperial. Paradoxalmente, parecia
pender mais para a primeira alternativa.
Uma Nova Leitura
Em O conflito com o Paraguai: a grande guerra do
Brasil, de 1996, Doratioto avança a análise, abordando o
conflito propriamente dito. O ensaio caracteriza–se pela
inflexão do esforço de interpretação sociológica e
estrutural dos sucessos e pela ênfase da defesa da ação
do Estado imperial, em um viés não raro já claramente
nacional–patriótico. 79 Em verdade, o trabalho inicia com
a afirmação paradoxal de que o "Império demonstrou
[no Paraguai] sua capacidade de travar uma guerra com
características inéditas que o obrigaram a mobilizar
recursos humanos e materiais em larga escala". 80 E
retoma, igualmente, a proposta de Salles da modernidade das
forças armadas paridas no confronto: "Foi o Exército,
que o Estado imperial estruturara durante a guerra do
Paraguai em padrões modernos de organização e armamento,
o instrumento que pôs fim a Monarquia [...]."81
No segundo capítulo, empreende apresentação das
disputas do Plata anteriores ao confronto, sem o destaque ao
amplo papel desempenhado pela oligarquia portenha no
conflito do primeiro ensaio, no contexto de uma já
permanente absolvição–relativização das
responsabilidades do Estado imperial, em geral através da
ignorância de questões fundamentais, como a disposição
do Brasil em entrar em guerra com o Paraguai, muito anterior
ao conflito, e a garantia da independência uruguaia por
aquele país, como condição para sua autonomia nacional.
A Guerra do Mate
O autor utiliza recursos narrativos para elidir
contradições históricas, como a referência neutra à
"queda de Rosas", sem registro da também
participação do Império, ou a pasteurização textual das
responsabilidades imperiais na intervenção no Uruguai, em
1864, com apoio da oligarquia portenha. "O governo
argentino, que rompera relações diplomáticas com o
Uruguai, reconheceu o direito [sic] de o Império agir
contra esse país, sempre respeitando [sic] a integridade
territorial [sic] e a independência uruguaias.
[sic]."82
A abordagem telegráfica da sociedade paraguaia e
semi–ignorância do caráter das sociedades brasileira,
uruguaia e argentina sinalizam a retomada substancial de análise
político–factual, de "trincheira", desde a ótica
das classes dominantes imperiais, da historiografia
nacional–patriótica. A própria decisão de Pedro II de
prosseguir a hecatombe é elogiada: "Foi a persistência
[sic] do imperador, no crítico ano de 1868, em favor do
prosseguimento da luta [sic] que abortou qualquer discussão
sobre seu fim que não fosse pela vitória militar." 83
Ainda que matizada, retoma–se a diabolização
tradicional do inimigo, totalmente ausente no primeiro
trabalho, como assinalado: "[...] o navio de guerra
paraguaio Iporá, [...] tinha 'à vista do público, uma
corda contendo grande quantidade de orelhas humanas, postas
a secar, que pertenciam aos infelizes tripulantes da
[canhoneira] Anhambaí." 84 Afirma–se sobre o combate
de 3 de novembro de 1867: "A soldadesca [sic]
paraguaia, em lugar de continuar a combater, entregou–se
ao saque [...]." 85 A tropa imperial, salvo engano, não
recebe jamais tal tratamento.
Embrenhado nas contradições da historiografia
nacional–patriótica, para explicar a tibieza das tropas
imperiais, que reconhece numerosas e bem armadas, retoma os
argumentos tradicionais da falta de preparo inicial dos exércitos;
de conflitos políticos internos; das "peculiaridades
do conflito", etc., como se esses handicaps negativos
contassem apenas para as tropas imperiais.
Pequeno e Mal Armado
Sobre a invasão do Rio Grande, afirma: "[...] o
Exército brasileiro [em senso estrito] era pequeno e mal
armado, contando com no máximo dezoito mil soldados com
moral baixo [...]." "Durante a guerra do Paraguai
não houve trégua na encarniçada luta política"
entre liberais históricos, liberais progressistas e
conservadores. "Compreende–se [...] a facilidade com
que as forças paraguaias avançaram em território
brasileiro". Esquece
que apenas o Rio Grande tinha população maior do que a
assinalada para o Paraguai, superando os 430 mil habitantes,
em 1872.86
A inoperância da Armada deveria–se ao fato de seus
navios terem "dificuldades para manobrar em vias
fluviais" e às "desconfianças de Tamandaré para
com o aliado argentino".87 A passividade do almirante
nasceria também de sua "idade avançada", apesar
de não ter ainda 57 anos ao assumir o comando no Plata,
enquanto que, ao entrar em Assunção, Caxias cumpriria os
66 anos! O autor convém que o substituto de Tamandaré não
primou também pela decisão, sem explicar tal fato.88
Quando da guerra, com a acusação de que Tamandaré
sofresse de "decrepitude precoce", criticava–se
ironicamente a sua falta de decisão nos combates. 89
Acompanham
as justificativas do vexame militar imperial no Plata
elogios áulicos dos oficiais maiores. Sobre Osório, lemos:
"Seu retorno ao Paraguai teve efeito psicológico
positivo sobre o Exército imperial, pois esse general
gozava de grande prestígio perante os soldados graças à
sua capacidade tática [sic], a coragem e frieza em combate
e pela camaradagem com os subalternos." Não se
registra como tal prestígio fogueou as tropas imperiais no
combate aos paraguaios e não há referimento às duras críticas
sofridas pelo general, como as realizadas pelo
oficial–engenheiro André Rebouças. 90
Lê–se sobre Caxias na batalha da ponte de Itororó,
em 6 de dezembro de 1868: "[...] Caxias, que
acompanhava a luta de uma colina, desembainhou a espada e
aos gritos de 'Vivas ao Imperador e ao Brasil'!, lançou–se
sobre a ponte, gritando para a tropa que o seguisse, sendo
alvejado [sic] pelas balas dos defensores que chegaram a
matar seu cavalo. Graças a esse ato temerário, Caxias
consegui pôr fim à debandada de seus soldados, que,
entusiasmados, retornaram ao ataque e conquistaram a
ponte." 91 Proposta que abandona de todo a
historiografia para abraçar a legenda militar–patriótica.
Esses elogios áulicos não são extensivos a Solano López:
entretanto, se explicarmos a produtividade dos exércitos
como conseqüência direta de seus oficiais superiores, posição
para nós inaceitável, o paraguaio mereceria o denominativo
de "Napoleão do Prata", ao conseguir resistir com
escassas tropas mal–armadas, por tanto tempo, ao enorme
esforço militar aliancista!
Retomam–se as explicações da combatividade
paraguaia como produto da repressão; atraso nacional;
galvanização carismática. "Durante a guerra o
governo paraguaio estendia a punição daqueles acusados de
falta grave, como tradição, rendição ou deserção, também
aos familiares. [...] todo soldado paraguaio era responsável
pelo seu companheiro de trincheira [...]." Fatos que
transforma a "fidelidade e sacrifícios extremos que
caracterizaram os combatentes paraguaios", além da sua
"combatividade", fenômenos sem explicação.92
Já em 1979, no citado Ensaio sobre a Ditadura do
Paraguai, Raul de Andrada e Silva dissertava longamente
sobre a singularidade do exército paraguaio, "um dos
setores públicos que mereceu preferencialmente os cuidados
do governo" do Paraguai independente, com os
"soldos" "superiores aos de qualquer
categoria burocrática". Tropas formadas através do
"recrutamento" seletivo dos "jovens mais
fortes e bem apessoados de cada localidade", através
de um país essencialmente camponês. Jovens que,
ingressando nas tropas como soldados, podiam ascender aos
"postos da hierarquia, cujo maior grau era o de Capitão".
Portanto, um exército de perfil fortemente plebeu e
nacional, em tudo estranho às tropas imperiais, expressão
de um Estado escravista. 93
O Soldado e o Oficial
A incompreensão do baixo desempenho dos soldados e dos
oficiais imperiais diante da paradoxal resistência
paraguaia, sobretudo quando os soldados guaranis defendiam
os territórios nacionais atacados, deve–se à ignorância
das determinações tendenciais dos exércitos e de seus
comandantes pelas estruturas sociais profundas e suas
vinculações com as mesmas. A indiscutível genialidade
militar Napoleão foi produto de forças militares ensejadas
pela França nacional–cidadã parida pela Revolução que
identificava a população à nação e alçava ao
oficialato seus homens mais capazes.
A surpresa de Taunay com formas paraguaias de combate não
enquadradas pela oficialidade era idêntica a dos
monarquistas que combatiam os patriotas franceses:
"Usavam [...] de uma manobra nova: deitavam–se por
traz dos acidentes do terreno e daí nos faziam fogo,
deixando ver apenas as cabeças; depois, [...] furtavam–se
à nossa vista." 94 Luta de homens livres impossível
de ser utilizada pelos exércitos imperiais e argentinos sob
a ameaça permanente da deserção.
Por além da falsa modernidade, as forças armadas
imperiais sofreram sempre a determinação de sociedade
escravista não–nacional. Realidade registrada na visão
aristocrática da oficialidade brasileira da bravura como
valor intrínseco, que valorizava ataques frontais e exposição
ao perigo, resultado de mortandades desnecessárias
sobretudo de soldados. Falando
dos momentos finais da guerra, Taunay recordava: "Osório
queria atacar logo de frente desfazendo os meios de resistência
do inimigo. 'Leva–se tudo, afirmava ele, a cachações num
instante.' 'Mas por que perder inutilmente gente?'" –
objetava o conde D' Eu, que servira em exércitos europeus.
95
Realidade fixada na ojeriza de Caxias à tropa formada
substancialmente por negros livres, libertos, alforriados,
etc., não adaptados a um exército moderno, devido ao caráter
não–cidadão e não–nacional do Império, e
não à má qualidade racial, como propunha o Barão.
Em correspondência confidencial de 13 de dezembro de 1868,
o velho militar, fogueado no combate aos cativos sublevados,
lembrava que: "[...]
todas as vitórias alcançadas, desde que me coube a honra
de assumir o Comando do Exército Brasileiro, têm sido em
grande parte devidas ao cuidado com que nunca consenti que
forças nossas, quer de infantaria, quer de cavalaria se
batessem com as do inimigo sem se acharem muito superiores
em número." 96
Destaque–se no ensaio as interessantes páginas sobre
"O açougue paraguaio": a impopularidade da
guerra", que retomam a tese revisionista da oposição
da população brasileira livre ao confronto, o que
impediu a constituição do exército nacional proposto,
formado por homens livres voluntários, obrigando o
arrolamento coercitivo e a compra de cativos, sobretudo
quando se esvaíram as ilusões gerais da vitória em alguns
meses: "Tais desapropriações [sic] eram bem pagas, a
ponto de talvez terem apresentado, segundo Sodré, a maior
despesa brasileira no conflito."
130 Anos Depois
Em 23 de novembro de 1994, a Biblioteca Nacional
promoveu seminário sobre a Guerra do Paraguai, sob a
coordenação do historiador Carlos Guilherme Motta, com a
participação do historiador inglês Leslie Bethell;
do sociólogo peruano radicado no Brasil Enrique
Amayo; do historiador Fernando Novaes; do historiador
argentino radicado no Brasil León Pomer;
do contra–almirante Max Justo Guedes; do
historiador Eduardo Silva; do historiador Francisco
Alambert; do advogado e crítico de arte paraguaio Ticio
Escobar e de Alberto da Costa e Silva, então embaixador do
Brasil em Assunção.
Patrocinado pelo Banco Real e pela Fundação Roberto
Marinho [Rede Globo], com introdução especial de Leslie
Bethell, o livro Guerra do Paraguai: 130 anos depois reuniu
as breves intervenções desses destacados intelectuais,
sobretudo paulistas e fluminenses, não raro sem pesquisas
específicas sobre o tema. O trabalho destacou–se
sobretudo pela critica do historiador inglês à tese da
influência do imperialismo britânico no conflito, não
raro retomada como palavra definitiva sobre a polêmica
historiográfica.97 O livro apresenta alentada
"Bibliografia da Guerra do Paraguai", com
trabalhos depositados na Biblioteca Nacional.
Na introdução "A guerra do Paraguai: história e
historiografia", profundamente simpática à "Tríplice
Aliança", Leslie Bethell apresenta a guerra como decisão
de Solano López – "erro que traria conseqüências
trágicas para o povo uruguaio" –, motivada por razões
entre as quais o eventual impulso de "personalidade
megalomaníaca" com o objetivo de realizar o
"sonho de construir um império". Assinala
igualmente a "pouca atenção por parte dos
historiadores" que o conflito conhecia naquele então,
não apenas no Brasil. 98
No texto "O imperialismo britânico e a Guerra do
Paraguai", questiona a tese da responsabilidade direta
e indireta do imperialismo britânico, que lembra ser
perfilhada, no geral ou no particular, por autores como Eric
Hobsbawm, André Gunder Frank [1929–2005], León Pomer,
José Alfredo Peñalba, etc.99 Registra enorme admiração
pela hegemonia mundial do capitalismo britânico no século
19; questiona a determinação mesmo "informal" da
política sul–americana pelo imperialismo; sugere as
vantagens advindas do relacionamento dos latino–americanos
com os súditos da Rainha.
Quando à questão em análise, destaca a importância
do Brasil e da Argentina
para os interesses do capitalismo britânico na América
Latina e a pouca relevância do Paraguai, certamente em
parte devido à especificidade daquela nação, da Independência
até a Guerra, ou seja, de política estatal de controle público
das terras e do comércio exterior, de sentido profundamente
anti–liberal e livre–cambista e, conseqüentemente,
anti–inglês. Assinala o interesse britânico na "unidade política"
da Argentina, ou seja, apoio à oligarquia portenha e à sua
política, e na "manutenção da livre navegação nos
principais rios da região".
Progresso & Civilização
Leslie Bethell lembra a posição "acentuada e
abertamente antiparaguaia" de sir Eduard Thornton
(1817–1906) , representante diplomático inglês no Plata,
que acompanhou as confabulações contra o governo uruguaio
"blanco" e defendeu diante da representação
paraguaia o direito de interferência armada do Império no
Uruguai. Reconhece que Thornton, como "também a
maioria das autoridades britânicas apoiavam os
Aliados", pois viam "de modo crítico o regime de
López", considerando,
"em última análise", a Guerra como
incentivadora do "progresso e civilização contra
retrocesso e barbárie". Ou seja, meio de imposição
do domínio pleno do liberalismo livre–cambista na região,
ao igual do que já ocorria no Brasil e na Província de
Buenos Aires.
Destaca os importantes empréstimos concedidos à
Argentina mitrista e ao Brasil imperial para financiarem a
Guerra e o abastecimento permanente dos exércitos da Aliança
em navios, canhões, munições, armas, etc., que justifica
a partir da estranha idéia de que o capital não se
preocupa com a política quando pode lucrar. Aceita que a
"Grã–Bretanha praticamente não fez qualquer
tentativa de mediação" para finalizar com o conflito,
mesmo tendo López proposto, durante a guerra, conceder
parte dos territórios reivindicados em troca da paz.
Os dados e as reflexões do historiador inglês
corroboram a tese de que, mesmo não sendo a Guerra política
incentivada diretamente pelo governo inglês, o ataque dos
governos do Império e
da Argentina unitarista contou sempre com a simpatia e com o
apoio dos interesses britânicos. Primeiro, por
"desaferrolhar" região de ordem "barbárica"
anti–liberal, que dificultava o "livre comércio".
Segundo, devido os enormes negócios que assegurou ao
capital britânico, certamente o grande vitorioso nesse
conflito.
Leslie Bethell conclui sua vigorosa defesa do
imperialismo em afirmação que fusiona simploriamente
governos e populações nas suas respectivas nações,
Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, apresentando–as
como os únicos responsáveis, ontem e hoje, pela hecatombe:
"A Grã–Bretanha – e as suas supostas [sic]
ambições imperialista – não podem mais ser utilizada
como bode expiatório para a Guerra do Paraguai. A
responsabilidade primordial dessa guerra cabe à Argentina,
ao Brasil e, em escala menor, ao Uruguai e, naturalmente, ao
próprio Paraguai. A Guerra do Paraguai foi uma guerra civil
[sic] regional, muito embora com uma dimensão internacional
muito interessante e digna de nota [sic]."
Hiato Sem Repercussão
Em 1995, o historiador mato–grossense Jorge Luiz
Prata de Sousa defendeu na Universidade Nacional Autónoma
de México dissertação de mestrado versando sobre o
"mito brasileiro sobre os voluntários da pátria",
publicada em 1996. Escravidão ou morte: os escravos
brasileiros na Guerra do Paraguai constitui trabalho
revisionista extemporâneo, de alto nível acadêmico. 100Após
argutas páginas de crítica da historiografia
nacional–patriótica posterior à guerra e à República,
destaca a importância das apologias sobre o
"voluntariado" na construção das narrativas do
Exército como expressão da nacionalidade.
Apologias como as de Paulo de Queiroz Duarte, em Os
Voluntários da Pátria na Guerra do Paraguai: "E o
apelo do Imperador, endereçado ao voluntariado, teve
profunda ressonância na alma de seus súditos [...] o
entusiasmo popular extravasou em transportes patrióticos,
enchendo as ruas e praças das principais cidades do país
de considerável multidão, vibrando de fé na justiça da
causa, pronta a cerrar fileiras em torno do Imperador. [...]
A causa nacional passou a empolgar a alma do povo
[...]."101
Narrativas retóricas nacional–patrióticas que
praticamente obscureceram o caráter fortemente coercitivo
do recrutamento. O autor lembra que foi efetivamente a
resistência dos homens livres em se alistarem, apesar das
vantagens oferecidas, sob a pressão estatal, que levou à
decisão imperial de comprar e incorporar cativos ao Exército
e à Armada, como assinalado.
Apoiando–se sobretudo no estudo das cartas de
alforria concedidas no Rio de Janeiro, explicita as contradições
que dificultaram o arrolamento: a luta dos grandes proprietários
pelo controle da mão–de–obra servil; as duras condições
de existência e o racismo ["preconceitos
sociais"] nas forças armadas; o caráter elitista da
Guarda Nacional; o uso político do recrutamento; o alto preço
médio dos cativos vendidos ao Estado [quase dois contos de
réis]; a deserção sistemática sobretudo dos recrutados e
substitutos; o caráter pré–nacional do Estado
escravista, etc. 102
Demonstra igualmente a pouca confiabilidade dos dados
gerais administrativos sobre o recrutamento de cativos,
sugerindo estudos através do levantamento nacional das
cartas de alforrias, com o objetivo de elucidação
qualitativa e quantitativa geral desse processo. Em forma
geral, Escravidão ou morte: os escravos brasileiros na
Guerra do Paraguai foi semi–ignorada, quando da discussão
sobre o tema.
A Grande Mídia
Em 9 de novembro de 1997, o caderno Mais, da Folha de São
Paulo, ressaltava a necessidade do restauracionismo
historiográfico sobre a Guerra contra o Paraguai em artigos
coordenados por R. Bonalume Neto – "Novas lições do
Paraguai". A operação jornalística escancarava o viés
ideológico em sua chamada: "Historiadores revêem a
tese de que o país de Solano López teria sido uma Cuba
[Sic] do século 19 derrotada pela aliança militar do
Brasil com a Argentina e o Uruguai [sic]." A matéria,
afirmava que o Brasil teria
conhecido "rolo compressor ideológico [sic] nos últimos
anos do regime [sic] de 64, principalmente graças a dois
best sellers desse nacional–populismo revisionista, As
veias abertas da América Latina, do uruguaio Eduardo
Galeano, [...], e Genocídio Americano: A Guerra do
Paraguai", de J.J. Chiavenatto. 103
Nesse então, os principais trabalhos acadêmicos
restauracionistas eram o livro de Ricardo Salles e sobretudo
o segundo ensaio de Doratioto, obras sintéticas de escasso
alcance de público. Assinaram os artigos encomendados José
Murilo de Carvalho e Pedro Paulo
Soares; André Amaral de Toral; Francisco Doratioto;
Guido Rodríguez Alcalá; Marco Antônio Villa e, prova de
pluralismo da iniciativa, León Pomer, que tentava explicar,
mais uma vez, o sentido de sua proposta sobre o imperialismo
na Grande Guerra.
Salvo engano, a intervenção da grande imprensa na
orientação ideológica da historiografia brasileira não
foi ainda estudada. Essas publicações, com centenas de
milhares de exemplares,
possuem enorme poder de legitimação–deslegitimação
da produção cultural. A historiadora sul–matogrossense
Ana Paula Squinelo registrou a influência direta daqueles
artigos na sua posterior decisão de abordar a Guerra, em
dissertação de mestrado de cunho restauracionista, de
2001.
Em A guerra do Paraguai, essa desconhecida: ensino, memória
e história de um conflito secular, essa autora propõe três
períodos para a historiografia nacional sobre a Guerra, não
explicando as razões e origens mais profundas dos mesmos:
um primeiro, dos anos 1920 a 1960, de visão "patriótica",
como nas obras do general Augusto Tasso Fragoso
[1869–1945] e José Francisco da Rocha Pombo
[1857–1933]; um segundo, desde 1960, de "visão ´imperialista´
do litígio, com destaque para Chiavenatto e Pomer e,
finalmente, um terceiro, a partir de 1980, de estudos
"inovadores e menos tendenciosos [sic]". 104
O interessante trabalho sintetiza a incapacidade
restauracionista de superar as contradições apontadas pela
análise de literatura que a autora investiga, até então
pouco utilizada, com destaque para a produção paraguaia.
Sem empreender sínteses explicativas, Squinelo limita–se
quase à apresentação das diversas narrativas, lado a
lado, ou à corroboração da tese da guerra como devida à
formação das nações do Plata, que enseja a absolvição
tendencial de responsabilidades. Critica fortemente às
apresentações revisionistas esquemáticas e simplistas dos
livros didáticos, sem propor superação para a esse
literatura, a não ser sugestões da associação – às
narrativas áulica sobre os "grandes homens" –
do estudo das "pessoas simples" no conflito. 105
Em 2000, sob o patrocínio do Instituo Histórico e
Geográfico de Mato Grosso do Sul, o engenheiro–agrônomo
Acyr Vaz Guimarães [1919–2005], sócio–correspondente
da Academia de História Militar Terrestre do Brasil,
publicou A guerra do Paraguai: verdades e mentiras,
trabalho pára–historiográfico, no qual, "em 214
pontos", propõe–se a desmentir Chiavenatto, com
destaque para a já tradicional comprovação da não
participação inglesa no confronto. O livro retoma e
potencia as grandes propostas da historiografia
nacional–patriótico e registra a visão da alta
oficialidade do Exército brasileiro da luta contra o
revisionismo sobre a Guerra como parte do combate ao
"comunismo" no Brasil. 106
Vinte e Cinco Anos Mais Tarde
Em 2002 e 2004, foram publicados dois ambiciosos
trabalhos gerais restauracionistas, de diversa qualidade e
repercussão. Em 2004, o coronel do Exército Maya Pedrosa,
que viveu no Paraguai, publicou A catástrofe dos erros: razões
e emoções na Guerra contra o Paraguai, na coleção
Biblioteca do Exército, que dirigira, resposta explícita
às "apreciações pessimistas e iconoclastas"
marxistas "sobre o passado nacional, marcando o
desprestígio de seus estadistas, diplomatas, soldados e do
povo brasileiro que foi lutar na guerra". 107
Na "Introdução", o oficial registra a
enorme admiração pelo livro Maldita guerra: nova história
da Guerra do Paraguai, do historiador Francisco Doratioto,
lançado dois anos antes. Reconhece que, após aquele
trabalho, "continuar em frente [com seu livro]
talvez" fosse "temerário. 108 Não apenas devido
ao limite do nosso presente trabalho, analisamos Maldita
guerra, já que segue linhas gerais concorrentes ao de Maya
Pedrosa, em um
elevado nível de qualidade, excelência e erudição, que o
qualificou como obra paradigmático do restauro historiográfico
sobre o conflito, finalmente plenamente consolidado.109
Esse extenso trabalho, de quase quinhentas páginas de
texto, publicado ricamente
pela prestigiosa Companhia da Letras, como nos
trabalhos anteriores, critica em forma explícita o
revisionismo paraguaio, brasileiro e latino–americano,
propondo realizar nova e mais equilibrada leitura dos fatos.
Uma intimidade do autor nascida de mais de uma década de
pesquisa explicita–se na valiosa revisão bibliográfica e
documental, que o torna obra referência e imprescindível
ao estudo da questão. Entretanto, o autor não cita e não
discute trabalhos referencias da produção marxista e
americanista revisionista argentina sobre a Guerra como os
de Milciades Peña, Enrique Rivera, Eduardo
Luis Duhalde, etc. Não utiliza igualmente o
importante trabalho de Raul de Andrada e Silva.
Uma das singularidades do conflito no Plata fora
antepor três nações – Argentina, Brasil e Paraguai –
que conheciam formações sociais diversas, realidade já
intuída por analistas coevos mais sensíveis e analisado,
com sensibilidade, no que se refere ao Paraguai, pelo
trabalho já citado de Raul de Andrada e Silva. 110 A
historiografia revisionista avançara o conhecimento histórico
sobre a Grande Guerra ao propor a necessidade da elucidação
do caráter das sociedades em luta, em geral, e do Paraguai,
em especial, desenvolvendo tal proposta, em forma bastante
substancial, sobretudo no relativo à Argentina.
Unidade Social e Nacional
Nos anos 1860, tencionada fortemente pelas contradições
entre a oligarquia bonaerense e as províncias, a Argentina
conhecia diversas relações de trabalho livre e
preparava–se para empreender a "Guerra do
Deserto" [1878–79], contra a população nativa dos
pampas meridionais. No Brasil, vigia a
produção escravista e outras relações sociais de
produção subordinadas – colonos–camponeses, pequenos
plantadores, caboclos, nativos, etc. Ambos países
assentavam–se na propriedade privada dos meios de produção,
em sociedade de cunho largamente liberal e livre–cambista.
Seguindo os autores revisionistas, Doratioto propõe que o
"Estado guarani" era "dono" [sic]
"de quase 90% do território nacional",
controlando uns "80% do comércio interno e
externo". 111
Em minuciosa análise política, diplomática e militar
dos sucessos, em clara regressão em relação ao
revisionismo, não contextualiza as sociedades em questão,
sobretudo quanto às referidas raízes escravistas do Império
e à singularidade da sociedade paraguaia, que permitiu
forte acumulação original de capitais pelo Estado e acesso
tendencial da população camponesa à terra. Apesar de
utilizar "país" e "nação guarani"
como sinônimos de Paraguai, não aborda as eventuais decorrências
da coesão étnico–cultural de população camponesa de
origem guarani, com raízes históricas comunitárias e
missioneiras, que desbordava as fronteiras nacionais –
Mato Groso, Misiones, Corrientes, etc.
A clara homogeneização das nações em luta, liquida
a possibilidade da compreensão de elementos fundamentais,
como os sugeridos por Salles em relação ao Brasil e
Andrada e Silva, em relação ao Paraguai. O que resulta no
uso anacrônico geral de categorias como "povo",
"cidadão", "opinião pública" para a
sociedade escravista brasileira, na qual grande parte da
população encontrava–se objetiva e subjetivamente à
margem de comunidade cidadã que se restringia a uma parcela
diminuta da população livre, em geralmente branca – ou
tida como tal.
Na sua literatura sobre a guerra, como foi comum na
literatura dessa época, Taunay refere–se quase
exclusivamente aos oficiais. Em uma das poucas referências
mais diretas a subalternos, anota: "Ao nos separarmos
no Tacuaral, tive a preocupação diária do rancho que não
é pequena em campanha até que se acerte com um camarada
que entenda um pouco de lidar com panelas. Sofri e não
pouco, já por não ter preparo algum para organizar o meu
rancho, já por me haver tocado para camarada um legítimo
palerma, medraço e avelhacado, quando não refinado
tratante." 112 Já assinalamos a indignação de
Benjamin Constant com a qualidade do soldado brasileiro e as
considerações de Caxias e outros altos oficiais sobre os
mesmos, como veremos a seguir.
Fanatismo & Repressão
A abordagem sobretudo política impossibilita explicação
essencial da belicosidade paraguaia e da letargia
brasileira. Sem superar essa contradição, radicaliza a
explicação da tenacidade guarani, apresentada em 1996,
como produto da fanatização e de controle policial, em
mais uma restauração das visões nacional–patrióticas.
"Apesar dessa situação, quase não havia deserção
nas fileiras paraguaias, devido ao clima de terror imposto
por Solano López, que estendia a punição a familiares e
companheiros do desertor. Ademais, proibiu–se aos soldados
ou oficiais paraguaios
ficarem sós na vanguarda, por temor que desertassem."
113
Explicação da marcialidade como produto do fanatismo
e ação policial que contradita com uma nação com Estado,
exército e meios de comunicação rústicos e, portanto,
propícios à deserção de soldados eventualmente
tiranizados. Tese que não explica a rearticulação
permanente da resistência, após as grandes derrotas da
Dezembrada, com ênfase na reagrupação nos sertões, após
López ter perdido o controle do aparelho estatal. Foram os
exércitos brasileiros e argentinos que conheceram deserções
permanentes, ininterruptas e relevantes, pululando durante a
guerra nos quilombos brasileiros quase mais desertores do
que cativos. Anos após a Guerra, Taunay anotava que, em
1869, reinava o desânimo nas tropas imperiais e
significativa vontade entre oficiais de encetar negociações
de paz, pois ponderavam que "o povo paraguaio tão
completamente [identificado] com o seu chefe, seria necessário
dar cabo do último homem para alcançar a pessoa do
ditador". 114
O autor deduz a origem e a evolução do conflito da
personalidade de López, sobre quem lança a
responsabilidade da guerra, em outra restauração da
historiografia imperial e republicana de Estado, apesar de
apresentar corretamente o confronto como tendencialmente
inevitável, devido à procura da nação paraguaia de
autonomia nacional e a negativa dos governos brasileiro e
argentino de concedê–la. Radicalizando tendência
presente no ensaio de 1996, a personalização da história
resulta no elogio apologético das lideranças da Tríplice
Aliança – Pedro II, Mitre, Caxias, Osório, etc. – e
tenaz diabolização do dirigente máximo paraguaio.
Como na literatura nacional–patriótica, Francisco
Solano López é apostrofado como "ditador quase
caricato", "ambicioso", "tirânico",
"quase desequilibrado". Desqualificação pessoal
extensiva igualmente a Elise Lynch, descrita e tratada como
"cortesã de luxo", ao igual do praticado pelos
ideólogos do Império e da Argentina liberal mitrista. 115
E, nesse estrada, o autor, sem peias, identifica Francisco
Solano López, em singular modernização, a Hitler, ingênua
personificação moderna da violência da sociedade de
classes na história. Para tal, propõe como
"identidade entre os dois ditadores" o fato de
terem, Hitler e López, ambos, usado jovens e velhos em
desesperada resistência final que comprometeria seus países.
A aproximação é anacrônica e esquece que foram os
objetivos e as práticas que desqualificaram o nazismo, e não
a resistência inexorável com jovens e velhos armados,
utilizada licitamente pela resistência da população soviética
e do gueto de Varsóvia contra as forças nazi–fascista.
116
A retórica desabonadora estende–se às classes
dominantes, aos oficias e aos soldados paraguaios,
apresentados dedicados sistematicamente ao massacre, ao
estupro e ao roubo, ainda que se convenha que, em certos
momentos, os aliados procedessem de igual modo. Realidade em
confronto com a anotada por Taunay, como assinalado. Sugere
que o conflito foi o choque entre o Brasil, nação monárquica,
constitucional e liberal – liberalismo considerado
qualidade –, e o Paraguai, Estado despótico, autocrático
e atrasado, outra tese apologética, durante e após a
guerra, como já proposto. 117
Gigante Acorrentado
Seguindo essa linha de análise, não registra que o
Paraguai era país de homens livres, com enorme quantidade
de camponeses pequenos proprietários ou com acesso à
terra, onde as comunidades nativas tinham suas terras
respeitadas, enquanto o Brasil era fortemente nação de
escravizados e escravizadores. Fato essencial para a
compreensão da dificuldade do Gigante Acorrentado em
estabelecer arrolamento nacional de combatentes, contra o
Liliput emancipado, que galvanizou à exaustão sua população
fortemente camponesa no combate. Nesse sentido, não pelas
razões em geral assinaladas, o Paraguai era mais avançado
socialmente do que o Brasil.
Nesse sentido, quando do confronto, Juan Bautista
Alberdi lembrava: "[...] [o povo paraguaio] ha
respondido sosteniendo a su gobierno, con más ardor y
constancia, a medida que le veía más debilitado y más
desarmado de los medios de oprimir, y a medida que veía a
su enemigo mas internado en el país y más capaz de
proteger la impunidad de toda insurrección. El Paraguay ha
probado de eso modo al Brasil que su obediencia no es la del
esclavo, sino la del pueblo que quiere ser libre del
extranjero." 118
O autor não discute a possibilidade da longa duração
dos combates dever–se ao confronto desigual entre Estado
escravista e nação de homens livres, ameaçada na sua
independência, desequilíbrio superado apenas pela abismal
desproporção de recursos, em homens e meios, em favor do
Império, com enorme destaque para a marinha. Determinação
dos combates pela essência escravista do Estado brasileiro
percebida por Caxias, ainda que não entendida. O velho
verdugo de cativos da Balaiada e da Farroupilha referiu–se
a essa realidade ao execrar a qualidade militar dos
libertos, "homens que não compreendem o que é pátria,
sociedade e família, que se consideram ainda escravos, que
apenas mudaram de senhor".119
Apreciação compartida pelo coronel José Antonio Corrêa
da Câmara [1824–1893], segundo visconde de Pelotas, que
explicou o fracasso de assalto à posição paraguaia por
"nossos soldados de infantaria" serem "os
negros mais infames deste mundo, que chegam a ter medo até
do inimigo que foge". 120 Esqueciam os oficiais
negreiros que os negros pusilânimes, no Paraguai, sob a
bandeira escravocrata do Império, foram os mais valorosos
soldados de José Artigas [1764–1850], no Uruguai, sob a
bandeira da luta pela liberdade e pela terra. Saltando as
questões estruturais ao conflito, termina assumindo tom e
conteúdo nacional–patriótico, propondo que os
verdadeiros "heróis" aliancistas seriam "os
[combatentes] que viveram" nas duras condições de
Tuiuti, "durante dois anos, sem desertar ou pretextar
doença". 121
Desqualificação inaceitável de atos individuais
socialmente positivos de milhares de soldados brasileiros,
argentinos e uruguaios que obedeceram o sábio preceito
plebeu de que, se "Deus é grande, o mato é
maior", escafedendo–se de guerra das classes
dominantes, lutada, como sempre, pelos subalternizados, em
prol da opressão de povo irmão. Restringido a descrição
a uma indiscutivelmente rica e valiosa narrativa política,
diplomática e militar, explicando as suas origens e dinâmicas
a partir da ação de protagonistas ilustres, o autor jamais
se debruça sobre os grandes sujeitos dos acontecimentos
estudados, realizando em uma enorme hipérbole, restauração
da velha historiografia nacional–patriótica.
Retorno às Trincheiras
Maldita guerra: Nova história da Guerra do Paraguai,
de Francisco Doratioto, na sua parcialidade, constitui
sobretudo uma narrativa dos sucessos no Prata de 1864–1870
desde os ponto de vista do Estado nacional brasileiro, ou
seja, dos interesses gerais de seus classes dominantes, com
um respeito apenas diplomático para o antagonista do Império.
Todos os atos e as razões do Império são
justificados ou apresentados sob a melhor luz, usando–se
para tal fortemente os recursos da narrativa.
Mais do que relatar os fatos, defende o ponto de vista
do Império. Tamanha
é a identificação nacional nesse relato que, ao contrário,
deveria se sobrepor aos apriorismos patrióticos para alçar–se
ao nível da historiografia científica, necessariamente
supranacional, que
o autor termina se incluindo entre os segmentos estatais do
Império: "A troca de representantes brasileiros no
Paraguai, no período pré–guerra, e seu isolamento da
sociedade local impediram–nos [sic] de bem conhecer a
realidade paraguaia."122
Perpassa a interpretação do conflito visão
relativista da história das nações, onde todos os
interesses nacionais, igualmente pertinentes, resolvem–se
em confrontos estranhos à margem de qualquer moralidade.
"Aqui não há 'bandidos' ou 'mocinhos', como quer o
revisionismo infantil [sic], mas sim interesses. A guerra
era vista por diferente ópticas: para Solano López era a
oportunidade de colocar seu país como potência regional e
ter acesso ao mar pelo porto de Montevidéu [...]; para
Bartolomé Mitre era a forma de consolidar o Estado
centralizado argentino [...]; para os blancos, o apoio
militar paraguaio [...] viabilizaria impedir que seus dois
vizinhos continuassem a intervir no Uruguai; para o Império,
a guerra contra o Paraguai não era esperada [sic], nem
desejada [sic], mas iniciada, pensou–se que a vitória
brasileira seria rápida e poria fim ao litígio fronteiriço
entre os dois países e às ameaças à livre navegação, e
permitiria depor Solano López."123
No tribunal da história, onde se julga a partir dos
direitos dos povos, há, sim, o certo e o errado, o justo e
o injusto. Nos anos 1860, o Paraguai tinha todo o direito de
ter garantido o livre acesso ao mar, de ter resolvidas as
questões de fronteira por arbitragem e de ter respeitado o
seu governo, enquanto o Uruguai possuía, igualmente, o
direito de ter sua autonomia nacional intocada pelos
poderosos vizinhos e que os criadores rio–grandense
respeitassem as leis do país.
Ao desobedecerem esses direitos nacionais, o Estado
imperial e argentino se comportaram, naquela ocasião, como
Estados bandidos, segundo a categoria usada.
IV. Conclusões: Uma História dos Povos Por Ser
Escrita
A narrativa memorialista brasileira sobre o grande
confronto produziu "narrativas de trincheiras" que
tiveram como grandes protagonistas a oficialidade e as forças
militares imperiais na defesa dos brios e da honra da nação
agredida. Na
República, essa produção desdobrou–se em estudos de
vocação historiográfica que retomaram o
ponto de vista do Estado imperial para consolidar
proposta do caráter prometéico das elites nacionais, com
destaque para a oficialidade, na defesa dos valores da nação,
sempre vista como agredida, jamais como agressora.
Durante a Guerra, intelectuais sobretudo argentinos
questionaram profundamente as explicações apologéticas do
Império e da Argentina liberal mitrista. A partir do início
do século passado, revisionismo paraguaio impugnou as teses
da historiografia das nações vitoriosas propondo o caráter
avançado da nação paraguaia, da agressão promovida pela
Inglaterra e pela Tríplice Aliança, elevando Solano López
a herói nacional. A partir de 1950, sobretudo na Argentina,
historiografia revisionista latino–americanista, marxista
e marxista–revolucionária procurou superar a ótica de
"trincheira" nacional–patriótica, perseguindo
leitura de todo o campo de batalha, desde o ponto de vista
dos povos envolvidos no conflito,
vítimas de drama que definiu, apenas em alguns
casos, como produto da vontade imperialista inglesa.
Surgida à margem das instituições acadêmicas, nos
seus avanços e limitações, o revisionismo historiográfico
brasileiro sobre a Guerra do Paraguai, que retomou em forma
muito limitada as conquistas da crítica revisionista
anterior argentina e paraguaia, expressou as necessidades
subjetivas do movimento social sul–americano em ebulição
de uma leitura que interpretasse a história a partir dos
interesses dos povos, e não de suas classes dominantes. A
necessária superação do revisionismo brasileiro foi
frustrada pela dissolução das condições históricas que
o haviam gerado, com a vitória da contra–revolução
neoliberal de fins dos anos 1980.
No novo contexto, no Brasil, a crítica acadêmica e
para–acadêmica impugnou sumariamente a revisão
empreendida da literatura nacional–patriótica imperial e
republicana. A produção revisionista brasileira não teve
suas contradições superadas, sendo apenas deslegitimada
através da crítica sumária da tese do "imperialismo
inglês", de alguns de seus trabalhos e sobretudo dos
lapsos do estudo de J.J. Chiavenatto. Importantes trabalhos
revisionistas nacionais e sobretudo internacionais não
foram sequer integrados à discussão, que se centrou em
construção caricata daquela rica produção historiográfica.
A mera negação das negações revisionistas da
historiografia nacional–patriótica brasileira, pelo
restauracionismo nacional, ensejou retorno essencial à
"historiografia de trincheira",
expresso na culpabilização de Solano López pelo
conflito; nas narrativas preciosistas dos feitos militares,
desde a ótica do Estado brasileiro; no elogio aos grandes
chefes militares aliancistas;
na despreocupação com a análise do caráter das
sociedades postas em confronto, importante chave para a
compreensão do comportamento dos combatentes imperiais,
argentinos e paraguaios, etc.
Na superação de tal situação, impõe–se estudos
que elucidem a genealogia da historiografia da guerra do
Paraguai, no que se refere às narrativas nacional–patrióticas
e, sobretudo, aos trabalhos revisionistas, com destaque para
o sentido profundo e para a influência na produção
historiográfica da crítica argentina do período da
Guerra; do revisionismo paraguaio, do início do século;
dos estudos argentinos dos anos 1950.
Impõe–se, sobretudo, estudos que desvelem, do ponto
de vista dos povos, os objetivos essenciais da ação dos
governos das nações envolvidas no confronto. Que elucidem
a natureza do Estado paraguaio e os processos de acumulação
por ele ensejado, através do controle público das terras e
do comércio exterior. Que expliquem as razões e os
sentidos da adesão da população paraguaia a Solano López,
sobretudo na defesa dos territórios nacionais invadidos.
Que apresente leitura dos acontecimentos que supere a visão
da ação das massas a partir da intervenção, positiva ou
negativa, de personagens providenciais, explicando, ao contrário,
as características individuais dos líderes [carisma; inovação;
indecisão, etc.] a partir das
forças e interesses sociais profundos.
A análise estrutural das condições de vida,
objetivos e aspirações das classes populares e
escravizadas brasileiras, associada ao estudo da realidade
que conheceram sob as forças armadas imperiais, contribuirá
também para que finalmente se revele segredos que as
narrativas nacional–patrióticas, tradicionais ou
restauradas, teimam em esconder, como a defecção de fato
das tropas imperiais com o sucesso dos combates, devido ao
estranhamento com os objetivos da guerra.
Impõe–se igualmente elucidação da extensão da
espoliação a que o nação paraguaia foi submetida,
diretamente, quando e após a ocupação militar brasileira,
ao ter sua população dizimada; ao pagar dívida militar
para o Brasil até 1943; ao perder "as terras em litígio"
com o Brasil, "na fronteira com Mato Grosso" e
importante porção do "Chaco ocidental para a
Argentina", permanecendo sob semi–tutela do Estado
brasileiro por muito longos anos.124
Atualização: 7 de dezembro de 2008.
(*) Mário Maestri, 60, doutor em Ciências Históricas
pela UCL, Bélgica, é professor do Programa de Pós–Graduação
em História da UPF, RS. E–mail: maestri@via–rs.net
1 Cf.
CONRAD, Robert. Os últimos anos da escravatura no Brasil:
1850–1888. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília,
INL, 1975.
2 Cf.
LEMOS, Renato. (Org.) Cartas da Guerra: Benjamin Constant na
Campanha do Paraguai. Rio de Janeiro: IPHAN; Museu Casa de
Benjamin Constant, 1999.
3 Cf.
ZACCARA, Madalena de F.P. A Temática, na pintura do século
XIX no Brasil, como veículo de afirmação e sobrevivência:
Pedro Américo de Figueiredo e Mello: In: Revista eletrônica
de Dezenove & Vinte. Volume III, nº. 3, julho de 2008.
www.dezenovevinte.net
4 Cf.
entre outros: DIAS, Satyro de Oliveira. Duque de Caxias e a
Guerra do Paraguai. Salvador: Diários, 1870; MADUREIRA,
Cel. Antônio de Sena [1841–1889] Guerra do Paraguai:
resposta ao sr. Jorge Thompson, autor da "Guerra del
Paraguay" e aos anotadores argentinos D. Lewis e A.
Estrada. Brasília: EdUNB, 1982;
GAY, João Pedro. A invasão paraguaia na fronteira
brasileira do Uruguai, pelo cônego [...]. Comentada e
editada pelo major Sousa Docca. Porto Alegre: IEL/EST/UCS,
1980; REBOUÇAS, André Pinto. Diário da guerra do Paraguai
(1866). São Paulo: Instituto de Estudos Brasileiro, 1973;
SILVA, Teotônio Meirelles. O exército brasileiro na
Campanha do Paraguai: resumo histórico. Rio de Janeiro: O
Globo, 1877; SILVA, José Luís Rodrigues da. Recordações
da campanha do Paraguai. Brasília: Senado Federal, 2007.
5 Cf.
SOUSA, Jorge Prata de. Escravidão ou morte: os escravos
brasileiros na Guerra do Paraguai. Rio de Janeiro:
Mauad/ADESA, 1996. p. 19–23.
6 Cf.
LEMOS, Renato. (Org.) Cartas da Guerra: Benjamin Constant na
Campanha do Paraguai. Ob.cit.
7 Cf.
TAUNAY, Alfredo d' Escragnolle. [1843–1899] A retirada da
Laguna: episodio da Guerra do Paraguay. Traduzida da 3 ed.
francesa por B.T. Ramiz Galvão. Rio de Janeiro: Garnier,
s.d. [La Retraite de Laguna: Épisode de la Guerre du
Paraguay. Rio de Janeiro 1871]. P.XV.
8 Cf.
Id.ib. p. XXV.
9 Cf.
Id.ib. p. 56,
73, 77, 105, 156–59, 165–69; 177, 182, 212.
10 Cf.
Id.ib. pp. 54, 64, 65, 75, 104, 106, 113, 126, 131, 141.
11 TAUNAY,
Visconde. A retirada da Laguna: episódio da Guerra do
Paraguai. 13 ed. brasileira. Traduzida da 5 edição
francesa por Affonso de E. Taunay. São Paulo: Melhoramento,
S.d. p. 7.
12 Cf. MAESTRI. A Escravidão e a gênese do Estado
Nacional Brasileiro. In: Seminário Internacional Além do
apenas moderno, 2001, Recife. Além do apenas moderno.
Brasil séculos XIX e XX. Recife : Massangana, 2001. v. 1.
pp. 49–77.
13 . Cf. SOUSA, Jorge Luiz Prata de. Escravidão ou
morte: os escravos brasileiros na Guerra do Paraguai. Rio de
Janeiro: Mauad: ADESA, 1996. pp. 19–33.
14 Cf.
LEMOS, Renato. (Org.) Cartas da Guerra: Benjamin Constant na
Campanha do Paraguai. Ob.cit.; REBOUÇAS, André. Diário da
guerra do Paraguai (1866). São Paulo: Instituto de Estudos
Brasileiro, 1973.
15 Cf. entre outros: CERQUEIRA, Gal. Dionísio
[Evangelista de Castro]. [1847–1910] Reminiscência da
Campanha do Paraguai. [1865–1870]. Rio de Janeiro:
Biblioteca do Exército, 1980. [1ª ed. 1910.]; DUARTE,
Paulo de Queiroz. Os Voluntários da Pátria na Guerra do
Paraguai. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1981. v.;
FRAGOSO, Augusto Tasso. História da guerra entre a
Tríplice Aliança e o Paraguai [...]. Rio de Janeiro:
Imprensa do Estado–Maior do Exército, 1934. 5 vol.;
SOARES, Álvaro Teixeira. O drama da Tríplice Aliança:
1865–1876. Rio de Janeiro: Brand, 1956;
SPALDING, Walter. A invasão paraguaia no Brasil. São
Paulo: CEN, 1940.
16 Cf. PEÑA,
Milciades. La era de Mitre: de Caseros a la Guerra de la
Triple Infamia. 3 ed. Buenos Aires: Fichas, 1975. p. 53.
17 Cf. SOUSA, Jorge Prata de. Escravidão ou morte: os
escravos brasileiros na Guerra do Paraguai. Rio de Janeiro:
ADESA, 1996. pp. 69–73.
18 GAY,
João Pedro. A invasão paraguaia na fronteira brasileira do
Uruguai, pelo cônego [...]. Comentada e editada pelo major
Sousa Docca. Porto Alegre: IEL/EST/UCS, 1980. p.19
19 Cf. SODRÉ, Werneck. História militar do Brasil.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965. pp. 141 et
seq.
20 Cf. por exemplo: ALBERDI, Juan Bautista
[1810–1884]. Las disensiones de las Republicas del Plata Y
Las Maquinacione delBrasil. Montevideo: Imprenta Tipografica
a Vapor, 1865. 73 pp; ALBERDI, Juan Bautista [1810–1884].
Los intereses argentinos en la guerra del Paraguay con el
Brasil. Paris: Impresion Privada [1865]. 22 pp.
21 Apud PEÑA,
Milciades. La era de Mitre: de Caseros a la Guerra de la
Triple Infamia. 3 ed. Buenos Aires: Fichas, 1975. p. 55.
22 Cf. ANDRADA E SILVA, Raul de. Ensaio sobre a
ditadura do Paraguai: 1814–1840. São Paulo: Coleção
Museu Paulista, 1978. 267 pp.[Tese de doutoramento,
Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras
e Ciências Humanas da USP.]
23 Cf. entre outros: Historia de la guerra de la Triple
Alianza (1912); Páginas de historia (1916); Nuestra epopeya
(1919); El Mariscal Solano López (1920); El Paraguay en la
unificación argentina (1924); El héroe del Paraguay
(1930); Los legionarios (1930); Apostolado patriótico
(1933).
24 DORATIOTO,
Francisco. Maldita Guerra: nova história da Guerra do
Paraguai. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. pp.
79–86.
25 Cf.
PIZARRO, Mar Langa. La guerra de la Triple Alianza en la
literatura paraguaya. Le
Paraguay à l'ombre de ses guerres. Paris MAL–EHESS–IEP
17–19 novembre 2005. Nuevo Mundo/ Mundos Novo.
http://nuevomundo.revues.org/index1623.html#ftn9
26 Cf.
sobre a vertente lopista, hoje, ver: VIDAL, Mário.
Alianza para la muerte. Argentina: Córdoba:
Resistencia: Libreria de la Paz, 2005.
27 Cf. RIVERA, Enrique. José Hernández y la Guerra
del Paraguay. Buenos Aires: Colihue, 2007. 96 pp.; ROSA, José
Maria. La guerra del Paraguay y las montoneras argentinas.
Buenos Ayres: Hyspamérica, 1986.
28 PEÑA. La era de Mitre. Ob.cit. p.61.
29 CANCOGNI, Manlio e BORIS, Ivan. Solano López: O
Napoleão do Prata. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1975. 260 pp.
30 Cf.
Apud RIVERA,
Enrique. José Hernández y la Guerra del Paraguay.Ob.cit.
p. 28.
31 Cf. POMER, León. A Guerra do Paraguai: a grande
tragédia rioplatense. 2 ed. São Paulo: Global, 1980. p.
75.
32 POMER,
León. Paraguai: nossa guerra contra esse soldado. 2 ed. São
Paulo: Global, 1982.
33 ANDRADA E SILVA, Raul de. Ensaio sobre a ditadura do
Paraguai: 1814–1840. São Paulo: Coleção Museu Paulista,
1978. 267 pp. [Série Ensaios, 3]
34 Cf. informação por e–mail de J.J. Chiavenatto,
em 7 de outubro de 2008.
35 GORENDER, Jacob. O escravismo colonial. São Paulo:
Ática, 1978.
36 CHIAVENATTO, Júlio José. Genocídio americano: a
guerra do Paraguai. 21
ed. São Paulo: Brasiliense, 1987. P. 13–14.
37 Id.ib. p. 67
38 Id.ib. p. 23
39 BURTON,
Richard F. Cartas dos campos de Batalha do Paraguai. Rio de
Janeiro: Biblioteca do Exército, 1997. p. 21
40 Cf. BERTONHA, João Fábio & MOSCATELI, Renato.
"Imperialismo ou realpolitik? Uma análise da produção
histórica recente sobre a Guerra do Paraguai".
41 Cf. CHIAVENATTO. Genocídio americano. Ob.cit. pp.
17, 21,
42 Cf. Id.ib. pp. 118, 111.
43 Cf.
Id.ib. pp. 33, 48, 81
44 Cf. MAESTRI, Mário. O escravismo colonial: A revolução
copernicana de Jacob Gorender: a gênese, deslegitimaçãohttp://www.unisinos.br/ihu/uploads/publicacoes/edicoes/1158327159.48pdf.pdf
45 SALLES, Ricardo. A Guerra do Paraguai: escravidão e
cidadania na formação do Exército. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1990.
46 Id.ib. pp. 3, 32 –36
47 Id.ib. pp. 39–54
48 Cf. MAESTRI, Mário. O escravo no Rio Grande do Sul:
a charqueada escravista e a gênese do escravismo gaúcho.
Porto Alegre: EST–UCS, 1984. pp. 144–154; MAESTRI, Mário.
O escravo no Rio Grande do Sul: Trabalho, resistência e
sociedade. 3 ed. rev. e ampliada. Porto Alegre: UFRGS, 2006.
49 SALLES. A Guerra do Paraguai. Ob.cit. p. 58.
50 Id.ib. p.56–9; 61–62.
51 Id.ib. p. 61.
52 Id.ib. p. 66; CONRAD, Robert. Os últimos anos da
escravatura no Brasil: 1850–1888. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira; Brasília, INL, 1975.
53 SALLES. A Guerra do Paraguai. Ob.cit. p. 67
54 Cf. entre outros: LEITMAN, Spencer Lewis. Raízes
socioeconômicas da Guerra dos farrapos: um capítulo da
história do Brasil no século XIX. Rio de Janeiro: Graal,
1979; FLORES, Moacyr. Negros na Revolução Farroupilha:
traição em Porongos e farsa em Ponche Verde. Porto Alegre:
EST, 2005.
55 SALLES. A Guerra do Paraguai. Ob.cit. p.
102.
56 Id.ib. p. 110.
57 Id.ib.
p. 15,108
58 Id.ib. p. 110
59 Cf.
LEMOS, Renato. (Org.) Cartas da Guerra: Benjamin Constant na
Campanha do Paraguai. Ob.cit. pp. 118, 143
60 Cf. TAUNAY, Alfredo Recordações de Guerra e de
Viagem. Brasília: Senado Federal/Conselho Editorial, 2008.
p. 83–84.
61 SALLES. A Guerra do Paraguai. Ob.cit. p. 142
62 Cf.
REBOUÇAS, André. Diário da guerra do Paraguai (1866). São
Paulo: Instituto de Estudos Brasileiro, 1973. p. 154
63 Cf. TAUNAY, Alfredo Recordações de Guerra e de
Viagem. Brasília: Senado Federal/Conselho Editorial, 2008.
p. 81.
64 SALLES. A Guerra do Paraguai. Ob.cit. p. 136
65 Id.ib.
p. 147.
66 DORATIOTO,
Francisco. A guerra do Paraguai: 2ª Visão. São Paulo:
Brasiliense, 1991. [Tudo é história, 138.]; O conflito com
o Paraguai: a grande guerra do Brasil. São Paulo: Ática,
1996.
67 Id. A
guerra do Paraguai: 2ª Visão. Ob.cit. p. 14
68 Id.ib.p. 16
69 Id.ib. 34
70 Id.ib. p. 41
71 Id.ib. p. 40
72 Id.ib. p.21
73 Id.ib. p. 19
74 Id.ib. p. 20
75 Id.ib. p. 23
76 Id.ib. p. 27
77 Id.ib. p. 71
78 Id.ib. p. 66
79 DORATIOTO,
Francisco. A guerra do Paraguai: 2ª Visão. São Paulo:
Brasiliense, 1991. [Tudo é história, 138.]; O conflito com
o Paraguai: a grande guerra do Brasil. São Paulo: Ática,
1996.
80 Id.ib. 7
81 Id.ib. 8
82 Id.ib. 18
83 Id.ib.52
84 Id.ib.20
85 Id.ib.47
86 Id.ib. p. 24; MAESTRI, Mário. Deus é grande, o
mato é maior! Trabalho e resistência escrava no Rio Grande
do Sul. Passo Fundo: UPF Editora, 2002.
87 DORATIOTO, Francisco F. M.. O conflito com o
Paraguai. Ob.cit. p. 30
88 Id.ib. p. 44
89 REBOUÇAS, André Pinto. Diário da guerra do
Paraguai (1866). São Paulo: Instituto de Estudos
Brasileiro, 1973. p. 30.
90 Id.ib.
p. 53 et passim.
91 Id.ib.p. 68
92 Id.ib. p. 61
93 ANDRADA E SILVA, Raul. Ensaio sobre a Ditadura do
Paraguai. 1814–1840. Ob.cit. 185.
94 TAUNAY. A retirada da Laguna. Ob.cit. p. 131
95 TAUNAY. Recordações [...]. Ob.cit. p. 52.
96 DORATIOTO, Francisco F. M.. O conflito com o
Paraguai. Ob.cit. p. 70
97 CASTRO, M.E. & MARQUES, M. [Org.] Guerra do
Paraguai: 130 ano depois. Rio de Janeiro: Relume–Dumará,
1995.
98 Id.ib. p. 11–24..
99 Id.ib. pp. Pp. 133–150;
www.scielo.br/pdf/ea/v9n24/v9n24a14.pdf
100 Cf. SOUSA, Jorge Luiz Prata de. Escravidão ou
morte: os escravos brasileiros na Guerra do Paraguai. Rio de
Janeiro: Mauad/ADESA,
1996.
101 Id.ib. p. 29
102 Cf. também: MENDES, Fábio Faria. A economia moral do recrutamento militar no Império
brasileiro. Parte
inferior do formulário
Revista Brasileira de Ciências Sociais – vol. 13 n.
38 São Paulo Oct. 1998.
103 Folha
de São Paulo, caderno Mais!, domingo, 9 de novembro de
1997, pag 5; ver, também, em Cf. RICARDO BONALUME
NETO."Novas lições do Paraguai".
/www1.folha.uol.com.br/fol/ brasil500 /histpar_1.htm
104 Cf. SQUINELO, Ana Paula. A Guerra do Paraguai, essa
desconhecida ... Ensino, memória e história de um conflito
secular. Campo Grande: UCDB, 2002. p. 21.
105 Id.ib.
p. 75
106 GUIMARÃES,
Acyr Vaz. A Guerra do Paraguai: verdades e mentiras. Campo
Grande: Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do
Sul, 2000. pp. cit. 80–82.
107 PEDROSA, J. F. Maya. A catástrofe dos erros: razões
e emoções na Guerra contra o Paraguai. Rio de Janeiro:
Biblioteca do Exército, 2004.
p. 16,
108 Id.ib.
p. 24.
109 DORATIOTO, Francisco. Maldita Guerra: nova história
da Guerra do Paraguai. São Paulo: Companhia das Letras,
2002. 615 p.
110 Cf. FIX, Theodoro. História da Guerra do Paraguay.
Trad. do francês por A.J. F. dos Reis.
Rio de Janeiro: Garnier, s.d. p. 2. [1ª ed. em francês
1873]; ANDRADA E SILVA, Raul de. Ensaio sobre a ditadura do
Paraguai: 1814–1840. Ob.cit.
111 DORATIOTO, Francisco. Maldita Guerra. Ob.cit. pp.
44.
112 TAUNAY. Recordações [...]. Ob.cit. p. 80.
113 DORATIOTO, Francisco. Maldita Guerra. Ob.cit. p.
289.
114 TAUNAY. Recordações
[...]. p. 24.
115 DORATIOTO, Francisco. Maldita Guerra. Ob.cit. pp.
18–9; 29, 89.
116 Id.ib. pp. 409, 454.
117 Id.ib. p. 42
118 Apud PEÑA. La era de Mitre. Ob.cit. p. 80.
119 DORATIOTO, Francisco. Maldita Guerra. Ob.cit. p.
274.
120 Id.ib. p. 275.
121 Id.ib. p. 216.
122 Id.ib. p. 60
123 Id.ib. p. 96
124 SALLES. Ob.cit. p. 13
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