Manifesto
por um novo partido
Precisamos
de um novo partido
que unifique a esquerda brasileira
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José Domingues Godoy Filho (professor de geologia da Univ. Federal
Mato Grosso, vice-presidente do ANDES, representante do ANDES na
CoordenaçãoNacional das Entidades Servidores Federais).
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Marcelo Badaró, professor de história da Univ. Federal Fluminense (RJ)
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Cristina Miranda Silva, terceira secretária ANDES
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José Maria de Almeida, presidente nacional do PSTU.
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James Petras, sociólogo de esquerda norte-americano.
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Roberto Leher, ex-presidente do ANDES-SN.
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Antônio Luiz de Andrade `Tato`, diretor do ANDES-SN.
Opinião
Socialista - PSTU - Nº 157, 22/8/03
Em
diversos estados brasileiros, com a participação de muitos
agrupamentos políticos e militantes dosmovimentos sociais, vem sendo
travada a discussão sobre a necessidade de construção de um novo
partido socialista. Mais do que a vontade de dirigentes de grupamentos
já constituídos, é a decepção e a revolta de milhares de
militantes com o PT no governo que dá o impulso maior para esse
processo.
O
presente documento pretende somar-se à defesa da necessidade de que o
movimento pela construção do novo partido seja iniciado. Não
pretende, portanto, esgotar as discussões acerca desse novo partido,
seu programa, concepção e funcionamento. Pretende fomentar a discussão,
que se faz não apenas necessária, mas também urgente.
Um
Caminho Sem Volta
Alem
da Reforma da Previdência que o governo fez aprovar na Câmara dos
Deputados, os juros na estratosfera; o aumento do superávit primário;
a continuidade do pagamento das dívidas e das negociações da ALCA,
etc, expressa a opção do governo Lula pela defesa da “ordem”
capitalista/imperialista estabelecida em nosso país e no mundo. A LDO
enviada pelo governo ao Congresso, e o documento “Política Econômica
e Reformas Estruturais”, do Ministério da Fazenda, estabelecem a
continuidade até 2006 dessas políticas (plano “B”?), que
assimilam quase que literalmente as diretrizes do FMI e do “Consenso
de Washington II”. É o custo, a conseqüência da aliança com
empresários e banqueiros que Lula e a cúpula do PT fizeram para
ganhar as eleições e para governar.
Nesse
contexto, programas tipo “Fome Zero” e “Analfabetismo Zero”, não
passam de políticas sociais compensatórias e focalizadas (voltadas
para os mais miseráveis entre os miseráveis) aos moldes defendidos
pelo Banco Mundial. Ao invés de acabar com a pobreza e a miséria
essas políticas, se efetivadas (pois até aqui ainda não saíram do
papel), visam simplesmente evitar explosões sociais. Um governo que
faz tudo isso não está em disputa. Decidiu governar com e para os
banqueiros e grandes empresários, contra os trabalhadores.
A
Luta do Povo vai Crescer e Radicalizar: Precisa de uma Direção Política
O
saldo para os trabalhadores é o mesmo de sempre: o desemprego
aumentou; o valor real dos salários caiu mais de 10% em um ano; não
há recursos para a reforma agrária, para a moradia, para a saúde,
para o reajuste de salário do funcionalismo, e um longo etc...
Aprofunda-se a degradação das condições de vida dos trabalhadores
com todas as suas conseqüências, inclusive o crescimento da violência.
E essa situação tende a se agravar, pois a crise econômica que se
aprofunda no cenário externo e interno, leva as grandes corporações
internacionais a aumentar ainda mais a exploração dos trabalhadores
e a rapina das riquezas dos países em desenvolvimento (para isso
querem a ALCA).
Esse
cenário tende a transformar as expectativas e esperanças que a
maioria do povo ainda deposita nesse governo na mesma decepção e
revolta que atinge hoje o funcionalismo, e pode potencializar e
radicalizar as lutas sociais em nosso país. Sabemos que a mobilização
social, apesar de fundamental, por si só não assegura uma saída
positiva para a crise, uma saída pela esquerda. Vai depender dos
desdobramentos da luta de classes, da disputa com a direita e todo
tipo de reformismo que também estarão atuando nesse processo. Mas
para que haja condições efetivas de lutar por uma saída socialista
é preciso que nossa classe tenha um instrumento político, um partido
que seja o pólo consciente dessa luta.
O
PT, partido que chefia o governo Lula, é o principal responsável por
suas políticas e métodos. Perseguem os seus parlamentares que mantem
a defesa das bandeiras dos trabalhadores e apóia a agressão, pela PF,
de trabalhadores em greve e da senadora Heloisa Helena. A despeito dos
milhares e valorosos ativistas e dirigentes das lutas sociais que são
filiados ao PT, esse partido não poderá ser a direção das lutas
que virão. É o partido que hoje chefia a aplicação do programa do
FMI em nosso país e, como o governo, tampouco está em disputa. O
PCdoB, levado por sua direção apóia o governo Lula e acompanha a cúpula
do PT, acabando por padecer dos mesmos problemas que afetam esse
partido.
O
desafio da esquerda socialista neste momento, portanto, é construir
uma nova direção política capaz de preparar conscientemente esse
processo de mobilização e de conduzir essas lutas sociais com o
objetivo de realizar uma transformação socialista em nosso país.
Um
Partido Socialista, Contra a “Ordem” do FMI e do Capital
A
classe dominante clama por “ordem” e repressão aos movimentos
sociais. O governo e o PT apressam-se a responder que não tolerarão
ataques ao “Estado Democrático de Direito”. Mas, o atual
“Estado de Direito” (que de democrático não tem nada) é a
“ordem” do latifúndio, da propriedade capitalista, dos
“contratos” com o FMI e o imperialismo. A “ordem” que decreta
a prisão de José Rainha, tolera as milícias do latifúndio, permite
o roubo e envio de US$30 bilhões para fora via Banestado. A
“ordem” em que governantes se elegem prometendo mudança para
governarem com continuísmo. Essa “ordem” garante a 500 anos a
espoliação da maioria em prol da riqueza de 1% da população. Sem
romper com essa “ordem” não haverá mudança para os
trabalhadores.
As
liberdades democráticas e os direitos sociais são conquistas da
classe trabalhadora arrancadas ao capitalismo com muita luta e sacrifício.
E é de muita luta que precisamos para manter e ampliar estes direitos.
Mas a “democracia liberal”, entendida como simples acesso ao voto
e a um processo eleitoral transformado em espetáculo pelo poder econômico
do marketing político, é um obstáculo, não um caminho, para o
verdadeiro governo dos trabalhadores. A concepção de “cidadania”
limitada a direitos e deveres ou a redução do cidadão/trabalhador,
a consumidor, de mercadorias ou do “espetáculo” da política, está
longe de colocar os mecanismos de decisão mais próximos e sob
controle da maioria que vive do próprio trabalho. Apartada de
qualquer controle sobre a propriedade e a produção - origem primeira
do poder numa sociedade capitalista - a classe trabalhadora não
conseguirá encontrar o caminho da mudança simplesmente pela
participação eleitoral e ocupação de espaços no aparelho de
Estado.
Só
haverá transformação social se rompermos com essa “democracia”
do capital, para instituir uma ordem verdadeiramente democrática, da
classe trabalhadora, compreendida como todos os que dependem apenas de
seu trabalho para sobreviver, o que inclui hoje o conjunto dos
assalariados, mas também os milhões de precarizados e desempregados.
O
novo Partido que queremos construir deve privilegiar a luta e a ação
direta dos trabalhadores e não as eleições, ainda que não deva
desprezar a disputa política em todos os espaços. Deve se vacinar
contra os erros que permitiram a degeneração do PT, rejeitando alianças
com a classe dominante para ter como estratégia um governo dos
trabalhadores, sem latifundiários, grandes empresários e banqueiros.
Deve, por outro lado, primar por uma verdadeira democracia interna,
com organismos e instancias onde a base militante possa debater a política
do partido e ter controle sobre a direção e dirigentes públicos.
Unir
a Esquerda Socialista para Construir esse Novo Partido
Está
em curso um fenômeno de ruptura com o PT, de milhares de militantes
que não aceitam as mudanças vividas por esse partido. É preciso dar
um sentido positivo à essas rupturas, evitando a capitalização
desse processo pela direita, e mesmo que a decepção leve à
desmoralização e ao abandono da luta. Urge então apresentar uma
alternativa socialista, que ocupe esse espaço, unifique e mantenha na
luta socialista esses milhares de militantes.
A
anunciada expulsão dos “radicais” do PT é parte dessa situação,
que abriu objetivamente um processo de recomposição política.
Processo que vai se prolongar no tempo, na medida que há setores que
não romperão com o governo agora, mas poderão fazê-lo no futuro, e
também na medida em que se aprofunde o desmascaramento do governo e
do PT. O PSTU que agrupa uma outra parcela da esquerda socialista
brasileira, vem defendendo a necessidade de construir um novo partido
que unifique toda a esquerda brasileira. Em outros partidos de
esquerda e em diversos movimentos sociais cresce a inquietação com o
que ocorre com o PT e seus aliados no governo, indicando para a
necessidade de um novo instrumento político.
Estamos,
portanto, frente a uma oportunidade histórica, que é a de fazer com
que a recomposição em curso resulte na unidade da esquerda
socialista, construindo uma alternativa política superior a todas as
existentes hoje. Não se trata de vontade desse ou daquele setor.
Trata-se de enfrentar os desafios da luta de classes no quadro político
que se avizinha no país. Nenhum dos setores da esquerda socialista
brasileira está hoje em condições de dar conta sozinho desses
desafios. A dispersão dos socialistas neste momento, teria conseqüências
trágicas. A unidade se impõe como necessidade da nossa classe, e
cobra responsabilidade de todos nós.
Precisamos
somar nossas forças para lançarmos no prazo de tempo mais curto possível,
um Movimento pela Construção de um Novo Partido, que se constitua
como alternativa para agrupar toda a militância de esquerda, e seja
um espaço para unificar e impulsionar as nossas lutas e as discussões
que nos permitam definir democraticamente qual será a concepção, o
programa e o funcionamento do partido que queremos construir. Os que
assinam esse Manifesto querem tomar essa iniciativa juntamente com
todos os setores que assumam também esse desafio, sem nenhuma
preocupação com paternidade da idéia ou de monopólio da
iniciativa.
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