I. O caráter da colonização
ibero-americana
Em forma explícita,
dois autores marxistas, Décio Freitas, no Rio Grande do Sul,
em 1980, e Milcíades Pena, vinte anos antes, na Argentina,
defenderam, o caráter capitalista da produção pastoril da
bacia do Prata. O primeiro, em polêmica marginal ao centro
de sua produção e investigação historiográfica,
referente à escravidão colonial brasileira, o segundo, em
uma interpretação geral sintética da formação social
argentina. Um debate de certo modo suspendido com a regressão
das pesquisas sobre o caráter das estruturas sócio-econômicas
das formações sociais, no contexto do descrédito lançado
sobre esses estudos pela maré neo-liberal triunfante de
fins dos anos 1980.
1. Décio Freitas e o
Capitalismo Pastoril Sul-Rio-Grandense
Em
1980, polemizando com parte da historiografia tradicional
sul-rio-grandense, que defendia, em forma acanhada, a importância
do trabalhador escravizado na produção pastoril, o
historiador Décio Freitas apresentou o ensaio “O
capitalismo pastoril”, introdutório a livro homônimo.
Nele, publicou textos históricos referentes ao debate e sua
defesa do caráter capitalista do pastoreio extensivo sul-americano
e dos estancieiros como “burguesia pastoril”, no período
colonial e pós-colonial.[1]
No
trabalho, assinalou que inúmeros autores latino-americanos
compartiam da mesma visão, citando a Sérgio Bagú, em Estructura
social de la colônia, de 1952; a Ruben H. Zorrilla, em
Extracción social de los caudillos: 1810-1870, de
1972, que se apóia em Sérgio Bagu; e em Nahuel Moreno, em Quatro
tesis sobre la colonización española y portuguesa, de
1954.
No geral, esse último autor reproduziu, em forma
reducionista, as propostas do historiador Milcíades Peña
para a Argentina. Décio Freitas apoiou sua tese em
passagens de O capital, de Marx.
[3]
Décio Freitas nasceu no
Rio Grande do Sul, em 1922, e faleceu, em Porto Alegre, em
2004. Quando estudante, em meados dos anos 1940, militou no
PCB, mantendo-se a seguir como intelectual marxista,
politicamente próximo ao trabalhismo. Nos anos 1940,
trabalhou como jornalista nos periódicos sul-rio-grandenses
Correio do Povo, Diário de Notícias e Tribuna Gaúcha,
este último do PCB. Formou-se em Direito, pela UFRGS,
dedicando-se à advocacia. Participou do governo João
Goulart [1961-1964]. Foi cassado pelo regime militar e
refugiou-se por breve tempo em Montevidéu, após 1964, onde
escreveu estudo historiográfico sobre a confederação dos
quilombos de Palmares, publicado, em 1971 e 1973,
respectivamente, naquela cidade e em Porto Alegre.
Escravidão
e Luta de Classes
A edição em português
de seu livro, Palmares: a guerra dos escravos, conheceu diversas edições, corrigidas e ampliadas, e
repercussão historiográfica, cultural e política. Em forma relativamente original, o estudo destacava
o caráter escravista da sociedade brasileira e
os quilombos como forma de luta de classes.
Nos anos seguintes, Décio Freitas publicou outros livros
sobre a escravidão e sobre a luta de classes na Colônia e
no Império, sem igual repercussão.[5]
Freitas foi fortemente
marginalizado e hostilizado por ideólogos conservadores e
pela historiografia acadêmica, sobretudo sulina, que
consolidara sua institucionalização e se profissionalizara
durante a ditadura militar. Veto ideológico que se
apresentou comumente como crítica a uma narrativa
historiográfica dirigida ao grande público. Freitas
escrevia em forma elegante, sintética e despreocupado com
as normas da historiografia acadêmica, como a citação em
notas das fontes que apresentava, em forma geral, na conclusão
do trabalho.
Em “O capitalismo
pastoril”, Freitas citou exaustivamente, em notas, suas
referências, restritas à documentação primária e secundária
publicada. Sob a pressão da maré neoliberal de fins dos
anos 1980, como tantos outros intelectuais, rendeu-se às
posições conservadoras, na historiografia, sociedade e política.
Então, como editorialista e colunista do jornal Zero Hora,
da RBS, tornou-se um dos mais ativos, destacados e criativos
pensadores conservadores sulinos. Nesses anos, publicou
livros de pouco valor, de forte cunho ficcional, memorialístico
e conservador, que apresentava como historiografia.
Em 1980, em “Capitalismo
pastoril”, Décio Freitas deduzia o caráter capitalista
da produção pastoril sulina dos séculos 18 e 19, apoiado
em dois grandes argumentos. Primeiro, o latifúndio pastoril
era propriedade “alodial” e, portanto, “isenta de
quaisquer vínculos ou dependência, podendo o dono dispor
dela como bem entendesse, para a compra e a venda, [...]
etc.” No que tinha absoluta razão, ainda que esta não
fosse condição suficiente para a definição de produção
rural capitalista. Segundo, devido ao fato de a fazenda
pastoril, segundo ele, apresentar “aquilo que” era o
“traço específico do capitalismo: não apenas a produção
de mercadorias, de resto presente em outros sistemas, mas a
transformação da própria força-de-trabalho em mercadoria,
como outra qualquer.”
Trabalhadores
livres
Décio Freitas defendia
que, nos séculos 18 e 19, no Sul, a “massa de
trabalhadores rurais” fosse composta “de homens
juridicamente livres que, não possuindo a nenhum título os
meios de produção”, tinham “que vender sua força-de-trabalho
para prover à sobrevivência.” Afirmava que o trabalho
“escravo ou semi-servil” apareceria em forma “esporádica
e isoladamente nessa produção pecuária”, onde
preponderava “em forma absoluta” o “trabalho
assalariado”. Definia os “posteiros”, categoria social
secundária da exploração pastoril, como relação semi-feudal,
devido ao fato de não receberem salários por suas funções,
mas apenas o direito a explorar a terra e por dependerem do
arbítrio dos proprietários. A fazenda pastoril sulina
seria “sistema de produção social baseado no trabalho
assalariado, o que importa dizer sistema capitalista”.
Ainda que “impuro, dependente e subdesenvolvido”.
[6]
O próprio esforço de Freitas
para enquadrar a produção pastoril extensiva sulina nas
categorias analíticas marxianas referentes à produção
capitalista circunscreve a fragilidade da sua proposta.
Nesse trabalho, define o “gado alçado”, “pilhado”
nas “arreadas ou vacarias”, como “capital constante e
circulante” que teria constituído a base inicial do
desenvolvimento da “empresa pastoril capitalista” e
apresenta, o mesmo gado como “mercadoria-boi”, surgida
no processo da produção.
Tenta inutilmente superar a contradição de produção
pastoril extensiva determinada fortemente pelo “tempo de
produção [sic] natural”, diante do baixo aporte do
“tempo de produção social”.
[8]
Maior ainda é a dificuldade em
adequar a mão-de-obra pastoril extensiva sulina desse período
ao leito de Procustro da proposta “mão-de-obra livre e
assalariada”. Freitas reduz a contribuição do
trabalhador escravizado na estância às tarefas domésticas,
agrícolas e auxiliares, descartando-o das funções
pastoris propriamente ditas por razões lógicas – o
cativo custava caro; fugiria, se tivesse um cavalo à
disposição; o africano não conhecia o pastoreio e era
caro treiná-lo nessa atividade, etc. Reserva as funções pastoris
exclusivamente para os trabalhadores assalariados, com
destaque nos primeiros tempos para a população indígena
ou de origem indígena, vista como “trabalhadores ideais
para a produção pecuária”.
[10]
Relações
Pré-capitalistas
Ao discutir a informação sobre
os trabalhadores livres no pastoreio que reúne, Freitas foi
obrigado a registrar objetivamente as características pré-capitalistas
dessa força de trabalho. Destaca, por um lado, o emprego não
permanente do produtor direto nas estâncias e, por outro,
sua remuneração sob forma de alimentação, de moradia,
etc., complementada por “algum salário” monetário.
“[...] o estancieiro não pagava totalmente em dinheiro o
salário. Parte deste era pago em espécie, ou seja,
diretamente em meios de subsistência.”
[11]
Meios de subsistência dos
trabalhadores provenientes, por um lado, da esfera de produção
natural da estância e, por outro, de parte da produção da
esfera mercantil da mesma propriedade que não era escoada
ao mercado. O fato de que o gaúcho, na função de
peão, pudesse se empregar e afastar periodicamente
das tarefas pastoris, assinalava já não estarem dadas as
condições de separação plena dos produtores diretos da
reprodução autônoma dos seus meios de existência. Ou
seja, não existiam as condições necessárias para a formação
de exército de trabalhadores de reserva.
[12]
A própria documentação primária
editada consultada por Freitas sugeria e assinalava que as
grandes estâncias serviam-se necessariamente da mão-de-obra
escravizada, nas tarefas auxiliares e pastoris propriamente
dita – “cativos campeiros” –, devido à incapacidade
dos estancieiros de garantir em forma ininterrupta a produção
apoiando-se em homens livres, sem servir-se de meios
coercitivos usados no Prata. Realidade comprovada
exaustivamente por investigações posteriores apoiadas
sobretudo nos inventários post-mortem das grandes
fazendas pastoris do século 18 e 19.
A importância do cativo campeiro fora proposta, apoiada em
documentação primária, por membros da historiografia
tradicional, quando da polêmica com Décio Freitas que
originou o ensaio “O capitalismo pastoril”, como
assinalado.
2. Milcíades Peña: Um
Esboço Geral de Crítica da Formação Social Argentina
Milcíades Peña passou
meteoricamente pelo cenário cultural argentino. Nasceu em
1933, em La Plata, falecendo em 1965, aos 32 anos. Com mãe
mentalmente doente, de saúde frágil na infância, foi
criado por tios mais velhos, descobrindo acidentalmente aos
onze anos seu nome de batismo, sua verdadeira mãe, seus três
irmãos mais velhos. Sofrendo possivelmente de depressão,
realizou tentativas autocidas na adolescência. Casou-se e
teve um filho, em 1964, morrendo no ano seguinte por ingestão
de pílulas.
Em seu breve tempo de intervenção social, política e
cultural, militou na corrente marxista-revolucionária
morenista, da qual se afastou, sem jamais romper com o
marxismo-revolucionário [trotskismo], para dedicar-se à
historiografia, desenvolvendo refinada interpretação da
história argentina, da colonização ao peronismo.
Disposto a escrever uma
história geral da Argentina, Milcíades Peña alcançou
apenas a apresentar o
esboço de sua interpretação, em seis breves livros,
redigidos nos anos 1955-57: Antes de Mayo: formas
sociales del transplante español al Nuevo Mundo
[1500-1810]; El paraíso terrateniente: federales y
unitarios la civilización del cuero [1810-1850]; La era
de Mitre: de Caseros a la Guerra de la Triple Infamia
1850-1870]; De mitre a Roca: consolidación de la
oligarquia anglocriolla. [1870-1885]; Alberdi, Sarmiento
y el 90 [1885-1890]; Masas, caudillos y elites
[1890-1955]. A partir de curso que
ministrou na Escola de Engenharia de Buenos Aires, em 1958,
foi publicada sua Introducción al pensamiento de Marx,
de importante caráter renovador.
[16]
A leitura de Milcíades Peña,
mais de meio século após a sua morte, revela escritor e
pensador de invulgar sensibilidade e talento. Os inevitáveis
limites de sua interpretação, em parte devidos ao breve
tempo de sua produção e ao desenvolvimento da
historiografia e das ciências sociais de então, sobretudo
latino-americanas e argentinas, não diminuem a enorme
importância dessa literatura. Ainda mais por que, uma das
características de sua reflexão é que desnudava, em forma
consciente ou inconsciente, as suas grandes contradições
analíticas, não raro sugerindo possíveis soluções
para as mesmas.
Milcíades Peña é
considerado por muitos como um dos mais argutos
historiadores marxistas argentinos. No Brasil é autor
praticamente desconhecido, não contando, salvo engano, com
traduções, mesmo parciais. Em sua pátria, suas obras não
foram reeditadas nos últimos anos, segundo parece por
proibição de seu filho, político tradicional menor, que
porta o mesmo nome que o pai. Seus trabalhos são facilmente
disponíveis em reproduções na internet. É difícil
imaginar os avanços interpretativos que esse autor chegaria
se não tivesse desaparecido tão jovem.
Antes
de Maio
O primeiro ensaio de Milcíades
Peña, Antes de Mayo: formas sociales del transplante
español al Nuevo Mundo, dedicado ao período histórico
sobretudo argentino que vai de 1500 a 1810, aborda, com
certo vagar, os acontecimento da Revolução de Maio,
realizando dessacralização das apologias historiográficas
que apresentaram e apresentam aquele evento como “revolução
social”, “revolução democrático-burguesa” e
“movimento de base popular”. O autor lembrava que a
“Revolução de Maio” foi processo que se materializou
sobretudo na esfera política, não revolucionando
minimamente a organização social e econômica regional,
que se manteve no essencial idêntica à colonial, ao igual
do que ocorreu, no Brasil, em 1822, quando do rompimento com
Portugal.
Peña
assinala: “El movimiento que independizó
a las colonias latinoamericanas no traia consigo un nuevo régimen
de producción ni modificó la estructura de clases de la
sociedade colonial. Las clases dominantes continuaron siendo
las terratenientes y comerciantes hispano-criollos, igual
que en la colonia.” [18]
A primeira grande
iniciativa da “Revolução de Maio” foi o
defenestramento do vice-rei Baltazar Hidalgo de Cisneros e a
extinção da burocracia administrativa ibérica que
governava o vice-reinado em nome do soberano espanhol,
deposto pela intervenção napoleônica. Peña lembra que o
movimento sequer fora inicialmente autonomista e
republicano, sendo fortes os carlotistas entre os
principais líderes crioulos. A declaração cabal de
independência da Argentina seria feita apenas em julho de
1816, no congresso de Tucumán. Em O expansionismo
brasileiro e a formação dos Estados na bacia do Prata, o
historiador brasileiro Moniz Bandeira assinala que a pretensão
de Carlota Joaquina, esposa de dom João 6º, ao vice-reinado
do rio da Prata, após a abdicação de seu pai e a prisão
de seu irmão, recebera o “apoio de vastos setores das
classes dominantes de Buenos Aires, tradicionalmente ligadas
aos interesses do comércio português, e alguns líderes,
como Juan Martín Pueyrredon, Manoel Belgrano, Saturnino
Rodrigues Peña”, que a “quiseram proclamar Regente
[...] ou a coroar imperatriz da América.”
[19]
Milcíades Peña destaca
que os sucessos de Maio foram obra sobretudo das classes
proprietárias, com destaque para a “burguesia
comercial”, ou seja, para os comerciantes portenhos
crioulos, associados aos grandes criadores bonaerenses.
Assinala que a revolução não contou com a participação
ativa dos subalternizados, mesmo livres, que nada tinham a
ganhar e, não raro, algo tinham e perderam com a
iniciativa.
Produzindo
para Vender
Milcíades Peña propõe
igualmente que os gauchos, o principal segmento plebeu
da campanha bonaerense e do Prata, foram mantidos e
mantiveram-se estranhos ao movimento. E que a radicalização
da liberdade comercial, sobretudo em proveito da oligarquia
mercantil crioula, ligada ao comércio britânico, tendeu a
destruir o artesanato e a produção pequeno-manufatureira
das províncias de Buenos Aires, do Litoral e do Interior,
com graves seqüelas sociais. Quanto aos cativos negros,
foram enviados numerosos para os exércitos revolucionários,
a fim de substituir os patriotas poucos dispostos a morrer
pela liberdade. Essa seria uma das razões da forte queda da
população afro-descendente nessa região.
A proposta de Milcíades
Peña da inexistência de classes populares modernas,
capazes de influenciarem a direção política dos sucessos,
mantida sob o controle dos segmentos dominantes crioulos,
que dessem eventualmente um caráter democrático àqueles
acontecimentos, apóia-se em uma das maiores contradições
analíticas de sua interpretação da antiga formação
social argentina: a caracterização da colonização hispânica
como capitalista, devido ao seu “conteúdo” e a seus
“objetivos”, que eram, segundo ele, essencialmente,
“producir en gran escala para vender en el mercado y obter
una ganancia”.
[20]
A produção para o
mercado, com o objetivo do lucro, não é determinação
suficiente para a definição do caráter econômico do
mundo colonial como capitalista, como lembravam, nos anos
1960, ao questionar essa tese, ideólogos ligados ao Partido
Comunista Brasileiro, ao se referirem ao Brasil, pois aquela
caracterização e polêmica abarcavam a América Ibérica
como um todo. Marxista sensível, Milcíades Peña intuiu o
limite e contradição de sua proposta. Procurou superar a
contradição da dedução do caráter da colonização a
partir de esfera não atinente à produção, com a definição
dos criadores de Buenos Aires como classe burguesa produtora
completa, ainda que de caráter colonial. Proposta que estendeu a toda a América ibérica. “Clase
productora más importante de la colônia – estancieros en
la Argentina, y en general, en toda América Latina,
productores para el mercado mundial – son a no dudarlo
capitalista, sus intereses son capitalista, pero un
capitalismo colonial [...].”[21]
3. Raízes e Sentidos Político
de um Debate Historiográfico
Desde antes da II Guerra,
a historiografia marxista ortodoxa apoiava no
proposto caráter feudal ou semi-feudal da colonização
americana a necessidade de etapa democrático burguesa da
revolução na América Latina. O que exigiria a subordinação
dos trabalhadores à “burguesia nacional progressista”,
em frentes populares, para, apenas cumprida a etapa democrático-burguesa
da revolução, ser avançado o programa socialista. Uma
orientação que teve importância determinante na vida política
da América Latina.
No Brasil, a política de
revolução democrático-burguesa contribuiu ao desastre das
propostas populistas e nacional-desenvolvimentistas, quando
do golpe militar de 1964, apoiado por toda a “burguesia
progressista” nacional. Segundo o receituário proposto
pelos partidos comunistas, esta última deveria ter-se
mobilizado contra o latifúndio semi-feudal e o
imperialismo e não comandar o ataque geral aos
trabalhadores e ao padrão de desenvolvimento capitalista
autônomo.
A mesma proposta de revolução
por etapas, democrático-burguesa e a seguir socialista, foi
enfatizada pelos partidos comunistas e seus intelectuais nas
décadas pós-stalinistas. No Brasil, a interpretação
foi defendida por importantes pensadores ligados direta e
indiretamente a essa orientação política, entre os quais
se destacaram Alberto Passo Guimarães [1908-1993] e Nélson
Werneck Sodré [1911-1999].
Capitalista
desde a Origem
Em fins dos anos 1940, a
interpretação feudal do passado latino-americano e a
conseqüente proposta de necessária etapa democrático-burguesa
anterior às tarefas socialistas, avançadas pelos partidos
comunistas, foram impugnadas por estudiosos de orientação
socialista revolucionária. Em forma mais ou menos
desenvolvida, eles propuseram a definição do caráter
capitalista das formações coloniais americanas, em alguns
casos, desde a origem da colonização européia!
Entre esses autores
descaram-se os sociólogos argentino Sérgio Bagú
[1911-2002],
teuto-estadunidense André Gunder Frank [1929-2005]
e brasileiro Ruy Mauro Marini [1932-1997].
No Brasil, essa interpretação seria também perfilhada
pelo célebre historiador marxista dissidente Caio Prado Júnior,
antigo integrante do PCB, em, entre outros trabalhos, A
revolução brasileira.[25]
Entretanto, o debate sobre
o caráter feudal ou capitalista da colonização não
surgira inicialmente determinado pelo confronto político-ideológico
assinalado. Em História econômica do Brasil, de
1937, o economista Robert C. Simonsen [1889-1948] criticara
a ênfase no “aspecto feudal do sistema das donatarias”
luso-brasileiras e definira a clara orientação capitalista
da colonização lusitana, precisamente devido à orientação
das atividades para o lucro.
[26]
Orientação
Mercantil
Aos defensores da tese das
origens capitalistas a América, o corolário indiscutível
da definição de uma colonização capitalista, desde os
primeiros tempos, devido à sua intencionalidade e orientação
mercantis, era a vigência e a urgência na América Latina
da revolução socialista. A partir dos anos 1940, quando se
estabeleceu esta polêmica, era indiscutível que sobretudo
as principais formações sociais latino-americanas –
Argentina, Brasil, Chile, México, etc. – conheciam
organização sócio-econômica capitalista dominante. Porém,
era certamente arbitrariedade recuar essa definição para o
início da colonização.
Além
da proposta de sociedades que teriam conhecido, do século
16 a inícios do século 20, apenas crescimento quantitativo
e jamais qualitativo, a definição capitalista das formações
latino-americanas coloniais propunha contradições
epistemológicas insolúveis. Entre elas, destacava-se o
desenvolvimento capitalista das colônias americanas antes
das metrópoles européias. Ou seja, a transposição para
as Américas, por classes dominantes européias ibéricas
feudais e mercantilistas, de formas de produção superiores
e em contradição com as que se apoiavam nas metrópoles.
Nesse sentido, tinha razão
um dos mais brilhantes críticos da proposta de Sérgio Bagú
sobre o “capitalismo colonial”, abraçada por Milcíades
Peña, quanto à Argentina, e Décio Freitas, no relativo ao
Brasil, entre outros autores. Em 1963, em Quatro séculos
de latifúndio, Alberto Passos Guimarães escrevia que a
orientação e a produção para a venda no mercado eram
“peculiares, em proporções crescentes, a toda a longa
história vivida pela economia mercantil [...]”. Defendia
pertinentemente que, se tomássemos “como ponto de referência,
para definir e classificar os regimes econômicos, os fenômenos
inerentes à circulação”, teríamos que aceitar a
“absurda igualdade entre todos os sistemas sociais por que
passou a Humanidade, a contar do momento em que abandonou a
vida primitiva.”[27]
O
Criador e a Criatura
Eram igualmente
pertinentes os reparos avançados por Passos Guimarães
sobre a transposição feudal de ordem capitalista.
“Percebe-se o conteúdo apologético dessa concepção errônea,
pois com ela se admite que o sistema colonial, em vez de
transportar para o território conquistado os elementos
regressivos do país dominante [...] selecionaria os fatores
novos determinantes da evolução social e deles se serviria
para fundar [...], sociedade de um tipo mais avançado que
as metropolitanas.”
Porém, Passos Guimarães incorria em crasso erro analítico,
ao propor, em vez da transposição capitalista precoce,
instalação regressiva, ainda que
ad
hoc.
Arrancando de pressuposto
epistemológico correto, a impossibilidade da transposição
de modo de produção superior,
Passos Guimarães defendia, contra as evidências históricas
que à Metrópole “não lhe” teria restado “outra
alternativa política senão a de transplantar para a América
Portuguesa o modo de produção dominante no além-mar”
– o modo de produção feudal. Para o autor, tal transposição
teria sido feita, sobretudo, com a concessão do “monopólio
feudal da terra” para os
homens bons.
Estabelecida a propriedade
feudal no Brasil, sempre segundo Passos Guimarães, teria
faltado o servo para explorá-la. Assim sendo, os
novos feudalistas apoiaram a transposição superestrutural
da forma de produção, em superação na Europa, na mão-de-obra
escravizada, primeira indígena, a seguir africana, em
verdadeira regressão histórica à escravidão clássica,
no que se refere a força de trabalho. “Na impossibilidade
de contar com o servo da gleba, o feudalismo colonial [sic]
teve de regredir ao escravismo [...].”
[29]
Construção
Arbitrária
A proposta interpretativa
de Passos Guimarães constituía construção arbitrária,
do ponto de vista factual e metodológico. As sesmarias eram
propriedades de cunho alodial, como assinalara Décio
Freitas, podendo os proprietários vendê-las, alugá-las,
doá-las, etc. Os sesmeiros não possuíam direitos
eminentes e restritos sobre elas, como no feudalismo. Passos
Guimarães criticava corretamente a dedução de modo de
produção da orientação e circulação
mercantil, mas deduziu a forma de produção de inexistente
instância super-estrutural, o feudalismo.
O próprio Passos Guimarães
lembrara que, em interpretação marxista, o “básico num
regime econômico é o sistema de produção, isto é, o
modo por que [ou seja, pelos quais], numa determinada formação
social, os homens produzem os bens materiais de que
necessitam viver e que determina todos os demais processos
econômicos e sociais, inclusive os processos de distribuição
ou circulação de bens.”
Em A ideologia alemã, Marx e Engels lembravam que, o
que os homens são, dependem “ das condições materiais
de produção”, refletindo-se tanto no que “produzem
quanto” na “maneira como produzem”.[31]
Na leitura marxiana da
sociedade defendida formalmente por Passos Guimarães, a
forma de propriedade constitui decorrência tendencial da
forma de produção. Como na tese capitalista da colonização
ibero-americana, a contradição essencial do proposto caráter
feudal ou semi-feudal encontrava-se na esfera da produção,
em geral, e nas relações sociais de produção
objetivadas, em particular. Incorriam em contradição insolúvel
as propostas de ordem feudal ou capitalista funcionando,
respectivamente, em trabalhadores escravizados e
assalariados. Ou seja, em relações sociais de produção
escravistas e capitalistas.
Salto
Regressivo
A contradição mais
gritante da interpretação feudal da produção americana
era seu apoio substantivo na mão-de-obra escravizada.
Quanto à interpretação capitalista, sua contradição
mais aparente era a inexistência de produtor direto,
produtor de mais valia, no uso de maquinarias e métodos de
produção modernos. Trabalhador obrigado a vender, em forma
tendencialmente ininterrupta, a totalidade de sua força de
trabalho como mercadoria, devido à incapacidade de produzir
seus meios de subsistência.
Marx era claro sobre as
determinações essenciais do trabalhador subsumido ao modo
de produção capitalista. “Ci voglion secoli perchè il
‘libero’ lavoratore si adatti volontariamente, in
conseguenza dello sviluppo del modo capitalístico de
produzione, cioè sai socialmente costreto a vender
per il prezo dei suoi mezzi di sussistenza abitualia l’intero
suo período attivo di vita, anzi, la sua capacita
stessa di lavoro [...]”. [32]
Ainda após a Revolução
de Maio [1810], por longas décadas, os estancieiros do
Prata lançaram mão à compulsão extra-econômica para
manter o gaucho como peão na estância, ou
serviram-se da mão ao trabalhador escravizado, como em boa
parte do Uruguai, com destaque para os departamentos
setentrionais.
No relativo ao Rio Grande, as fazendas pastoris começam a
substituir os trabalhadores escravizados por livres apenas
nos últimos anos da escravidão, abolida em 1888.
Falsa
Disjuntiva
Se, por um lado, a
historiografia stalinista e pós-stalinista defendia a dominância
do feudalismo colonial na origem da colonização, em
boa parte com trabalhadores escravizados e sem servos, em
propriedade de claro caráter alodial, para impugnar a luta
pelo socialismo, por outro, historiadores marxistas
defendiam capitalismo colonial sem operariado, para
avançar o programa socialista. No frigir dos ovos, nos dois
casos, negavam a determinação do modo de produção pela
forma específica de produzir os bens sociais, condicionada
pelo desenvolvimento das forças produtivas materiais e das
relações sociais de produção que se estabeleciam a
partir das mesmas, base essencial em uma interpretação
social marxista.
Apenas nos anos 1960 seria
superada a vulgata stalinista e pós-stalinista do
necessário e consecutivo trânsito de todas as sociedades
dos cinco grandes modos de produção, definidos por Marx e
Engels quando do estudo das formações sociais europeus –
“comunismo primitivo”, “escravismo clássico”,
“feudalismo”, “capitalismo” e “socialismo”. Uma
superação em boa parte devida a retorno à leitura livre
da literatura marxiana que facilitou que as ciências
sociais reconhecessem as múltiplas formas e modos de produção
conhecidos pela humanidade.[34]
Essas investigações
revelariam o caráter sui-generis da colonização
nas Américas, sem as transposições mecânicas feudal e
capitalista propostas. Um movimento que, no Brasil, com
destaque para as investigações de Jacob Gorender e Ciro
Flamarión Cardoso, abriu caminho à compreensão do caráter
dominante do escravismo colonial, na constituição da
antiga formação social do Brasil. Muito forte a partir dos
anos 1960, esse movimento científico praticamente
interrompeu-se após a maré neoliberal de fins dos anos
1980, como assinalado.
Devido ao seu falecimento, em 1965, Milcíades Peña não
pode participar nessa verdadeira revolução epistemológica.
4. A Estância Pastoril Colonial
e Pós-Colonial como Forma de Produção Pré-Capitalista
No
Uruguai, equipe de
historiadores ligados ao Partido Comunista Uruguaio, em uma
ampla e sistemática investigação historiográfica,
terminariam dissociando-se das teses sobre o caráter feudal
ou semi-feudal da produção pastoril, para enfatizar seu
caráter pré-capitalista. Em de La oligarquia oriental en la
Cisplatina, de 1967, Rosa Eloy, Lucia Sala Touron,
Nelson De La Torre e Julio Carlos Rodrigues foram explícitos
no relativo a essa definição da produção pastoril, ao
lembrar que, “en las regiones ganaderas”, “al expirar
la dominación colonial no se había completado todavia la
apropriación de los medios de producción ni el
sometimiento al peonazgo de las masas rurales.”[36]
Em El Uruguay
comercial, pastoril e caudillesco, esses autores
descrevem situação que se manteve décadas após o fim da
colônia, não apenas na Banda Oriental. Realidade que
dificultou a transformação do gaucho em peão, ou
seja, do homem livre sem posses em trabalhador assalariado
permanente: “Dueños de caballo, lazo y cochillo, no
estaban privados de sus instrumentos de trabajo y tampoco de
médios de vida, ya que podrían porporcionárselos com
facilidad faenando animales que poblaban la campana casi
deserta, sin cercos ni custodia efectiva.”
Uma situação que, no
Uruguai dos inícios dos anos 1830, levou don
Fructuoso Rivera [1784-1874], em resposta a reivindicação
dos criadores orientais [em boa parte, sul-rio-grandenses
estabelecidos no norte desses territórios], a realizar
ampla campanha militar e policial para reprimir a população
rural independente – changadores, faeeneros,
gaúchos, posseiros, charruas, guaranis, etc. – a fim de
obrigá-la a se assalariar como peão. Um processo que seria
concluído apenas décadas mais tarde, no final do século
19.
[37]
Na
Europa e nos Estados Unidos
Esses mesmos autores lembravam
que, em inícios do século 19, a produção capitalista,
ainda reduzida às “zonas atlánticas europeias” e aos
Estados Unidos, buscava “colocar sus producciones em América
Latina” onde predominavam “en las distintas formaciones
relaciones sociales de producción precapitalistas.” Avançam
no mesmo sentido que, nas duas margens do Prata, nas décadas
posteriores à Independência, dominam ainda as oligarquias
comerciais, os estancieiros, os charqueadores “basicamente
precapitalistas”. Realidade que permitiu “acumulación
originaria” que apoiaria a constituição e dominância posterior
de relações capitalistas de produção, a partir de inícios
do século 20.
[38]
Foi importante passo analítico a
definição geral da fazenda pastoril, como forma de produção
mercantil pré-capitalista, a partir de suas características
essenciais, sobretudo no que se refere às forças
produtivas materiais e as relações de sociais de produção.
Processo que superou, nesse domínio, o impasse posto pela disjuntiva
feudalismo & capitalismo, nascida de forte
acomodação de realidades sociais singulares a esquemas teóricos
estranhos a elas, em boa parte devido a pressupostos político-ideológicos,
como proposto.
Uma caracterização geral
daqueles autores que não elide a ainda necessária definição
categorial-sistemática das formas de produção assumidas
pela produção pastoril extensiva pré-capitalista, de
importante dinamismo e longevidade no sul da América.
Definição que precise em forma mais acabada as leis
internas tendências dessa forma de produção, por séculos
hegemônicas nesses territórios. Nesse ensaio, limitaremo-nos
a descrever apenas algumas características essências da
produção pastoril pré-capitalista extensiva.
Algumas
Características Essenciais
Após o ciclo extrativista do
couro, durante anos, as estâncias chimarrãs,
orientadas sobretudo à produção do couro, organizaram-se
com a apropriação-expropriação extra-econômica: 1) da
terra, meio de produção sem valor mas desde sempre com preço,
devido à sua monopolização privada garantida pelos
Estados coloniais ibéricos; 2) do gado chimarão, nascido
da reprodução selvagem dos rebanhos introduzidos na
região sobretudo pelos espanhóis. Terra e gado expropriados
em boa parte ao domínio de comunidades nativas. Um
movimento apoiado na força de trabalho dos estancieiros e
de seus familiares e. sobretudo, de peões e de
trabalhadores escravizados.
A fazenda chimarrã, comumente de
grandes dimensões, exigia pouco trabalho, em geral limitado
à reunião dos animais para a produção do couro,
realizada em geral sur place. Mantinha habitualmente
um número de trabalhadores superiores às necessidades
produtivas, que protegiam a propriedade dos ataques e
garantiam a posse da mesma. Essa mão-de-obra excedente era
paga em boa parte pela produção das estâncias não
transformada em mercadoria – carne, couro, sebo, etc.
Nos anos 1780, com o advento das charqueadas, no Rio Grande do
Sul e na Banda Oriental, a fazenda chimarrã deu lugar, em
forma crescente, à fazenda crioula ou de rodeio,
em geral de menor porte, em relação à anterior, dedicada
à criação do gado mais ou menos costeado, pelo couro,
carne, sebo, graxa, cabelo. Apesar de exigir trabalho mais
intensivo – castração, marcação, rodeio, etc. –,
essa forma de produção expulsou tendencialmente a população
excedente, devido à valorização dos gados, ainda que
transformados ainda não totalmente em mercadoria.
As fazendas chimarrã e de rodeio
utilizavam a força de trabalho dos proprietários e seus
familiares, de cativos, de posteiros, de moradores, de
agregados, de peões permanentes ou temporários. Essa mão-de-obra
era remunerada com os meios de subsistência (trabalhadores
escravizados); com os meios de subsistência e algum salário
monetário (peões); com o direito ao uso da terra (posteiros
e moradores), etc. Durante décadas, a coerção social foi
importante meio de submeter os homens livres ao trabalho nas
estâncias.
Renda
Fundiária
A renda do estancieiro, obtida
sobretudo através da venda do couro, carne, sebo, etc. dos
animais, subdividia-se em renda da terra e renda
do trabalho. A primeira, de caráter netamente pré-capitalista,
originava-se em outras esferas da produção e era
apropriada pelo estancieiro, devido ao monopólio da terra,
condição especial de produção de caráter finito. Ao
contrário, a renda do trabalho provinha do trabalho
excedente produzido pelos produtores diretos –
trabalhadores escravizados; trabalhadores livres
remunerados; posteiros e moradores, etc.
As tarefas pastoris eram
realizadas por trabalhadores livres e escravizados, através
de atos produtivos isolados ou coordenados, apoiados na
habilidade do manejo de meios de produção [cavalo, laço,
etc.] e instalações produtivas [galpões, bretes, etc.]
muito simples, de fácil confecção e, durante longo tempo,
de fácil apropriação. Na fazenda de rodeio, as principais
práticas produtivas limitavam-se à domesticação, à
marcação, à castração, à cura rudimentar dos animais.
A maturação do produto dependia fortemente das condições
ambientais – chuvas, temperatura, aguadas, pastos nativos,
etc.
Nessa forma de produção, eram
limitadas as possibilidades de aumentar o sobre-trabalho dos
produtores diretos estendendo o tempo e a intensidade da
jornada produtiva. Em forma geral, por longo tempo, a expansão
da produção da fazenda chimarrã ou de rodeio deu-se quase
exclusivamente através da incorporação de novas áreas
produtivas, novos rodeios e novos trabalhadores. As grandes,
médias e pequenas propriedades pastoris praticamente não
diferiam no relativo às práticas produtivas e à
produtividade.
No Rio Grande do Sul, apenas em
inícios do século 20, em atraso em relação ao Uruguai e
a Argentina, a atividade pastoril começou a introduzir-se
na esfera de produção capitalista. Então, no contexto de
uma crescente divisão do trabalho [cabanha; criadores;
invernadores, etc]; desenvolvimento das forças produtivas [banheiros;
pastagens artificiais; cercas de arame; centro de manejo;
inseminação artificial, etc.]; especialização dos
trabalhadores [peões; alambradores; inseminadores; veterinário;
tratoristas, etc.], a renda do capital começou a sobrepor-se
à renda da terra, que se manteve e mantém, porém, seu
peso significativo.
Esse processo realizou-se
lentamente, sendo que ainda hoje subsistem estâncias
dedicadas à criação semi-extensiva, através do pastoreio
contínuo. A fazenda pastoril propiciou parte importante da
acumulação originária de capitais que na Argentina, no
Uruguai e no Rio Grande embasou o processo diferenciado de
industrialização conhecido por essas regiões, hegemônico
apenas a partir das primeiras décadas do século 20. Mesmo
que a estância tenha alimentado a produção manufatureira
e industrial capitalista, os estancieiros não foram os
principais protagonistas dessa metamorfose.
II. MILCÍADES PEÑA: IMPASSE DA FORMAÇÃO NACIONAL ARGENTINA
Em El Paraíso
terrateniente, Milcíades Peña retomou a crítica à
proposta feudal e semi-feudal para a Argentina, propondo que
o peão fosse já um assalariado claramente capitalista. “Feudal, o de rasgos
feudales, podía ser la modalidad con que el patrón
estanciero castigaba o recompensaba a sus peones. Pero la
esencia económica de essa relación era capitalista, era la
relación contractual entre el proletario carente de medios
de producción y el propietario de la estancia que alquilaba
la fuerza de trabajo del peón a cambio de un salario.”[39]
Destaque-se que formas de
coerção física à produção caracterizam relações
servis ou semi-servis de produção, não necessariamente
escravistas ou feudais. E não podemos esquecer que uma
característica básica do gaucho era sua capacidade
de subsistir, por longos períodos, sem vender sua força de
trabalho. Isso devido à incapacidade dos proprietários da
Argentina, do Uruguai e do Rio Grande de separá-lo
radicalmente das condições necessárias à produção dos
seus meios de subsistência – o cavalo, o laço, as
boleadeiras, o gado chimarrão, os campos não cercados,
etc.
Naquele trabalho, lembra
que, mesmo no relativo aos vice-reinados, a unidade da América
Hispânica colonial era exterior e artificial, produto de ação
política determinada pelas necessidades da defesa e do
monopólio comercial metropolitano. O próprio vice-reinado
do rio da Prata [1778] reunia um enorme território,
transpassado social e economicamente por fortes tendências
centrífugas – atuais Argentina, Bolívia, Uruguai e
Paraguai. Peña define como mito histórico a narrativa
sobre a unidade hispano-americana perdida, que propõe como
inevitável, devido à falta de laços econômicos comuns.
Porém, lembra que, no processo de independência, poderiam
ter nascido nações mais portentosas. Propõe a gênese de
um Estado federativo poderoso, os Estados Unidos da América,
quando da ruptura das colônias britânicas da América,
como produto dos interesses de uma “indústria” que,
mesmo incipiente, criara mercado interno que necessitava
conservar e expandir.
A essa razão, juntaríamos outras, como a necessidade de
suas classes dominantes de defrontar a poderosa ex-metrópole
e subjugar as classes subalternizadas.
[41]
Segundo Milcíades Peña, na América
Hispânica, ao contrário, dominavam “interesses
capitalistas” orientados ao mercado mundial – a
oligarquia comercial e os produtores de matérias-primas:
couros, minerais, etc. Porém, lembra que os grandes
comerciantes portenhos [que define como “burguesia
comercial” em sentido estrito] interessavam-se, sim, pela
formação de mercado nacional, para uma mais ampla
introdução de bens estrangeiras, e não para a realização
da produção nacional de qualquer tipo. “ Lo trágico [...] era que los
elementos del desarrollo capitalista baseados em el mercado
interno, es decir, en el desarrollo interior de la nación,
eran nulos, ya que todos los intereses capitalistas se
orientaban hacia la exportacion y eran esencialmente portuários.”
Uma
visão da impossibilidade de construção de uma grande nação
ibero-americana, devido à “inexistência de las bases
materiales y espirituales” concorrente com a dos
historiadores uruguaios Lucia Sala de Touron e Rosa Alonso
Eloy. [43]
As classes
ibero-americanas interessadas no mercado interno seriam
sobretudo “pequeños productores atrasados, destinados a
desaparecer ante la competencia de las muy superiores
industrias europeas”, como era o caso da “industria
artesanal del interior argentino”. Uma das teses centrais
do brilhante ensaísta foi a inexistência até o século 20
de classe apontando para a industrialização da Argentina. Ele criticava igualmente
a tese de independência ibero-americana prematura, vista a
incapacidade das nações surgidas da ruptura com a metrópole
de industrializarem-se. Propunha que a ordem colonial era já
parasitária, nada mais tendo a oferecer às colônias.
Segundo ele, em 1810, a Independência ensejaria a única
forma em que a iberoamérica “podia evolucionar”. Ou
seja, como “apéndice económico da Europa, abastecedor y
consumidor de la industria inglesa”. Propõe que haveria
progresso na transição de “colônia” em “semicolonia
económica”.[45]
Milcíades Peña liquida a
possibilidade de desenvolvimento autônomo, apresentando a
dependência da ex-colônia à industria inglesa como avanço
histórico. Mesmo sendo está última agente da destruição
da produção artesanal, doméstica e pequeno-manufatureira
americana. Uma leitura que define como marxiana: “Marx
consideraba progresiva esa subordinación”. Lembra que os
USA conheceram tal dependência, para superá-la, a seguir.
Apóia-se nas páginas clássicas onde Marx descreve o
processo avassalador, no plano humano, mas progressivo e
inevitável, em sentido histórico geral, da penetração
dos tecidos ingleses no mercado indiano, com a conseqüente
destruição da produção artesanal tradicional do país,
incapaz de concorrer com os produtos industrializados.
Mais tarde, como veremos, Milcíades Peña matiza sua
proposta sobre a inexorabilidade da dependência,
como caminho para a independência econômica.
Progresso e Regresso
Milcíades Peña defende
que, devido ao “primitivismo de sus métodos de producción”,
o artesanato e a pequena manufatura tinham “escasa
posibilidad de supervivencia” diante das mercadorias
importadas, que realizaram obra progressiva, ao destruí-la.
Propõe que uma política de defesa alfandegária seria
nociva ao desenvolvimento social e histórico regional. Que
não existia na América Ibérica “indústria moderna”,
quando da Independência, mas apenas “industria doméstica”,
como a do interior argentino e da província de Buenos
Aires. E ela não seria um “resorte propulsor de cultura sino
de atraso, ya que sólo podia sobrevivir a condición de
frenar el desarrollo capitalista de las industrias agropecuárias
del litoral, las únicas que en las condiciones de entoces
podían permitir una rápida acumulación de capital
nacional.” [48]
Destaque-se que sua
proposta apóia-se e se sustenta na caracterização como
capitalista da produção agropecuária dos anos da Colônia
e da Independência, como já destacado.
Milcíades Peña liquida
inapelavelmente as proposta protecionista da produção
artesanal e pequeno-manufatureira do interior argentino:
“La protección a las industria artesanales del interior
hubiera sido ajustar el galope tendido del litoral hacia la
acumulación capitalista al lento paso de mula de la
industria del interior.”
Desqualifica a valorização dessa produção empreendida
pelo historiador Abelardo Ramos, em América. “[...] no hay ni una molécula
de verdad en la afirmación de que la industria artesanal
del interior tendía ‘a crear un estado histórico y económicamente
nacional’”.
Apesar do sentido demiúrgico dado à produção pastoril
do litoral, não realiza apologia desta última e enfatiza a
importância da industrialização propriamente dita. Para
ele, a “función de la industria” como “resorte
propulsor de la cultura moderna” não necessitava ser
demonstrada. Critica a apologia do mundo rural de José
Hernandez no célebre poema Martín Fierro.
[51]
Para Milcíades Pena, as
classes que, mesmo limitadas historicamente, realizaram a
“acumulação capitalista” no Litoral, que defendia como
progressista, em relação à produção “artesanal do
interior”, historicamente regressista, eram, como proposto:
a “burguesia comercial” e a “burguesia ganadera”. Na
Argentina, na visão de Milcíades Peña, a “burguesia
comercial” era formada pelos grandes comerciantes
portenhos, após a Independência sobretudo crioulos, que
lutavam para manter, na nova ordem, o monopólio do porto de
Buenos Aires sobre o Prata, antes assegurado pelo
exclusivismo colonial. Seria uma classe voltada para o
exterior, pois dependente da venda dos manufaturados que
interiorizava e das matérias-primas que exteriorizava. Porém,
a ela, interessava a formação de mercado nacional,
através da submissão das províncias argentinas do Litoral
e do Interior ao porto de Buenos Aires, para mais ampla e
rendosa distribuição das mercadorias inglesas e exportação
das nativas. Era um segmento social incondicionalmente
liberal e livre cambista, sem vinculações com a produção,
como já visto.
Capitalismo
Pastoril
Para Milcíades Peña, era
sobretudo a “burguesia ganadera” que impulsionava a
acumulação capitalista, ligada estreitamente à produção.
Portanto, não se tratava de mera “acumulação originária
de capitais”, de cunho pré-capitalista, mas produção
capitalista propriamente dita. A “burguesia ganadera”,
mesmo participando das visões livre-cambistas da
“burguesia comercial”, não comungava a proposta desta
última de conformação de mercado nacional,
insatisfeita com os gastos que a política exigiria, sem lhe
trazer vantagens, pois vendia seu charque e couros no
exterior. “Pero aquella [burguesia
comercial] pretendia unificar a todo trapo el país para
ensanchar así el mercado interno con el cual ella lucraría
colocando las mercadorias que importaba de Europa, sin
preocupar-se demasiado de la suerte de los ganaderos
bonaerenses. Los estancieiros, en cámbio, no tenían interés
en ariesgar un solo centavo de sus ganancias en prol de la
unificación nacional.” Estavam
mais interessados em reprimir os índios pampas, para
expandir suas estância em direção ao interior.[52]
Em oposição à burguesia
comercial e pastoril-charqueadora da província
de Buenos Aires, definidas como capitalistas, levantavam-se
sobretudo as classes ligadas às formas de produção pré-capitalista
do Interior, com destaque para a produção doméstica,
artesanal e pequeno-manufatureira e para as populações gaúchas,
que se mobilizavam contra o liberalismo portuário e a produção
charqueadora que destruíam suas formas de produzir e viver.
“La política
de la oligarquía porteña era, en síntesis, ampliar y
profundizar su acumulación capitalista, mientras que todo
el resto del país deseaba proseguir tranquilamente
repreduciendo el modo de producción y de vida
existentes.”[53]
Segundo Milcíades Peña,
os grandes estancieiros do Litoral, com destaque para os de
Entre Rios e Corrientes, apoiavam e se apoiavam nas facções
sociais do Interior, contra a oligarquia comercial e
pastoril de Buenos Aires, que impunha o monopólio portuário
e se negava a nacionalizar as rendas alfandegárias. O
privilégio portuário valorizava a produção charqueadora
da província de Buenos Aires, em detrimentos dos
charqueadores das províncias do Litoral. O monopólio das
rendas portuárias deixava literalmente as províncias do
Interior à mingua, pois o export-import era a única
grande renda pública. A contradição entre as principais
classes sociais do Litoral-Interior e de Buenos Aires, por
um lado, e entre criadores-charqueadores e comerciantes
desta última província, por outro, originariam as duas
grandes correntes políticas que determinaram no essencial
os confrontos sociais e a formação do Estado argentino: os
Unitários e os Federalistas.
Em 1810, a Revolução de
Maio nasceu e se consolidou sob a hegemonia da oligarquia
comercial portenha, que se mobilizou, como assinalou Juan
Bautista Alberdi [1810-1884],
para se libertar da autoridade metropolitana de Espanha e de
seus tributos e contra a “autoridad de la Nación
Argentina”, que pretendia substituir o “coloniaje español”
pelo portenho. Milcíades Peña assinala igualmente que
“Revolução de Maio” fora literalmente uma “doble
declaración de guerra”: pela independência, contra a
Espanha e pelo domínio do vice-reinado do rio da Plata,
contra as províncias, como assinalado.
Durante o primeiro período pós-1810, a “burguesia
comercial” portenha comandou o processo de conformação
do Estado nacional, contra os interesses provinciais, que
exigiam a proteção da produção doméstica, artesanal e
pequeno-manufatureira e a nacionalização das rendas portuárias.
Ela contou com o apoio dos estancieiros e saladeiristas
bonaerenses, igualmente favoráveis ao livre câmbio e ao
monopólio do grande porto. “Había
[...] un claro antagonismo entre Buenos Aires y el Litoral
por un lado, interesados en exportar los productos de su
ganaderia y comprar en cambio los productos extranjeros, y
por lo tanto librecambista, y del outro lado el Interior,
carente de productos exportables, pero poseedoer de una
rudimentária industria abastecedora del mercado interno,
para quien la libre introduccion de productos extranjeros
significab a la ruína.”[55]
O
Advento do Rosismo
Para Milcíades Peña,
durante esses anos de convergência, “burguesia
comercial” e “burguesia ganadera” de Buenos Aires
impulsionaram a acumulação e a estrutura capitalistas
argentinas nascentes, fazendo recuar as sobrevivências pré-capitalistas.
“La oligarquia porteña, comerciantes y estancieros
coincidían – con diferencias de táctica – en afiançar
la estructura capitalista de la nación a costo de todos los
elementos precapitalista. Su proposito era liquidar al
gaucho privandolo de libre usufructo de la carne y
obligandolo por la fuerza a proletarizarse, empleándose en
estancias o saladeros.”
Portanto, reconhece que a proletarização do gaúcho,
transformado em peão, era um objetivo perseguido
pela “burguesia ganadera” e ainda não consumado.
Essa orientação histórica,
ou seja, a destruição da produção pré-capitalista das
províncias do Interior, pela produção dita capitalista do
Litoral, apesar de ser, na visão do autor, historicamente
progressista, causava imensos sofrimentos à população do
Interior: “[...] la política de la oligarquía porteña
era la política de la ‘civilización’ es decir, tendía
a construir una civilización basada en la producción de
alimentos y materias primas para el mercado mundial, con
todas las restantes actividades del país subordinadas a
esta. La mayoría del país no tenía nada que ganar y sí
mucho que perder con el advenimiento de tal civilización, y
es comprensible su oposición a ella.”
O que ensejaria, para Milcíades
Peña, por longas décadas, uma oposição histórica
verdadeiramente regressista das massas populares do
Interior, sobretudo através das montoneras, forma de
luta das massas gaúchas subalternizadas. “La montonera conjugó en su seno al gauchaje del
litoral, privado de su tradicional modo de vida por la
valorización de la carne que trajo consigo el comercio
libre, con los más variados sectores de la población del
interior, destruidas sus fuentes de subsistencia por la
competencia inglesa.” Dirigidas por caudilhos das classes dominantes, as montoneras
seriam, para Peña, movimentos restauradores que, apesar de
democráticos, por representar a maioria do país na luta
contra a oligarquia de Buenos Aires, não possuíam cunho
democrático-burguês, ao não mobilizarem-se pelo domínio
e expansão da ordem capitalista. Uma contradição entre
“movimento democrático” e “democrático-burguês”
que se deveria, para o autor, ao fato de que, a “estrutura
de la colônia había sido decisivamente capitalista [Buenos
Aires], pero con grandes sectores precapitalista
[Interior].” Portanto, deduzia, também, o caráter não
progressista da luta das classes subalternizadas da definição
como capitalistas das oligarquias comercial e pastoril da
província de Buenos Aires. [58]
Milciade Peña não via
qualquer possibilidade de superação social das massas
urbanas do Interior, incorporadas à pequena produção
mercantil doméstica, artesanal e manufatureira dos pequenos
burgos, ou às comunidades gaúchas da campanha. “Las masas montoneras querían, desde luego, pan. Y
precisamente engrosaban la montonera porque las antiguas
modalidades de producción estaban destruidas y no podían
ya ganarse su pan como tradicionalmente lo hacían. Pero
‘tierra’ no buscaban ni les interesaba. A los gauchos
del Litoral ofrecerles una parcela hubiera sido
insultarlos.”[59]
Uma proposta que se
justificaria, ainda que muito parcialmente, se consideramos
“parcela de terra” como um lote destinado exclusivamente
à agricultura, produção relativamente à margem da experiência
social de parte da população gaúcha. Efetivamente, uma
pequena horta de subsistência fazia parte comumente do
“modo de produção gaúcho”.
Porém, a proposta de Milcíades Peña mostra-se
profundamente contraditória considerando-se o dinamismo
social que poderia ter assumido a mobilização das massas
gaúchas, no caso do oferecimento, não de um “lote de
terra”, mas de uma “suerte de estância”, como
proposto, em fins do século 18 inícios do século 19, na
Banda Oriental, quando do chamado “arreglo de los
campos”.
Revolução
Artiguista
A proposta democrático de
legalização e distribuição de terras, entre a população
subalternizada [gaúchos, índios, crioulos pobres, negros
livres, etc.], objetivava estrutural produção pastoril
de subsistência, capaz de produzir o suficiente para o
consumo e para a venda necessários para a manutenção de
uma unidade familiar. Ela foi avançada pela administração
colonial e implementada, em forma limitada, no fim do período
colonial, sobretudo na Banda Oriental. O principal agente
desse projeto reformista da administração hispânica foi o
militar, engenheiro, naturalista e geógrafo espanhol Félix
de Azara [1742-1821]. Esse projeto pretendia criar um cinturão
de pequenos proprietários que pusesse fim à expansão
luso-brasileira. Quando da luta pela Independência, por
longos anos, essa proposta galvanizaria em forma radical e
ampla os deserdados dos campos na Banda Oriental.
A democratização da
propriedade da terra foi parte integrante da luta pela
independência federativa das províncias do Prata. Combate
dirigido por José Artigas [1764-1860] contra a oligarquia
comercial e fundiária oriental e portenha, até ser
derrotado pela conjugação das forças dos grandes proprietários
da Banda Oriental, da Argentina e do Império.
Lamentavelmente, Milcíades Peña não aborda essa questão,
amplamente desenvolvida em um sentido inovador, no outro
lado do rio da Prata, pelo grupo Práxis, formado por
brilhantes historiadores ligados ao Partido Comunista
Uruguaio.
Em Artigas: tierra y
revolución, trabalho sintético de 1967, aqueles autores
propõem sobre o célebre “Reglamento provisório de la
província Oriental para el fomento de su campana y segurida
de sus hacendados”, de 10 de setembro de 1815: “El
reglamento aparece pues, como el programa económico-social
de la revolución, enderezado a cortar el nudo principal de
las contradicciones que atenazaban la sociedad criolla: el
problema de la proprieda de la tierra y el de la producción
ganadera. Y al mismo tiempo, se dirige a asentar sobre la
tierra a los pobres del campo, creándoles las condiciones
para su benestar y trabajo libre, y a erradicar las viejas y
ahora parasitarias y contrarrevolucionárias formas de
existencia marginales de la producción: bandidismo,
contrabano, corambre, etc.” “[...] el Reglamento Provisório de 1815 fue la más
avançzada y gloriosa ley que tuvieron los orientales. La
confluencia en un solo haz de la revolución nacional
anticolonial, democratica, republicana y federalista con la
revolución social dispoensadora de tierras y enaltecedora
de la dignida humana transformó a la montonera oriental en
el más formidable y peligrosos de los ejércitos: el de los
hombres que viven y mueren por un ideal.” [62]
Uma revolução nacional-democrática
que, ao apoiar-se nas necessidades objetivas de amplos
segmentos sociais subalternizados – gaúchos, negros,
cativos, índios, etc. –, soube-lhes ganhar a confiança e
o apoio, acaudilhando-os na longa e dolorosa resistência
diante das classes proprietárias [pré-capitalistas]
associadas da Banda Oriental, de Buenos Aires e do Império
do Brasil.
Em La oligarquia oriental em la Cisplatina, os
autores citados lembram precisamente que a síntese entre
uma liderança conseqüente, o programa democrático-burguês
de distribuição de terras aos deserdados do campo e às
camadas sociais plebéias, aos quais interessavam aquelas
medidas revolucionárias, resultaria em um outro “modelo
de montonera”. Uma montonera que estabeleceria um “novo
modo de relaciones entre caudillos y massas: las relaciones
libres entre hombres livres trabajadores directo de la
tierra”.
As razões da derrota de revolução democrático-radical na
Banda Oriental e da sua frustração na Argentina são históricas,
não havendo empecilho ou impasse estrutural para esse
movimento. Segundo os autores uruguaios citados, essa
derrota fez retroceder a revolução democrática radical,
impondo a hegemonia sobre a Banda Oriental dos setores oligárquicos
comerciais de Montevidéu, representantes dos grandes
capitais europeus e dos grandes proprietários fundiários,
impedindo a hegemonia de sociedade e produção capitalista
por décadas.[65]
Para Milcíades Peña,
tamanho seria o caráter retrógrado da produção
artesanal, doméstica e pequeno-manufatureira interiorana
que ela ameaçaria a própria unidade argentina em formação.
Visão que deixa nas mãos da burguesia comercial e
pastoril o futuro nacional argentino, apesar do alcance
historicamente restritivo dos projetos dessas classes. No
contexto da interpretação que desenvolveu, Milcíades Peña
não encontra saída dialética para a história da antiga
formação social argentina, pois a ordem capitalista que
propõe não produzia e reproduzia antagonicamente a classe
que explorava, destinada historicamente a lhe servir de
coveira. Em momento algum o autor aponta o proletariado
rural, ou seja, os peões, na sua interpretação surgidos
da produção capitalista pastoril, como classe protagonista
na história argentina e portadora de projeto democrático e
revolucionário.
“Era una
verdadera tragedia que las industria criollas, notoriamente
atrasadas, para conservar sus reducidos mercados locales,
debieron fragmentar al país renunciando así a construir el
gran mercado nacional. Porque éste debía fatalmente ser controlado por la
burguesía porteña, y ello significaba el librecambio, es
decir, entregar el mercado nacional a la industria inglesa.” “La
historia no brindaba ninguna salida para este circulo de
hierro.”
Já no século 19, quando se estabeleciam objetivamente tais
contradições, haveria plena consciência da oposição
entre os interesses do Interior e das classes liberais
importadoras. Ideólogos federalistas lembravam que a vitória
de Buenos Aires sobre o Interior significaria a estagnação
e “miles y miles” de indivíduos sem nenhuma ocupação.
Entretanto,
para Milcíades Peña, não havia solução para essa
contradição: “[...] el desarrollo de la acumulación
capitalista – de la civilización capitalista en la única
forma en que podía darse en aquel momento en la Argentina,
es decir, como capital semi-colonial, atrasado y
agropecuario y comercial, determinaba fatalmente una política
oligárquica y antidemocrática. El desarrollo capitalista
en la Argentina no conducía a la democracia, sino a la
oligarquía.” [67]
Como
lembraria Marx, “Inglaterra aspiraba a ‘convertir a
todos los demás países en simples pueblos de agricultores,
reservándose ella el papel de fabricante’”. Seria
a profunda concordância de interesses entre a indústria e
as finanças inglesas e esse padrão de desenvolvimento capitalista
semi-colonial argentino, meramente importador de
manufaturados e exportador de matérias-primas, que
permitiria a “penetración y la influencia británica en
el país”.
Movimento interpretado diretamente por Bernardino Rivadávia
[1826 -1827],
primeiro, e, por Juan Manual de Rosas [1793-1877],
a seguir. Milcíades Peña assinala o caráter explorador
dessa fase pré-imperialista do capitalismo, na qual a
dominação dava-se através da venda de manufaturados e
compra de matérias-primas, através de trocas desiguais. Os
couros argentinos eram comprados, nos campos, por uns 3,5
peniques por libra, para serem vendidos em Buenos Aires, por
5,5, três meses mais tarde. Passado meio ano da produção,
o produto era arrematado, em Londres, curtidos, por 9 a 10
peniques. No torna-viagem, uma bota, feita com o couro
bonaerense, custava, em Buenos Aires, em torno a vinte
novilhos! [69]
Couros
e Charques
Os criadores bonaerenses,
ligados à produção, exportavam couros e charque e
importavam manufaturados e alimentos, em parte do interior.
Eram livre-cambistas e não possuíam visão nacional. Os
comerciantes portenhos, representantes do capital comercial
e industrial inglês, desligados da produção, mobilizaram-se
desde 1810 pela reconstrução do vice-reinado, para
restabelecer o monopólio da exportação e importação de
mercadorias. Portanto, necessitavam unificar o país.
Representante dessas forças, o unitarista Rivadávia, na
presidência do país, pretendeu colonizar o pampa e
desenvolver a agricultura, para impulsionar o comércio
interno, pois a fazenda pastoril pouco consumia. Ele sempre
respeitou religiosamente os interesses ingleses, entregando
imensas terras públicas em enfiteusis, para garantir
o emprestado pelos banqueiros ingleses.
[70]
A política geral de Rivadávia
desagradava os criadores bonaerenses. Ele
se voltava para o futuro, enquanto, no presente, os
“indios conquistaban la provincia de Buenos Aires y el
gauchaje se alzaba más que nunca contra la obligación de
conchabarse en estancias y saladeros.” Porém,
nesses anos, acelerou-se a apropriação privada das terras
públicas. Entre 1822 e 1930, “538 proprietarios
obtuvieron por lo menos 8 millones seiscientos mil hecares”,
pagando ao Estado pouco mais de cinco mil pesos, em todo. No
frigir dos ovos, lembra Milcíades Peña, o “unitarismo
significaba disponer de los fondos de la aduana porteña
para una política nacional manejada desde Buenos Aires. [...] aumentar los impuestos que recaían sobre los
estancieros. Por otra parte, el programa de centralización,
en la medida en que prometía eliminar las aduanas
interprovinciales y hacer accesible a los artículos
extranjeros todo el mercado interno, expresaba en términos
políticos los intereses de todos los vinculados a la
expansión del comercio interno y externo.”[71]
Ao
ditar a lei da capitalização, o unitário Rivadávia
ensejou que os estancieiros se transformassem em federalistas.
“Y los estancieros y saladerista bonaerenses eran
enemigos irreductibles de los impuestos en general y de los
impuestos a la exportación en particular.” “Además,
era probable que en un régimen unitario el gobierno central
dedicaria su tiempo y recursos al desarrollo del
interior”, isso para “expandir los mercados internos y
ligarlos a Buenos Aires y a otros puertos”, “más que a
continuar el programa de expansíon territorial hacial el
Sur”, como necessitavam os criadores de Buneos Aires, sob
a impulsão da produção charqueadora. Os criadores opunham-se também
à imigração colonial-camponesa. [72]
As províncias do Interior
defenderam-se do exclusivismo portuário estabelecendo
tarifas especiais, alfândegas de trânsito, taxas
diferenciais, etc. Essa ação autonomista foi apoiada pelos
estancieiros bonaerenses, que queriam o federalismo
para manter sob controle o porto e a oligarquia comercial. A
aliança entre os estancieiros bonaerenses e as províncias
poria fim ao governo quase exclusivo da oligarquia
bonaerense, que procurava mercado nacional e empobrecia o
Interior. As classes subalternizadas, entre elas os gaúchos,
que resistiam à proletarização e ao arrolamento militar,
apoiavam a resistência federalista ao liberalismo portuário
invasor. Milcíades Peña lembra que, nessa aliança,
dominaram os estancieiros de Buenos Aires, segundo ele, capitalistas.
Desse processo surgiria a ditadura. “Rosas
constituye una etapa decisiva en el desarrollo del
capitalismo argentino, tal cual es, vale decir,
capitalismo atrasado, semi-colonial, esencialmente
agropecuario.” “Rosas pertenecía – y era uno de los más
poderosos integrantes – a esa clase capitalista nacional; capitalista,
pese a toda la charlatanería que pretende asignarle un carácter
‘feudal’.” “[…] Rosas contribuyó a desarrollar e
hipertrofiar – como convenía a su clase – la principal
actividad capitalista del país, es decir, la estancia y el
saladero.”
Haveria, portanto, unidade essencial entre os períodos da
história argentina, antes, durante e após o rosismo
– todos seriam etapas do desenvolvimento do capitalismo no
país.
Preocupados
com o que Interessava
Segundo Milcíades Peña,
Rosas e os estancieiros não se preocupavam em criar um
mercado nacional, mas em desenvolver, como apenas proposto,
a produção capitalista pastoril-saladeira
dominante. Não havia razão para seguirem outro caminho. O
governo rosista impulsionou a monopolização do gado para o
saladeiro; impediu tributação da propriedade fundiária;
escorraçou os nativos pampas, para permitir a expansão da
fazenda; acelerou a transformação do gaúcho em peão. O
primeiro saladeiro de Rosas iniciou seus trabalhos em
novembro de 1815. No mesmo ano, ditava-se o decreto: “Todo hombre de campo
que no acredite tener propiedades legítimas o tierras de qué
subsistir, será reputado sirviente, y obligado a llevar
papeleta de conchabo de su patrón, visada cada tres meses
por el juez de paz, so pena de declarársele vago y
castigado con cinco anos de servicio militar obligatorio, o,
si no sirviera para ese destino, con dos años de conchabo
obligatorio a cargo de un patrón, la primera vez y de diez
anos la segunda, en caso de reincidencia.”[75] Medida orientada a criar, através
de coerção extra-econômica, mercado de trabalho livre,
devido à falta de condições históricas para que os
produtores diretos fossem obrigados a vender a força de
trabalho por razões meramente econômicas, como assinalado.
Para
manter o monopólio do porto de Buenos Aires, que produzia
rendas e vantagens diferencias para os saladeiros
bonaerenses, Rosas lutou contra a França, que pretendeu
impor seu poder mercantil desde Montevidéu. O bloqueio
francês do porto de Buenos Aires favoreceu a economia das
províncias litorânea e a produção manufatureira do
interior. Em 1849, Rosas acertou com os ingleses o respeito
ao monopólio de Buenos Aires e à navegação dos rios
interiores, lançando o Litoral na miséria.
Milcíades Peña assinala que “Rosas fue el
primer gobernante argentino que sustentó su poder con una
hipertrofia de ejército de línea, que es el enemigo nato
del gaucho, de sus correrías y sus montoneras. Las rentas
de la aduana porteña le permitieron mantener en pie de
guerra cuatro ejércitos de línea.”
O que permitia aos criadores bonaerenses uma administração
menos contemporizadora em relação às populações gaúchas
da província que se refugiavam numerosas entre os nativos
pampas e na Banda Oriental.
Peña destaca igualmente o
“temperamento cavernícola” de Rosas, definindo-o como
reacionário até a medula, lembrando sua militância contra
“la enseñanza libre, contra el divorcio, contra el
liberalismo, [...].”
Um perfil que destoa fortemente de líder burguês-capitalista,
mesmo colonial. Para o autor, o “antiliberalismo,
el clericalismo, el oscurantismo” de Rosas era sobretudo
“política ideológica para mantener el orden y evitar
trastornos a lo poseyentes.” Intuindo a contradição
de sua proposta, procura impugnar os argumentos daqueles que
estranhavam governo capitalista que não apoiava minimamente
a indústria. “Y si sólo calificásemos como capitalista a los
gobiernos que contribuyeron a desarrolar el capitalismo
industrial, entonces resultaría que hasta 1900 no hubo
entre nosotros ningún gobierno que estimulase el desarrollo
capitalista del país.”
O que, diga-se de passagem, por além da data apenas
referencial, é correto, para a Argentina como para o
Brasil.
Mercado
Interno e Industrialização
Milcíades Peña polemiza
com a historiografia que via a oligarquia comercial portenha
como uma classe que se esforçava para industrializar o país
e, na enfiteuses, estratégia para controlar o avanço
dos estancieiros. Lembra que, para os comerciantes,
industrializar o país era liquidar-se como importadores.
Uma solução de caráter lógico para uma questão histórica.
Nas Américas, comerciantes usaram comumente o controle dos
mercados e a acumulação mercantil de capitais [pré-capitalista]
para produzirem e vender as mercadorias que antes importavam.
Aquele historiador ajunta
que os comerciantes queriam unificar o país apenas para
melhor introduzir monopolicamente os produtos estrangeiros,
não lhes interessando a “conquistar o deserto”, pois a
expansão da produção pastoril pouco lhes seria vantajosa.
Para Peña, se o viés nacional da “burguesia
comercial” era anti-industrialista, o industrialismo
da “burguesía estanceril” seria anti-nacional: “[...]
los estancieros y saladerista bonaerense, clase
indudablemente nacional por su vinculación a la producción
del país [sic], en la cual se basaba su poderío, era
cerradamente localista y en tanto conservaba su puerto único
con su correspondiente aduana privilegiada, se desentendía
del resto do país siempre y cuando éste vegetara
pasivamente sin pretender quebrar el monopolio porteño del
puerto y de producto de la aduana.”[81]
Por
sua vez, os “productores artesanales”, a única classe
que almejaria o desenvolvimento da produção interna,
mobilizavam-se pelo “estancamiento protegido de sus
atrasadas empresas.” Uma situação
que teria determinado, segundo o autor, verdadeiro impasse
histórico: “El círculo estaba cerrado y no había dentro
del país ninguna fuerza que tendiera a romperlo, aunquando
el interés en la producción nacional a la creación de un
mercado interno nacional.” Porém,
o autor propõe salto para frente da produção capitalista
pastoril-charqueadora com o fim do rosismo, que teria
expressado a autonomia dos grandes criadores, já
capitalizados. O porto e a campanha de Buenos Aires, cada
vez mais inseridos e submetidos ao mercado mundial,
exigiriam avanços significativos na produção pastoril, além
dos exigidos e permitidos pelo saladeiro. “La ganadería se diversifica,
apareciendo nuevos intereses al margen de los vinculados al
saladero.” [82]
Em
1845, inicia a introdução do alambrado, que primeiro é
usado para proteger as chácaras e plantações e, a seguir,
para cercar as estâncias.
Os banheiros carrapaticidas, a melhoria genética, as
invernadas, as áreas de manejo, a ovinocultura, a construção
de ferrovias e, finalmente, o advento dos frigoríficos
deixavam para trás a “fazenda crioula”, o peão
agauchado e o saladeiro, formas de produção que
sustentavam a ditadura rosista. Já controlando a
terra, os estancieiros abriam-se igualmente para a colonização,
que valorizava as propriedades, tornava mais baratos os
meios de subsistência, fornecia a mão-de-obra
crescentemente exigida pelos avanços produtivos, com
destaque para a ovinocultura, sequiosa de mão-de-obra
especializada.
Milcíades
Peña assinala a própria transformação nos costumes,
fortemente influenciadas pelos ingleses. Realidade muito visível,
já que as modificações produtivas impunham-se em forma
desigual. Em 1847, Mc Cann escrevia: “Los propietarios de
campos pueden dividirse en dos categorías: los que quieren
adoptar hábitos europeos, cuyas modalidades imitan, y los
que prefieren conservar las costumbres del país.”
As transformações profundas que ocorriam ao nível da
produção exigiriam novas formas de domínio político,
superando inexoravelmente a ditadura rosista, que regera o
país durante décadas: “Al llegar Caseros, lo único
que restaba del frente rosista de 1830 eran las masas
bonaerense y los caudillos mediterráneos, quiénes, por si
solo nada podían decidir [...].”Milcíades Peña propõe
que, se Rosas não tivesse caído, haveria possivelmente a
separação do Litoral, como ocorrera com o Paraguai. [85]
Nova
Ordem
Para
Milcíades Peña, a nova ordem político-social que nascia
em uma Argentina ainda mais ligada ao comércio exterior
ensejava uma ainda maior dependência ao capital mundial.
Situação que radicalizava, e não contraditava, movimento
construído durante a ditadura rosista. “El
saladero era menos dependiente del capital extranjero que el
frigorífico [...] pero se trata de la diferencia que media
entre la crisálida y la mariposa, es decir, la economía
‘independiente’ del rosismo llevaba todos los gérmenes
de la economía dependiente sin comillas que se estructuró
después.”
Ou seja, havia avanço de quantidade, mas jamais salto de
qualidade nessa transposição.
La era de Mitre: de Caseros a la
Guerra de la Triple Infâmia, denso e original momento da
interpretação de Peña sobre a formação histórica
argentina. O trabalho aborda o candente período que vai da
queda de Rosas, em 1852, à intervenção da Argentina de
Mitre na Guerra do Paraguai, em 1864-70. Para o autor, essa
guerra constitui momento conclusivo da imposição, pela
“burguesia comercial” portenha, da conformação estatal
liberal-unitária à nação argentina. O ensaio retoma a
proposta da queda de Rosas, derrotado pelo unitarismo,
da “burguesia comercial portenha”, sob a direção de
Mitre, unida ao federalismo das províncias do Litoral e do
Interior, comandadas pelo general José Justo Urquiza [1801-1870].
A fácil vitória de Monte Caseros, em fevereiro de 1852,
expressaria a dissolução do rosismo,
com a perda de sua base de sustentação, a estância e o
saladeiro capitalistas tradicionais, como visto.
Milcíades Peña aponta o
programa federalista de Urquiza como “aportes progressivos”
importantes à “organización definitiva del país para
facilitar su desarrollo capitalista”: supressão das
aduanas internas; nacionalização das aduanas exteriores;
livre navegação dos grandes rios; criação da Bolsa de
Comércio; fundação de Departamento de Estatística; abolição
da pena de morte; fim ao confisco por razões política,
etc.
Não discute a contradição posta por programa nacional avançado
defendido por forças sociais e políticas das províncias
do Interior, segmentes, segundo ele regressivos. Programa
progressivo em contradição direta com as propostas localistas
e atrasadas defendido pela “burguesia comercial”
portenha e os “criadores” e “saladeiristas” de
Buenos Aires, que definia como os segmentos capitalistas
de ponta da nação.
Um projeto democrático nacional
abortado, em 11 de setembro de 1852, com o rompimento com a
Confederação Argentina da província de Buenos Aires,
comandada pelos unitários de Mitre, expressão da
“burguesia comercial” portenha, dos criadores
bonaerenses e dos interesses ingleses. Rompimento nascido da
negativa de nacionalizar as rendas portuárias de Buenos
Aires, que avantajavam a província em relação ao resto do
país e à bacia do Prata. Movimento que Juan Bautista
Alberdi definiu como retorno “ao rosismo sem Rosas”. Uma
política imposta pela violência e pela força que levaria
o mitrismo a prever a constituição da província de Buenos
Aires em nação independente, caso não se impusesse à nação
– República del Plata.[88]
Fracos
e Fortes
Milcíades Peña analisa
detidamente a fragilidade econômica da Confederação
Argentina, mesmo após a liberdade de navegação dos
grandes rios, diante de Buenos Aires, centro inconteste do
capital mercantil, que recebia o apoio indiscutível do
grande comércio mundial, com destaque para o inglês.
Aponta sobretudo como responsável da vitória portenha a
fragilidade do bloco político-social que sustentava a
Confederação, que teria nos “ganaderos entrerrianos”,
representados pelo general Urquiza, o único setor “capaz
de enfrentar a la oligarquia perteña”. Peña lembra que não
haveria contradições essenciais entre criadores e
saladeiristas de Buenos Aires e do Litoral, que impedisse
uma acomodação final entre eles.
[89]
A vitória indiscutível de
Urquiza, sobre Mitre, na batalha de Cepeda, em 23 de outubro
de 1859, sem impor definitivamente a unificação e o poder
nacional à província de Buenos Aires, expressaria o
impasse social, político e histórico do federalismo,
vergado mais tarde também devido à defecção do grande
caudilho provincial na batalha de Pavón, em 17 de setembro
de 1862. “[...] Urquiza representaba a los estancieiros
entrerrianos” aliados da oligarquia portenha durante a
ditadura de Rosas, até que se inimizarem com ele devido ao
“monopolio aduanero y de los ríos”, inaceitáveis pelos
proprietários das províncias do Litoral diante das novas
oportunidades oferecidas pelo comércio mundial. Fora devido
a essa contradição que acaudilharam as forças sociais
provinciais do Interior, com contradição essenciais com a
ditadura portenha, com destaque para a industria artesanal e
pequeno-manufatureira e as massas gaúchas.
Não havia questão essencial que
impedisse que os criadores entrerrianos abandonassem a suas
sortes os antigos aliados plebeus
na busca de acordo com as forças portenhas e bonaerenses,
sobretudo diante de impasse que os prejudicasse
economicamente.
Eles, como os criadores de Buenos Aires, abominavam o
protecionismo industrial e a independência econômica.
A vitória em Pavón e a acomodação das classes hegemônicas
litorâneas permitiram a imposição da ditadura unitarista
ao federalismo das províncias do Interior. Movimento no
qual Mitre associou a força das “bayonetas porteñas”
ao apoio fornecido pelos núcleos raquíticos das
oligarquias liberais locais, apesar da forte oposição da
população, com destaque para as classes plebéias urbanas
e sobretudo rurais, que comumente se sublevaram através das
montoneras.
Para Peña, manteria-se o impasse
histórico vivido pela Argentina na época: “Dentro del país
no existían clases capazes de imprimir outra orientación a
la evolución nacional”.
A inconseqüência histórica da “industria doméstica”
e do modo de viver e produzir gaúcho ensejariam que a oposição
à penetração da ditadura liberal-mercantil portenha,
sobretudo sob a forma das montoneras, que reconhece
como movimento popular de resistência, não tinha
“absolutamente ningún porvenir”. Isso porque essa oposição
carecia de “conteúdo social progresivo”, ao não
aportar “la posibilidade de ningún orden social novo”. Trataria-se de “defensa moribunda de una estructura
social sin posibilidades de evolución acendente”, como
visto. O progresso estaria ao contrário com a “oligarquia
porteña”, mesmo não democrática, pois sua
“politica” “elevaba la economía nacional a una etapa
superior en la cual a las masas que integraban las
montoneras habría de tocarles la peor parte”. Isto porque
“aportaba algunos escasos elementos de civilización
industrial, con cuenta gotas y para beneficiar en primer término
al capital extranjero y en segundo termino a la oligarquía
porteña y sus socias menores del resto del país, con
entera desidia por la creación de los cimientos de una gran
nación.” [93]
O unitarismo dominou o país com
a liquidação da Confederação Argentina, impondo a ordem
liberal-mercantil às províncias do Litoral e do Interior e
às suas populações, massacrando as montoneras e
seus caudilhos. Porém, tratava-se de uma hegemonia frágil
e instável, sobretudo devido à oposição essencial à
dominação liberal-comercial portenha dos blancos da
ex-província oriental e, sobretudo, da enorme, poderosa e
rebelde ex-província do Paraguai. O governo daquele país,
dependente de uma saída ao mar e, portanto, contrário à
hegemonia portenha ou imperial sobre o Prata, era um aliado
do federalismo argentino capaz de desequilibrar a correlação
de força apenas construída. Milcíades
Peña lembra: “La guerra contra el Paraguay fue la
continuación lógica y la última etapa de la guerra de a
oligarquía mitrista contra el Litoral e las provincias
interiores argentinas […].”[94]
Destruição
Geral
Dois pontos altos do ensaio La
era de Mitre, sobretudo devido ao momento em que foi
produzido, são a análise, ainda que sintética, da formação
social paraguaia e do sentido da intervenção do governo
imperial brasileiro naquele conflito. Intervenção que
ensejou que os exércitos da Argentina mitrista e do Império
destruíssem aquele país “con una minuciosidad que el
mismo Hitler no logro hacer con ningún pueblo”. Nesse processo, Milcíades
Peña discute os resultados sociais profundos do processo de
resistência paraguaio e retoma a discussão sobre os
grandes objetivos da Revolução de Maio, analisados nos
dois primeiros ensaios: “[...] emancipar el país de
Espana y someter todo el virreinato a Buenos Aires”.
[96]
O autor lembra que a luta
paraguaia pela independência ensejara a repressão dos
segmentos oligárquicos anti-nacionais espanholistas
e portenhistas,
com destaque para a aristocracia administrativa, para os
grandes proprietários espanhóis e para os comerciantes
ligados ao comércio de Buenos Aires e inglês. Em nome da
“clase dominante del Paraguay integrada por medianos
propietarios agrários”, o movimento capitaneado pelo dr. José Gaspar de Francia [1776-1840] se materializaria em uma “economía
defensiva, basada en el monopolio estatal de la propiedad
del principal instrumento de producción – la tierra – y
de la comercialización de los productos fundamentales de
exportación [...].” Solução
que ensejaria à nação guarani, apesar da pobreza do país
e da expropriação imposta pelo porto de Buenos Aires,
“capitalizarse acelerdamente”. [97]
Milcíades Peña assinala que,
por não possuir o país classes tão ricas como os
“estancieiros e a burguesia comercial porteña”, surgira
um “Estado que por su poderio económico y centralización
política” competiria com aqueles segmentos sociais, entre
os “más poderosas y prósperas de América del Sur”. Em
sensível interpretação de cunho materialista, assinala
que a “sociedad paraguaya, pesa a la dictadura estatal
personalizada y de formas casi monárquicas”, era um país
democrático, já que não era “un Estado parasito, sino
ligado íntimamente a la producción y la comercialización
de la producción”, em que “todas las clases eran
realtivamente débiles e iguales”.
Uma debilidade e fragilidade das classes proprietárias que,
agregaríamos, resultou em Estado interpretando fortemente
os interesses dos médios e pequenos camponeses proprietários
e arrendatários; dos pequenos comerciantes; do artesanato e
produção pequeno-mercantil, etc. Concordando com o autor,
ajuntaríamos que essa realidade manteve-se muito presente
durante a ditadura francista [1813-1840] e passou a conhecer
gradual mas inexorável transformação, em favor dos
grandes proprietários, nos dois governos seguintes, de
Carlos Antônio López (1844-1862) e Francisco Solano López
(1862-1970). Movimento que não alcançou a realizar salto
de qualidade, interrompido pela Guerra Grande, que
realizaria radical metamorfose liberal-mercantil do país,
sob a hegemonia do capital exterior e o tacão da ocupação
militar.
Uma
Saída Inesperada
Apoiando-se em Juan Bautista
Alberdi e em outros autores coevos, Milcíades Peña
assinala, sem os exageros então já habituais, o
desenvolvimento relativo em que se encontrava o
Paraguai nos anos 1860 – ferrovias, manufaturas,
metalurgia, telefone, telégrafo, etc. Iniciativa de
modernização apoiado essencialmente em capitais estatais,
enquanto o Império e a Argentina, muito mais ricos, eram
obrigados a endividar-se, para tal, junto ao capital
mundial. Nesse processo interpretativo, conclui, em clara contradição
com teses sobre a Argentina defendidas anteriormente:
“Paraguay, en cambio, en virtud del poderío capitalista
[sic] de su estado y de la homogeneidad de su clase
gobernante demostró inmediatamente que era capaz de
asimilar la civilización industrial y orientarse hacia
ella, pero bajo su contra, sin perder su soberanía.” “Paraguay evolucionaba
independientemente hacia la civilización capitalista
industrial [...].” [99]
Ao encerrar a discussão muito
sintética da formação social paraguaia, Peña recapitula
sua tese central sobre a Argentina do período em análise:
as províncias do Interior não tinham proposta alternativa
superior à do liberal-mercantilismo portenho. A organização
social das principais classes das províncias do Litoral era
igual no essencial às da província de Buenos Aires. O que
configurava o impasse, ou anel de ferro, nas suas
palavras. Entretanto,
agrega, apontando em outra direção: “Paraguay, en
cambio, ofrecía una alternativo distinta a la de la
oligarquía porteña y superior a ella, como que se basaba
en el desarrollo autónomo de la economía nacional en base
a todas las conquistas da civilización, industrial y
capitalista.”
Uma economia nacional que se dera à margem das trocas
internacionais e apoiada fortemente na produção artesanal,
pequeno-manufatureira e camponesa. Produção que enfatizara
e desqualificara, respectivamente, no relativo à Argentina.
Na segunda parte do ensaio,
Milcíades Peña explica a guerra como iniciativa do
liberal-mitrismo para, por um lado, “liquidar aquel foco
que en cualquier momento podía aglutinar a las derrotadas
provincias del Interior y a los estancieros de lo Litoral”
e, por outro, “extender su influencia hasta el mercado
paraguayo, rompiendo las barreras de su monopolio estatal y
su rígida centralización”. Quanto
ao Estado e às classes dominante imperiais, lembra que sua
economia se sustentava no “trabalho esclavo”, padecendo
das crises desse sistema de produção, “cada vez más
costoso e ineficiente”, necessitando para tal “expansión
territorial a expensas de los vecinos, con tendencia a
dominar toda la zona del Plata”.
Em outra sensível interpretação, nega terminantemente que
a Argentina mitrista e o Brasil Imperial fizeram “la
guerra del Paraguay por encargo de Inglaterra, aun que al
terminar la guerra el principal beneficiario [...] fue el
capital londinense.” [102]
Lembra que o ataque do Império,
associado à Argentina, contra o Paraguai, começou
efetivamente com a agressão orquestrada por aqueles países
ao Uruguai, “el último aliado que le quedaba” à nação
guarani, “después de la derrota del Interior argentino y
la neutralización del Litoral por el acuerdo de Urquiza con
Mitre.”
Destaca as ambições mais amplas do Império na República
Oriental, da qual parte de seu território era “una
polongación del Estado brasileño do Rio Grande do Sul”,
com grande “cantidad de estacieros [rio-grandenses]”
estabelecidos nas regiões setentrionais do país oriental,
que sonhavam com sua anexação ao Império. Assinala a
vontade dos criadores sulinos de continuarem se comportando
no Uruguai como em sua terra, despachando o gado livremente
para o Rio Grande, recebendo de volta os cativos homiziados
no Uruguai, que abolira a escravidão.[104]
O
Sentido da Guerra
Milcíades Peña assinala o apoio
de Mitre e do Império à invasão do Uruguai por Venancio
Flores [1808-1868],
até a deposição do governo independente e legal blanco.
Cita carta de Mitre a Domingo Faustino Sarmiento
[1811-1888] comprovando a utilização da necessária travessia
das tropas paraguaias de Corrientes como forma de levar o
Paraguai à guerra contra a Argentina: “Por aquí son [los
paraguayos] impotentes. Por tierra tendrían que violar el territorio argentino
y se encontrarán en guerra contra nosotros aliados con el
Brasil.”
Citando o jornal mitrista Nación Argentina, de 3 de
fevereiro de 1865, assinala o projeto de destruição da
ordem autonômica em vigor no Paraguai, em nome do
liberalismo mercantil, e portanto, também, dos interesses
ingleses, antes da declaração de guerra entre a Argentina
e este país. “La República Argentina [...] está
em el imprescindible deber de formar alianza com el Brasil a
fin de derrocar esa abominable dictadura de López y abrir
al comercio del mundo esa expléndida región.” Desnuda
a retórica patriótica argentina e imperial, servindo-se de
declaração do próprio Mitre, sobre a guerra como
orientada a derrubar a ditadura bárbara paraguaia. Quando a guerra terminava, Mitre
escrevia: “Los soldados aliados, y muy particularmente los
argentinos, no han ido al Paraguay a derribar una tiranía
[...]. Han ido [...] sirviendo intereses argentino y lo
mismo habrían ido se en vez de un gobierno monstruoso y tiránico
[...] hubiéramos sido insultados por un gobierno más
liberal y civilizado.”
Assinala o atraso militar paraguaio diante dos antagonistas
e a defesa intransigente da sua população da liberdade. [108]
Milcíades Peña chama a atenção
para que, mesmo sendo a guerra contra o Paraguai parte
fundamental da ofensiva final contra as forças federalistas
das províncias do Litoral e do Interior, como assinalado,
sobretudo diante da resistência guarani, ela “debilitó
el frente interno de la oligarquía y permitió un último
estertor de las masas” daquelas regiões “contra a
oligarquia porteña”. Assinala que a população plebéia
argentino “votó contra la guerra del Paraguay desertando
em masa, insurreccionándose, cooperando con los paraguayos
donde pudo y resistiéndose pasivamente al mitrismo en todas
partes.”[109]
Destaca como parte desse movimento as montoneras do
Interior, dirigidas por Felipe Varela, parte mais
significativa da situação de insurreição intermitente
que dominou os seis anos de governo de Bartolomé Mitre. [110]
Conclui o trabalho ressaltando o
pouco entusiasmo dos estancieiros bonaerenses pela guerra,
devido sobretudo aos gastos financiados com os impostos de
exportação, ao contrário da oligarquia comercial
portenha, a grande interessada no conflito, que conformou a
nação no sentido liberal pretendido, estendendo seu raio
de ação e lhe garantiu negócios fabulosos. Grande defensor do comercio, Mitre
afirmaría: “En la guerra del Paraguay ha triunfado no
solo la República Argentina sino también los grandes
principios del libre cambio, que son los que vivifican al
comercio. Para el comercio se han derribado las fortalezas
que amenazaban las costas; para el también se han roto la
cadenas que obstruían el rio Paraguay; para él se ha
conquistado también la paz presente y futura de estas
regiones [...].” [111]
Termina narrando a situação de
destruição e saque do Paraguai após a guerra, sob o tacão
da ocupação militar. Assinala que, já em 1870, o país
contraía seu primeiro empréstimo, de um milhão de libras,
que terminou integralmente nas mãos dos vencedores. Lembra
que a oligarquia portenha não alcançou plenamente seus
objetivos, pois o Império defendeu a integridade
territorial do Paraguai, para que a região não escapasse
para as mãos argentinas, assim como os ingleses protegeram
o status nacional daquele país, contra os dois
grandes agressores, preocupados na recuperação de seus
empréstimos.
[112]
“De
todo esto o único que queda em pie es que la oligarquía
porteña, contra la voluntad de toda la Nación Argentina,
entró por derecho propio en la historia universal del
impudor con una de las más épicas canalladas que registra
la historia del mundo. Com semejante hazaña Mitre impuso el
predominio indiscutido de la oligarquía porteña sobre el
resto del país, incluso sobre los otrora rebeldes ganaderos
entrerrianos, y destruyó también, en beneficio de la
burguesía europea y de su servil intermediario cita en las
orillas del Plata, el primero y único intento de evolución
independiente hacia el capitalismo industrial que conoció
América Latina hasta hoy.”
Uma valorização de processo que não se materializou na
Argentina e no Uruguai, não por destino histórico, mas
pela força e vitória das classes mercantis e pastoris pré-capitalistas
da província de Buenos Aires, em processo que atrasou
substancialmente a gênese da produção capitalista e das
classes trabalhadoras fabris. Processo que valorava como único
caminho em direção da emancipação social e política
regional.
[1]
FREITAS, Décio. O capitalismo pastoril. Porto
Alegre: Est, 1980. pp. 9-52.
[2]
BAGÚ, Sergio. Estructura social de la colônia:
ensayo de historia comparada de América Latina. Buenos
Aires: Ateneo, 1952; ZORRILLA, Ruben H. em Extracción
social de los caudillos: 1810-1870. Buenos Aires: La Pleiade, 1972.
[3]
FREITAS. O capitalismo pastoril. Ob.cit. p. 11.
[4]
FREITAS, Décio. Palmares : a guerra dos
escravos. Porto Alegre: Movimento, 1973.
[5]
Cf., entre outros: FREITAS, Décio. Insurreições
escravas. Porto Alegre: Movimento, 1976; Escravos
e senhores-de-escravos. Porto Alegre: EST; Caxias do
Sul, UCS, 1977; Escravidão de índios e negros no
Brasil. Porto Alegre: EST/ICP, 1980; FREITAS, Décio.
O escravismo brasileiro. Porto Alegre: Mercado
Aberto, 1980; FREITAS, Décio. O capitalismo
pastoril. Porto Alegre: EST, 1980. Os
guerrilheiros do Imperador. 2 ed. Rio de Janeiro:
Graal, 1982
[6]
FREITAS, Décio. O capitalismo pastoril. Ob.cit.
pp. 10-11.
[7]
Id. “O capitalismo pastoril”. Ob.cit. p. 16.
[12]
MAESTRI, Mário. “O cativo, o gaúcho e o peão:
considerações sobre a fazenda pastoril
sul-rio-grandense”. MAESTRI, Mário. [Org.] O negro
e o gaúcho: estâncias e fazendas no Rio Grande do
Sul, Uruguai e Brasil. Passo Fundo: EdiUPF, 2008. pp.
169-271.
[13]
Cf., entre tantos outros: ZARTH, P. A. História agrária
do Planalto Gaúcho. 1850-1920. Ijuí: EdiIJUÍ,
1997. DAL BOSCO, Setembrino. Fazendas pastoris no Rio
Grande do Sul. [1780-1889]. Programa de Pós-Graduação
em História da UPF. Passo Fundo, novembro de 2008
[mestrado]; EIFERT, Maria Beatriz Chini. Marcas da
escravidão nas fazendas pastoril de Soledade:
1867-1883. Passo Fundo: EdiUPF, 2007; PALERMO, Eduardo
Ramón Lopez. Tierra esclavizada: el norte uruguaio
en la primera mitad del siglo 19. PPGH, Passo Fundo, 2008. [mestrado]
[15]
PEÑA, Milcíades. Antes de Mayo: Formas
sociales del transplante español al nuevo mundo. 1500-1810. Buenos Ayres:
Fichas, 1973; El paraíso terrateniente:
federales y unitarios la civilización del cuero.
1810-1850. Buenos
Aires: Fichas, 1972; La era de Mitre: de Caseros
a la Guerra de la Triple Infamia. 1850-1870. 3 ed. Buenos Aires:
Fichas, 1975; De mitre a Roca: consolidación de la oligarquia angocriolla. 18701885. 2
ed. Buenos
Aires: Fichas, 1972.
[16]
D’AMICO, Ernesto. Milcíades Peña: Una história
trágica.ob.cit.
[17]
MAESTRI, Mário. A Escravidão e a gênese do Estado
Nacional Brasileiro In: Seminário Internacional “Além
do apenas moderno”, 2001, Recife. ANDRADE, Manuel
Correia de. [Org.] Além do apenas moderno. Brasil séculos
XIX e XX. Recife: Massangana, 2001. v.1. pp.49 - 77
[18]
PEÑA, Milcíades. Antes de Mayo.
Ob.cit. p. 75.
[19]
BANDEIRA, L. A. Moniz. O expansionismo brasileiro e a
formação dos Estados na bacia do Plata: Argentina,
Uruguai e Paraguai. Da colonização à guerra da Tríplice
Aliança. 2 ed. Brasília: EdUnB, 1995.p. 58.
[20]
PEÑA. Antes de Mayo.
Ob.cit. p. 22, 23.
[21]
PEÑA. Antes de Mayo.
Ob.cit. p. 87
[22]
Cf. Sobretudo: Economía de la sociedad colonial,
de 1949, e Estructura social de la colonia, de
1952.
[23]
Cf. sobretudo: FRANK, A.G. Capitalismo e
subdesarrollo en la América Latina, de 1967.