Imperialismo
e desnacionalização: o caso da economia brasileira
Cristiano
Monteiro Da Silva
Mestre em Economia Política pela PUC-São Paulo
Marxismo Vivo -
Novembro
2002
A
partir da década de 1990 constata-se um crescimento no volume de
fluxo de investimento direto estrangeiro (IDE) em diversas economias
no mundo. Neste contexto, estudos apontam que as empresas
multinacionais sediadas nos países com economia capitalista mais
desenvolvida concentram o grosso dos investimentos, atuando em grande
medida como exportadores líquidos de IDE.
No
Brasil observa-se um crescimento considerável da participação do
capital estrangeiro em diversos setores da economia. Desse processo,
convém destacar o novo perfil do IDE. O investimento direto
estrangeiro, que em outros momentos do desenvolvimento industrial
brasileiro possibilitou a inauguração de setores da economia,
atualmente destina-se à aquisição de capacidade produtiva
instalada, um forte processo de desnacionalização.
Essa
realidade tem sido tema de pesquisa. No anseio de analisar
teoricamente esse processo, o trabalho que segue recorre à literatura
clássica marxista para verificar sua capacidade de explicação.
Segundo
os pressupostos da teoria do imperialismo, elaborados pelo pensamento
marxista, o desenvolvimento do capitalismo fomenta a formação de
grandes empresas com capacidade de realizar investimentos externos,
sendo esse movimento inerente ao modo de produção capitalista. Neste
sentido, o objetivo deste texto é apontar as contribuições que a
teoria do imperialismo oferece à explicação do processo de
desnacionalização da economia brasileira
A
teoria do imperialismo
Ao
final do século XIX, o capitalismo vivia grandes transformações de
sua base produtiva, financeira e comercial. O surgimento de grandes
empresas, com elevado grau de produtividade, e a formação de grandes
bancos, com destacado peso no sistema financeiro da época,
caracterizavam o surgimento de uma nova fase do sistema capitalista.
Ao mesmo tempo surgia um grande debate teórico sobre o significado
dessas transformações. Os precursores deste debate foram Lenin, Rosa
Luxemburgo, Hilferding, Kautsky, Bukarin, Hobson entre outros. Esses
autores elaboraram estudos acerca do problema, preocupados em
responder cientificamente às transformações sofridas pelo
capitalismo mundial naquela época.
O
trabalho de Hobson (1983) foi a primeira contribuição ao debate
acima referido. Para compreender a formação dos monopólios, o autor
analisou amplamente o desenvolvimento industrial de sua época, e pôde
constatar a concentração da produção em poucas empresas que
controlavam os distintos ramos industriais. Tratava-se de grandes
empresas com elevada capacidade produtiva e financeira que, por essa
razão, ditavam as regras de acumulação mundial. Para Hobson, esse
era um movimento inusitado na história do capitalismo mundial, uma
nova fase do sistema. O autor classificou esse período como a fase
imperialista do sistema capitalista.
Todavia,
embora Hobson tenha dado a contribuição inicial ao tema, foi o
trabalho do líder revolucionário V.I.Lenin (1986) que ganhou maior
notoriedade na época, sendo até hoje muito discutido nos meios acadêmicos.
Segundo a interpretação de Lenin, a fase imperialista do capitalismo
é marcada sobretudo pela concentração da produção e formação de
monopólios. “O imperialismo é a fase monopolista do
capitalismo”(Lenin,1986,p.641).
Observa-se
que Lenin também apresenta a fase imperialista como a fase
monopolista do capitalismo, porém, convém destacar o diferente
tratamento dado pelo autor a essa questão. Para Lenin, as grandes
empresas não surgiram como um fenômeno puro e simples. São
resultados do desenvolvimento do sistema capitalista, que possui como
tendência à concentração e centralização do capital. Em seu
trabalho “O Imperialismo Fase Superior do Capitalismo”1, Lênin
procura demonstrar que nos primórdios do sistema capitalista
predominava a livre-concorrência ,mas o desenvolvimento das contradições
de seu modo de produção fez consolidar a sua fase monopolista, ou
seja, imperialista.
Para
chegar a essa conclusão, Lenin teve a preocupação em realizar um
resgate histórico do sistema capitalista, que permitiu o autor
descrever o seu desenvolvimento em três fases:
“Assim,
o resumo da história dos monopólios é a seguinte: 1)Décadas de
1860 e 1870, o grau superior , culminante, de desenvolvimento da livre
concorrência. Os monopólios não constituem mais do que germes quase
imperceptíveis. 2) Depois da crise de 1873, longo período de
desenvolvimento dos cartéis, os quais constituem ainda apenas uma
excepção, não são ainda sólidos, representando ainda um fenômeno
passageiro. 3) Ascenso de fins do século XIX e crise de 1900 a 1903:
os cartéis passam a ser uma das bases de toda a vida econômica. O
capitalismo transformou-se em imperialismo”. (Lenin, 1986, p.591).
O
surgimento da fase imperialista trouxe mudanças na acumulação de
capital. As grandes empresas passaram a concentrar seus investimentos
também no setor externo, crescendo de forma considerável o volume da
exportação de capitais. Essa nova realidade, apontada pela teoria do
imperialismo, promoveu uma nova dinâmica ao capitalismo mundial. “O
que caracterizava o velho capitalismo, no qual dominava plenamente a
livre concorrência, era a exportação de mercadorias. O que
caracteriza o capitalismo moderno, no qual impera o monopólio, é a
exportação de capital”. (Lenin, 1986, p.621).
A
exportação de capitais acelerou o desenvolvimento do capitalismo
mundial. A realização de investimento em novos territórios
consolidou a expansão do capitalismo para esses locais, acelerando a
produção de riqueza e desenvolvendo outros mercados consumidores.
Contudo,
a correta definição sobre o que motiva grandes empresas investirem
em regiões externas foi tema de debate entre os precursores da teoria
do imperialismo. A seguir, procuramos ilustrar de forma sucinta, os
posiciona-mentos que julgamos mais pertinentes para a conclusão deste
trabalho.
Hobson
e o problema do subconsumo
Esta
visão apresenta o problema de realização da produção como a razão
principal das exportações de capitais. O foco está na contradição
entre a produção e o consumo.
Observando
o processo produtivo das grandes empresas de sua época, Hobson
constatou que a elevação da composição orgânica no processo
produtivo dessas empresas proporcionou um aumento significativo no nível
de produção, causando muitas dificuldades para a realização. A
produção aumenta no decorrer do tempo sem que a mesma possa
realizada, ou seja, encontre uma demanda compatível.
Segundo
Hobson, essa é uma característica das grandes corporações que
possuem um processo produtivo intensivo em capital. Neste sentido,
enquanto o processo produtivo era rudimentar, com baixa produtividade,
era possível prever e estabelecer o nível de produção adequado à
demanda existente. Com a elevação da composição técnica, as
grandes empresas produzem sem que sua produção consiga ser absorvida.
Daí a idéia de que o capitalismo convive com o problema crônico de
realização da mais-valia. Segundo Hobson (1983, p.211) “A origem
essencial de depressão nos negócios é o subconsumo. Se,
simultaneamente, certo volume de capital e certo volume de mão-de-obra
se mantém ociosos em todos os ramos de negócios, ou na generalidade
deles, a única razão possível para que permaneçam sem emprego esta
na inexistência, na ocasião, de demanda dos bens que eles,
cooperando, são capazes de produzir”.
O
autor está defendendo a idéia de insuficiência de demanda. Essa visão
ficou conhecida como a teoria do subconsumo. De acordo com a visão
subconsumista, grandes empresas buscam mercados externos para realizar
a produção. Segundo este ponto de vista, esse é o elemento
motivador da exportação de capitais.
Lenin
foi um severo crítico da visão subconsumista. Para o autor, esse
ponto de vista incorreu de grandes erros por resumir a razão da
exportação de capital ao problema de realização, uma visão que
afasta da análise o caráter exploratório do capitalismo. Ao admitir
que a exportação de capital ocorre apenas em busca de mercado
consumidor, pressupõe-se que o capital vai promover apenas benefícios
para a região não capitalista. Elimina da análise o caráter
excludente, de exploração do sistema capitalista. Lenin discordou
dessa visão e apresentou a taxa de lucro como a razão para as
exportações de capitais. Logo, segundo seu ponto de vista, o capital
promoverá, em busca desse lucro extraordinário, um aumento da
exploração da classe trabalhadora local.
Lenin
e a lei da tendência declinante da taxa de lucro
A
explicação de Lenin se prende aos elementos do modo de produção
capitalista. A produção se move unicamente pelo lucro, portanto, a
exportação de capitais ocorre em busca tão somente de uma maior
taxa de lucro que as regiões menos desenvolvidas podem oferecer.
A
busca pelo aumento da taxa de lucro é o que motiva grandes empresas
investirem em regiões menos desenvolvidas. Lenin, entretanto,
discordou da idéia de que a acumulação de capital só é possível
caso ocorra investimentos em regiões externas, menos desenvolvidas, não
capitalistas. Mesmo em regiões mais desenvolvidas, o capitalismo
constrói novas formas de exploração, e o mercado vai sendo criado e
ampliado de acordo com o volume de investimentos realizados para este
fim. Na medida em que o capitalismo se desenvolve ampliando a produção
e a força de trabalho assalariada, aumenta a demanda por novos meios
de produção, por bens de consumo dos trabalhadores e dos
capitalistas.
Com
o desenvolvimento do capitalismo, cresce também a mecanização da
produção, provocando o aumento da participação relativa do capital
constante no processo produtivo. O departamento produtor de meios de
produção passa a puxar inclusive o crescimento da produção dos
bens de consumo. Nas palavras de Lenin (1988, p.23):
“Segundo
a lei geral da produção capitalista, o capital constante cresce mais
rapidamente que o capital variável. Por isso,o capital constante
existente nos artigos de consumo deve crescer mais rapidamente que o
capital variável e a mais-valia existente nesses artigos, e o capital
constante existente nos meios de produção deve crescer mais
rapidamente ainda, ultrapassando o crescimento tanto do capital variável
(+ mais-valia) existente nos meios de produção como do capital
constante existente nos artigos de consumo. A seção de produção
social que fabrica meios de produção deve, portanto, crescer mais
rapidamente do que aquela que fabrica artigos de consumo. Desse modo,
a extensão do mercado interno para o capitalismo é, até certo
ponto, independente do crescimento do consumo individual, destinando
mais ao consumo produtivo”.
Ocorre
que a produção cresce sem a devida preocupação com a existência
ou não da demanda compatível. De fato, essa situação expressa uma
contradição, entretanto, na opinião de Lenin, o capitalismo se
desenvolve sob as contradições inerentes ao seu modo de produção.
“Trata-se
de uma verdadeira “produção pela produção”, uma ampliação da
produção sem uma ampliação correspondente do consumo. Mas, esta não
é uma contradição teórica: é uma contradição da vida real; é
precisamente uma contradição que corresponde a própria natureza do
capitalismo e as outras contradições desse sistema de economia
social. É precisamente essa ampliação da produção sem a
respectiva ampliação do consumo que corresponde a missão histórica
do capitalismo e a sua estrutura social específica: a primeira
consiste em desenvolver as forças produtivas da sociedade e a segunda
exclui a massa da população do usufruto das conquistas técnicas”
(Lenin, 1988, p.25).
A
contradição desse processo é que a crescente mecanização da produção
nas economias capitalistas mais desenvolvidas provoca redução na
taxa de lucro nestas regiões. Marx, em seu trabalho “O Capital ”,
apresenta a Lei da Tendência Declinante da Taxa de Lucro2, onde
procura demonstrar que o desenvolvimento do capitalismo promove a
elevação da composição orgânica do capital, provocando queda na
taxa de lucro.
Por
essa razão, grandes empresas sediadas nas economias mais
desenvolvidas realizam investimentos para outras regiões, em busca da
elevação da taxa de lucro. Lenin, tendo como premissa o trabalho de
Marx, procura demonstrar que as grandes empresas exportam capitais
para regiões menos desenvolvidas visando recuperar a taxa de lucro,
pois, “nestes países atrasados o lucro é em geral elevado, os
capitais são escassos, o preço da terra e os salários relativamente
baixos, e as matérias-primas baratas”. (Lenin, 1986, p.301).
Nestas
regiões, a mão-de-obra barata e desregulamentada permite o aumento
da taxa de mais-valia. Conforme Marx (1988, p.168), “o grau de
exploração do trabalho, a apropriação de mais-trabalho e de mais-valia
, é elevado a saber por meio de prolongamento da jornada de trabalho
e intensificação do Trabalho”. Segundo a visão de Marx, o aumento
na exploração sobre os trabalhadores permite a recuperação na taxa
de lucro .
É
possível observar que visão de Lenin enfatiza o caráter de exclusão
do sistema capitalista. Como observado no exemplo acima, para
recuperar a taxa de lucro, o capital promove aumento da exploração
de trabalhadores, que se manifesta na forma de baixos salários,
aumento de jornada de trabalho, enfim, péssimas condições de vida
para a classe trabalhadora.
Capital
estrangeiro e desnacionalização
Nesta
segunda parte do trabalho, busca-se analisar a dinâmica do fluxo de
investimento direto estrangeiro no mundo. Com o propósito de
compreender a realidade brasileira, pretende-se verificar em que
medida o aumento de IDE para a economia brasileira tem resultado num
processo de desnacionalização
De
acordo com estudos da SOBEET(2000), o volume de fluxos de IDE vem
crescendo no mundo. A partir da década de 1990, observa-se uma curva
ascendente do investimento direto estrangeiro, propiciado pelas estratégias
das empresas multinacionais que querem ampliar seu campo de ação além
dos países em que se originam. Atualmente, “existem cerca de 63 mil
empresas multinacionais no mundo com 700 mil filiais”(SOBEET,2000,p.16).
O
fluxo do investimento direto estrangeiro no mundo evidencia o poder
exercido pelas grandes empresas oriundas de países com economia
capitalista mais desenvolvida. Constata-se que as grandes corporações,
com sede nos países centrais, são as maiores exportadoras líquidas
de capitais, ou seja, comandam o volume de investimento estrangeiro
para outras regiões.
O
ranking para o período 1992-1997 oferece uma visão mais precisa da
situação acima referida. Conforme elaboração da SOBEET(1998),
observa-se que em termos de países, os grandes investidores no
exterior continuam sendo Estados Unidos, Alemanha e Japão. Esses
dados podem ser observados na tabela 1.
Tabela
1 - Principais Países/Regiões exportadores líquidos de capital de
investimento direto
Fluxos
Acumulados 1992-1997...............................U$$ Milhões
União
Européia....................................................263.453,0
Alemanha...........................................................137.934,0
Estados
Unidos....................................................135.024,0
Japão................................................................113.892,0
Hong
Kong/Cingapura/Taiwan.................................101.099,0
Reino
Unido..........................................................89.443,0
Holanda...............................................................55.026,0
Países
Europeus Fora da União Européia.....................45.443,0
Suíça..................................................................44.516,0
França................................................................24.685,0
Itália..................................................................22.440,0
Canadá................................................................7.726,0
Fonte:
WIR 1998- World investment Report - UNCTAD
Elaboração:
SOBEET
Os
países desenvolvidos concentram o grosso dos investimentos realizados
pelo mundo. Em contrapartida, os países menos desenvolvidos se
apresentam como importadores líquidos de investimento estrangeiro,
situam-se na condição de dependentes dos investimentos externos para
promover planos de desenvolvimento. Esses países atuam apenas como
receptores de investimento direto, face o baixo nível de
desenvolvimento dessas economias. Em termos de região, a América
Latina aparece como a que mais absorveu investimento direto de
empresas multinacio-nais. Os fluxos de IDE para a região
quadruplicaram desde 1992 (SOBEET, 2000).
Tabela
2 - Principais Países/Regiões importadores líquidos de capital de
investimento direto
Fluxos
Acumulados 1992-1997................................U$$ Milhões
China.................................................................177.393,0
América
Latina.....................................................172.255,0
Europa
Central e Oriental.........................................59.002,0
Ásia
Emergente sem China, Hong Kong,
Cingapura
e Taiwan................................................43.693,0
Bélgica.................................................................23.238,0
África
(Incluindo África do Sul).................................23.027,0
Espanha...............................................................21.415,0
Austrália..............................................................17.771,0
Suécia.................................................................11.077,0
Nova
Zelândia.........................................................6.752,0
Israel....................................................................5.360,0
Egito.....................................................................4.111,0
Fonte;
WIR 1998 - World Investment Report - UNCTAD
Elaboração:
SOBEET
Como
observado, as regiões menos desenvolvidas atuam como receptoras de
capitais externos. Aqui convém recuperar a discussão sobre os
elementos que motivam a exportação de capitais para essas regiões.Vale
lembrar a visão de Lenin, de que as exportações ocorrem sobretudo
em busca de uma maior taxa de lucro oferecida em regiões menos
desenvolvidas, porque são regiões com possibilidade de expansão e
fornecedoras de insumos mais baratos.
Um
estudo elaborado pela SOBEET(1999) que analisa a rentabilidade de
subsidiárias americanas, parece legitimar esse ponto de vista. No biênio
de 1995-1996, o estudo aponta os países menos desenvolvidos como
ofertantes de maiores taxas de lucro para essas subsidiárias.
Demonstra, portanto, o potencial de rentabilidade sobre os ativos
totais que as subsidiárias destas multinacionais adquirem nesses países,
o que em certa medida explica o crescimento do fluxo de IDE para estas
regiões. Em contrapartida , percebe-se que a Europa, Austrália,
Canadá, e principalmente o Japão têm uma rentabilidade em torno de
3,90%, ou seja, inferior a média mundial (SOBEET,1999).
Tabela
3 - Rentabilidade média das subsidiárias das empresas multinacionais
(não-financeiras) dos EUA no mundo (Controle Majoritário) média do
biênio 1995-1996 (U$$ bilhões e %)
Ranking
|
País
|
Ativos
Totais
|
Lucro
Líquido
|
Rentabilidade
sobre Ativos
|
1-lugar
2-lugar
3-lugar
4-lugar
5-lugar
6-lugar
7-lugar
8-lugar
9-lugar
10-lugar
11-lugar
|
Brasil
Chile
Ásia
sem Japão/China/Austrália
China
AméricaLatina,Brasil/Chile/México/Argentina
México
Argentina
Europa
Austrália
Canadá
Japão
|
47.575,5
12.096,0
186.468,0
8.671,5
165.969,5
30.689,0
16.029,0
1.528.050,0
68.244,5
232.155,0
179.343,5
|
4.005,5
862,0
12.589,0
546,5
10.131,0
1.862,5
806,0
60.900,5
2.720,0
8.956,0
4.305,0
|
8,42%
7,13%
6,75%
6,30%
6,10%
6,07%
5,03%
3,99%
3,99%
3,86%
2,40%
|
Mundo
|
|
2.529.087,0
|
111.717,5
|
4,42%
|
Fonte:
Survey of Current Business- Departamento de Comércio EUA, setembro
1998 pgs. 68 e 69 Elaboração: SOBEET
Dentre
os países apresentados na tabela 3, o Brasil se destaca em primeiro
lugar, como o país de maior rentabilidade média das subsidiárias
americanas no mundo, com uma rentabilidade acima de 8%, ou seja,
praticamente o dobro da rentabilidade média mundial destas empresas.
O
caso da economia brasileira
Durante
o desenvolvimento industrial brasileiro, o capital estrangeiro teve
participação na formação de vários setores da economia,
particularmente os setores de ponta, mais intensivo em capital.
Contudo, a partir da década de 1990, dado o nível de desenvolvimento
da economia brasileira, o capital estrangeiro não contribui para
formação de novos setores, mas, em grande medida, para aquisição
de capacidade produtiva instalada.
Produto
desse novo perfil do IDE, observa-se um salto no processo de
desnacionalização da economia brasileira. De uma maneira desigual,
pode-se dizer que vários setores da economia brasileira sofreram
mudanças estruturais. Vários setores, cujo controle da produção
estava sob o capital nacional, seja o privado ou estatal, passaram
para o domínio do capital estrangeiro. “A desnacionalização da
economia brasileira vai do controle dos setores de produção de
panelas à extração de titânio, da produção de aço a bancos, da
navegação de cabotagem à telecomunicações, de supermercados à
aviação, de chocolates à satélites,do transporte a eletricidade.
Praticamente nenhuma setor produtivo tem escapado ao avanço das
empresas estrangeiras sobre a economia brasileira”. (Gonçalves,1999,p.76).
Como
se procura mostrar na tabela 4, aproximadamente 75% do investimento
direto tem se destinado ao setor de serviços. Ocorre uma predominância
dos ingressos nos setores financeiro e de telecomunicações, que
representaram 47% do total. Logo, pode-se afirmar que houve um avanço
da participação do capital estrangeiro em setores antes ocupados por
empresas de capital nacional, seja estatal ou privada.
Tabela
4 - Perfil setorial do investimento direto estrangeiro no Brasil 1995-
2000 (%)
Discriminação
|
%Estoque
1995
|
1996
|
1997
|
1998
|
1999
|
2000
|
Total
Agricultura,Pecuária
e Extrativa Mineral
Indústria
Alimentos
Automotivo
Minerais
metálicos
Química
Demais
indústrias
Serviços
Comércio
Intermediação
Financeira
Telecomunicações
Serviços
prestados a empresas
Utilidade
pública-energia elétrica
Demais
Serviços
|
100,0
1,6
55,0
7,1
6,7
7,4
11,2
22,6
43,4
6,7
3,6
0,5
26,9
0,0
5,7
|
100,0
1,4
22,7
2,4
3,7
1,2
2,9
12,5
75,9
8,2
5,4
8,0
26,3
21,2
6,8
|
100,0
3,0
13,3
2,1
1,5
0,0
2,4
7,3
83,7
6,2
10,8
5,4
35,0
23,2
3,1
|
100,0
0,6
11,9
0,6
4,6
0,7
1,5
4,5
87,5
9,4
27,5
11,0
26,7
9,5
3,4
|
100,0
1,6
41,4
5,5
12,2
0,9
9,5
13,3
57,1
10,4
7,6
15,1
11,7
7,3
5,0
|
100,0
3,0
23,8
3,9
7,2
1,4
5,2
6,1
73,2
7,3
12,6
33,8
3,5
8,4
7,6
|
Fonte:
FIRCE - BACEN; DEPEC DIBAP- BACEN Elaboração: SOBEET
Os
dados apresentados apontam o crescimento da participação das
empresas estrangeiras na economia brasileira. Não se trata de um fato
recente do nosso desenvolvimento, porém, é indiscutível que esse
processo adquire novas dimensões particularmente a partir da década
de 1990. A dependência da economia brasileira não se limita a dimensão
tecnológica, comercial e financeira. A desnacio-nalização surge
como mais uma vulnerabilidade externa da economia brasileira, pois até
mesmo o processo produtivo do país passa a ser dominado por empresas
estrangeiras, comandadas pelas suas matrizes, sediadas em países
centrais.
Os
mecanismos da desnacionalização
Neste
tópico, pretende-se analisar as privatizações, fusões e aquisições,
que ocorreram a partir da década de 1990. Antes, é preciso
esclarecer que não será feito um estudo amplo a respeito dos
mecanismos acima referido. O objetivo principal é verificar o grau de
participação do IDE neste processo, analisando em que medida as
empresas estrangeiras utilizaram esses mecanismos para expandir os
seus investimentos e participar da economia brasileira.
Fusões
e aquisições
Os
dados demonstram que o processo de fusões e aquisições é em grande
medida resultado de uma dinâmica internacional. Observa-se que países
desenvolvidos concentram o volume de investimentos em aquisições e
fusões. No ano de 1998, do montante dos fluxos para fusões e compra
de ativos, uma grande parcela (88%) se destinou aos países
desenvolvidos, mantendo-se na faixa de participação registrada ao
longo desta década: entre 80% e 95% (SOBEET, 1999). Ou seja, a
concentração da atividade econômica tem se intensificado
relativamente nos países líderes do capitalismo mundial. Verifica-se
um forte processo de concentração e centralização do capital
nesses países.
Contudo,
no contexto mundial, os países desenvolvidos ocupam papel de liderança
na realização de investimentos em fusões e aquisições em regiões
externas, consolidando sua supremacia na posição compradora.
Em
contrapartida, os países menos desenvolvidos atuam em grande medida
como vendedores de ativos. Na América do Sul, o volume de fluxos de
investimentos que chega na região é bem mais importante e
significativo do que o volume que as empresas sul-americanas enviam
para o exterior para a realização de fusões e aquisições(SOBEET,2000).
Em outras palavras, as empresas estrangeiras são as grandes
compradoras de ativos da região.
Uma
parte relevante do IDE está associada ao crescente processo de fusões
e aquisições que vem ocorrendo mundialmente. Essa dinâmica
internacional condiciona também o perfil dos investimentos diretos
para a economia brasileira.Face ao perfil do investimento direto
estrangeiro, constata-se uma elevada participação de empresas de
capital estrangeiro em fusões e aquisições no Brasil. As empresas
multinacionais tem se utilizado desses mecanismos para expandir o
controle sobre vários setores da economia brasileira.
A
partir da década de 1990, em grande medida, o investimento
estrangeiro realizado no Brasil não mais contribuiu para a construção
de novas plantas produtivas. “Os anos 90 têm como característica
distintiva o fato de que, ao contrário de décadas anteriores , as
fusões e aquisições constituem o principal objetivo do IDE, em vez
de destinando à instalação de filiais e/ou construção de novas
plantas”. (Bonelli, 2000, p.65).
A
participação expressiva das fusões e aquisições no fluxo de
investimentos diretos mostram que a internacionalização da economia
brasileira foi acompanhada neste período de intensa desnacionalização.
Grandes empresas de capital nacional foram vendidas para empresas
estrangeiras. Algumas dessas empresas são apresentadas no quadro 1.
Quadro
1 - Exemplos de grandes empresas brasileiras compradas por grupos
estrangeiros:1994-98
Empresa
|
Comprador
|
País
|
Setor
|
Ano
|
Petroquímica
União
Celbrás
Adria
Continental
2001
Bamerindus
Laticínios
Avaré
Petroquímica
Bahia
Lacta
Tintas
Coral
Refrigeração
Paraná
Metal
Leve
Kenko
do Brasil
Cia
Eletrônica Celma
Paulista
Seguros
Bompreço
Dako
Lab.
Carlo Erba
Banco
Geral do Comércio
Arno
Cia.
Real de Distribuição
Veja
Engenharia Amb.
Kibon
Cofap
Gevisa
S.A Locomotivas
Agroceres
Freios
Varga
Eldorado
Phytoervas
Carlos
de Brito (peixe)
Real
Postos
Hudson
Garantia
CST/Acesita
Excel
Lojas
Renner
|
Union
Carbide
Rhodia
Quaker
Oats
Bosch/Siemens
HSBC
Nabisco
Dow
Chemical
Philip
Morris
ICI
Eletrolux
Mahie/Cofap
Kimberly
– Clark
General
Eletric
Liberty
Mutual
Royal
Ahold
General
Eletric
Searle
Santander
Seb
Sanae
Sita
Unilever
Magneti
Marelli
General
Eletric
Monsanto
do Brasil
Grupo
Lucas
Carrefour
Bristol-Myers
Squibb
Bombril-Cirio
ABN
Amro
Texaco
Crédit
Suisse
Usinor
Bilbao
Vizcaya
|
EUA
França
EUA
Alemanha
Reino
Unido
EUA
EUA
EUA
Reino
Unido
Suécia
Alemanha
EUA
EUA
EUA
Holanda
EUA
EUA
Espanha
França
Portugal
França
Reino
Unido
Itália
EUA
EUA
Reino
Unido
França
EUA
Itália
Holanda
EUA
Suíça
França
Espanha
EUA
|
Petroquímico
Têxtil
Alimentos
Eletrodoméstico
Financeiro
Laticínios
Petroquímico
Alimentos
Quim
e petroq.
Eletrodom.
Autopeças
Higiene
Aviação
Seguros
Supermercado
Eletrodom.
Quim.
e farm.
Bancos
Eletrodom.
Supermercado
Serv.
públicos
Alimentos
Autopeças
Outros
Alimentos
Autopeças
Supermercado
Perf.
e Cosmést.
Alimentos
Financeiro
Com.
Combustível
Financeiro
Siderurgia
Financeiro
|
1994
1994
1994
1994
1994
1995
1995
1995
1996
1996
1996
1996
1996
1996
1996
1996
1997
1997
1997
1997
1997
1997
1997
1997
1997
1997
1997
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
|
Fonte:
Carta Capital, 8 de julho de 1998, p.33 e imprensa.
Elaboração: Gonaçalves, Reinaldo. (1999).
Constata-se
que durante o período mencionado, as empresas estrangeiras se
utilizaram das fusões, aquisições e privatizações para ampliar a
participação na economia brasileira. Muitas empresas estatais também
foram vendidas para empresas de capital estrangeiro, processo que será
analisado no próximo tópico.
Privatizações
Quanto
ao processo de privatizações, também verifica-se uma forte
participação do capital estrangeiro na compra de empresas estatais
de vários setores da economia brasileira. Essa constatação
demonstra o novo caráter do investimento estrangeiro, que não
contribui para a construção de novas fábricas, mas em grande
medida, para aquisição de empresas instaladas no país.
A
tabela 5 apresenta dados que comprovam a elevada participação do
capital estrangeiro. Embora o capital nacional tenha sido majoritário
na compra, é indiscutível o significativo aumento da participação
de empresas de capital estrangeiro na aquisição de estatais
brasileiras.
Tabela
5 - Participação do capital estrangeiro nas privatizações
brasileiras 1991-2000 (%)
Discriminação
|
%
|
Capital
Nacional
Capital
Estrangeiro
EUA
Espanha
Portugal
Itália
Chile
Outros
países
|
52
48
17
15
6
2
1
7
|
Fonte:
BNDES Elaboração: SOBEET
No
caso das empresas estatais, o processo de privatizações de empresas
federais e estaduais, assim como as concessões foram os meios mais
importantes usados pelo capital estrangeiro para entrar no setor de
serviços. Grande parte do processo de privatização brasileiro está
relacionada a venda de empresas de energia elétrica e telecomunicações.
“Até 1995, a indústria concentrava 55% de todo o estoque de IDE no
Brasil. Nos anos seguintes, é notória a preponderância dos serviços,
com grande participação dos setores de eletricidade, gás e água,
correio e telecomunicações, intermediação financeira e comércio
atacadista e varejista nos fluxos de IDE”. (Laplane & Sarti,1999,
p.71). A venda de empresas de serviços públicos para empresas
estrangeiras no processo de privatização é também um dos fatores
que explicam as mudanças na composição setorial dos fluxos de IDE,
devidamente analisado por este trabalho.
Portanto,
pode-se afirmar que empresas estrangeiras utilizaram o processo de
privatizações para ampliar sua participação em setores da economia
antes ocupados pelo capital nacional. Em outras palavras, um forte
processo de desnacionalização.
Conclusão
A
dinâmica da economia mundial, apresentada por este trabalho, parece
confirmar os pressupostos marxistas, devidamente discutidos na teoria
do imperialismo. O pensamento marxista aponta que o desenvolvimento do
capitalismo fomenta a centralização e concentração do capital em
escala mundial, sendo esse movimento inerente ao seu modo de produção.
Como
observado no trabalho, é crescente a participação de grandes
empresas estrangeiras em diversas economias no mundo. As empresas
multinacionais sediadas principalmente em países com maior nível de
desenvolvimento econômico, comandam o volume de investimento
estrangeiro para outras regiões.
O
Brasil, na condição de economia semico-lonial, recebe historicamente
grande volume de capital estrangeiro. Quando se analisa o
desenvolvimento brasileiro, percebe-se uma participação progressiva
de empresas estrangeiras em diferentes setores da economia.
Contudo,
a partir da década de 1990, dado o nível de desenvolvimento do
capitalismo brasileiro, o investimento direto estrangeiro não possui
como característica a construção de novas plantas produtivas e
inauguração de novos setores da economia. A maior parte do
investimento estrangeiro se destinou à aquisição de capacidade
produtiva instalada, um forte processo de desnacionalização. O
capital estrangeiro amplia sua participação em setores antes
dominados pelo capital nacional, promovendo um forte processo de
concentração e centralização do capital. Verifica-se um aumento
significativo no número de privatizações, aquisições e fusões na
economia brasileira.
Várias
empresas nacionais, de diferentes setores produtivos, foram vendidas
para grandes empresas multinacionais. Ocorre um crescimento da
participação das empresas estrangeiras na economia brasileira,
processo que vem associado a concentração da produção. Estudos
apontam que das 500 maiores empresas multina-cionais, 405 já estão
instaladas no Brasil.
Por
fim, o trabalho procurou resgatar a capacidade de explicação do
pensamento marxista frente as transformações estruturais no sistema
capitalista. Conclui-se afirmando que os preceitos de grandes
pensadores como Marx, Engels, Lenin, Rosa Luxemburgo, dentre outros,
embora construídos a dezenas de anos atrás, continuam vigentes e
indispensáveis como referencial teórico daqueles que verdadeiramente
querem transformar a sociedade.
Notas
1
Ver LENIN,V.I. O Imperialismo fase Superior do Capitalismo. p.657
2
Ver MARX, K. O Capital. v.4. 327p.
Referências
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SOBEET- Sociedade
Brasileira de Estudos de Empresas transnacionais e Globalização Econômica.
Carta da Sobeet. Vários números.1998.
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