Alguns
apontamentos sobre o Novo Partido
MES-RJ–
Movimento Esquerda Socialista do Rio de Janeiro
BCS – Bloco Classista e Socialista (CST/MTP = Corrente Socialista
dos Trabalhadores/Movimento por uma Tendência Proletaria)
Esta
é uma contribuição aos debates em torno da construção de um novo
partido da classe trabalhadora travado em nosso país. Não se trata
de um texto pronto e acabado senão que reflete as elaborações, dos
que subscrevemos, a partir da experiência viva nos debates com
diversas organizações, grupos, dirigentes e ativistas.
Os
quase dez meses do governo Lula, são fartos em demonstrações de que
a política do núcleo dirigente do PT provocou uma mudança
definitiva no partido. De oposição mais ou menos firme ao
neoliberalismo, o partido transformou-se em pilar principal de
sustentação dos planos capitalistas. Integrou-se completamente ao
regime político burguês brasileiro, um regime antipopular, marcado
pelo fisiologismo e pela sustentação de relações dependentes com
os banqueiros internacionais e com o sistema capitalista imperialista
dominado pela burguesia norte-americana.
Esse
curso do partido é irreversível porque a decisão do núcleo
dirigente não é expressão apenas de um erro de percurso, de uma tática
mal pensada ou de uma correlação de forças impeditiva de outro
rumo. É uma estratégia consciente, assumida, correspondente à
defesa de interesses e privilégios de uma casta burocrática. Uma
casta na qual seus principais setores, via a
gestão de distintas esferas do estado burguês, a administração
dos fundos de pensão e as relações com os grandes empresários,
buscam se converter diretamente em novos burgueses. Para isso precisam
de um novo PT, como Tony Blair fez na Inglaterra montando o novo
trabalhismo associado com os interesses de Washington.
O
novo PT que interessa para o núcleo dirigente deve apagar da memória
dos trabalhadores a independência de classe, que o PT das origens
demarcou na política brasileira. Deve, também, atacar todo o espaço
de democracia interna e participação da militância nas decisões
políticas. Para isso, a expulsão de membros de esquerda que não
assumem a política do novo PT é uma premissa que visa sinalizar para
o conjunto da militância, dos trabalhadores e, especialmente, da
burguesia que o PT é um bloco monolítico, no qual as posições do núcleo
dirigente são incontestáveis.
Diante
desses fatos, a construção de um novo partido torna-se uma
necessidade. Não só para a vanguarda que antes atuava no PT, mas
para a classe trabalhadora brasileira que procura uma alternativa ao
espaço que outrora ocupava o PT. A discussão sobre o novo partido
deve levar em conta o estágio de desenvolvimento, construção e acúmulo
da classe trabalhadora e das diversas correntes e protagonistas desse
movimento pela criação dessa nova ferramenta. Mais que isso, deve
incorporar e superar as experiências que tivemos com o PT e com
outras organizações políticas, evitando a repetição de seus erros.
O
PT, em sua fundação, teve como marca a questão da independência de
classe. A classe trabalhadora precisava de um partido para representá-la.
E só a ela. Nesse sentido, a composição do partido deveria ser de
uma base social vinculada à classe trabalhadora e à juventude. Nas
eleições, o PT impulsionou campos de aliança com os partidos que
também representavam esta classe (à época, PCdoB e PCB). Ocorre que
este valor fundamental foi abandonado no decorrer dos 23 anos de vida
do PT e faz-se necessário resgatá-lo. O novo partido deve ser da
classe trabalhadora, composto, dirigido e voltado para ela. Logo, as
possíveis coligações para se apresentar nas eleições devem se
limitar a um arco de alianças com os partidos que não defendam os
interesses da burguesia.
Na
questão do programa, acreditamos que a classe trabalhadora já tem um
acúmulo das últimas duas décadas. É preciso se debruçar sobre
esse acúmulo e apontar falhas e desvios que a direção do PT buscou.
Defendemos que esse novo partido seja classista; compreendendo que não
basta ser apenas um Partido dos Trabalhadores, que, além disso, é
fundamental combater as concepções e a política de governar com os
capitalistas, os banqueiros, latifundiários, ou seja, de governar com
a burguesia, assim há que lutar pela construção de um governo dos
trabalhadores. Que seja anticapitalista porque estamos convencidos que
o capitalismo apenas reserva mais miséria e fome, ameaçando a existência
da própria espécie humana. Assim o programa tem que abordar pontos tais como a: Reforma Agrária sobre controle
dos trabalhadores, estatização do Sistema Financeiro, reestatização
das empresas privatizadas e a redução da jornada de trabalho sem
redução de salários. Que seja antiimperialista porque o
imperialismo é a expressão máxima da força destrutiva do capital,
sua lógica bélica e parasitária levada às últimas conseqüências.
É necessário romper com o imperialismo, com o Fundo Monetário
Internacional, com a ALCA e construir laços de solidariedade com
outros países, particularmente na América Latina, com Cuba, com a
Venezuela, com a Argentina. Ou o país estará condenado a ficar cada
vez mais próximo da condição
colonial. Que seja socialista, é necessário superar a barbárie que
nos reserva o sistema capitalista imperialista, lutando pela construção
de uma sociedade sem explorados nem exploradores, em escala mundial.
Temos então que lutar pela destruição do estado burguês,
impulsionando as mobilizações de massas, único caminho para as
transformações radicais da sociedade. Incorporando estes marcos
fundamentais, precisamos compreender o programa como uma tarefa em
aberto, cujo debate precisará avançar, no próximo período, para
abarcar outros compromissos emancipatórios, como a luta contra a
opressão das mulheres, o combate ao racismo, a luta dos GLBTs e a
questão ambiental
Além
disso, a questão da democracia interna, que foi tão importante nos
primeiros anos para a construção do PT também deve ser resgatada.
É fundamental que o novo partido assegure a mais ampla democracia,
garantindo o direito à organização de tendências internas que
expressem as diferentes sensibilidades sobre seus rumos, bem como a
participação efetiva do conjunto dos militantes nos processos de
debate, elaboração e tomada de decisão.
Essa
democracia pressupõe ainda a existência de uma direção escolhida a
partir de um processo que assegure um amplo e profundo debate acerca
das escolhas fundamentais do partido e que se garanta a
proporcionalidade em caso de existência de diferentes posições. No
entanto, para que esse processo se estabeleça e não signifique um
esmagamento das posições minoritárias, deve haver uma primeira fase
em que as decisões mais importantes sejam tomadas por consenso ou por
uma ampla maioria (3/4, por exemplo), de forma que também o necessário
pluralismo seja não apenas respeitado, mas fundante desta nova experiência.
A partir do avanço real dos debates e da construção dos mecanismos
de participação democrática é que se poderá ir avançando para a
tomada de decisões por maioria, sempre assegurando os direitos democráticos
das eventuais posições minoritárias.
Uma
nova ferramenta só se diferenciará do PT e poderá conquistar o espaço
deixado por este se priorizar a luta dos trabalhadores. O novo partido
deve estar voltado para a intervenção nas lutas, greves, ocupações,
mobilizações do dia-a-dia. Mais que isso, ele deve ser parte
integrante e impulsionadora destas lutas. Em nosso ver deve batalhar
pela conformação de blocos, frentes, correntes sindicais que travem
a luta contra as direções políticas e sindicais burocráticas e/ou
governistas no interior dos sindicatos, das centrais, das organizações
da juventude, para contribuir e incentivar a mais ampla democracia,
que é a melhor ferramenta para impulsionar as mobilizações.
Batalhando, assim, para construir uma nova direção política e
sindical dos trabalhadores e da juventude brasileira Acreditamos que
as transformações políticas, sociais e culturais necessárias para
nosso país só serão alcançadas através da luta direta dos
trabalhadores e da juventude. Não será através das eleições que
vamos mudar a vida dos trabalhadores e do povo.
A
participação nas eleições será um espaço para demonstrar e
denunciar as mazelas do capitalismo, apontando para a construção de
uma nova sociedade, uma sociedade socialista. O novo partido, além de
priorizar a atuação e o impulsionamento de novas lutas, deverá, em
nossa opinião, participar ativamente das eleições.Principalmente
porque, no Brasil, esse momento pode ser muito importante para ajudar
a impulsionar as lutas e para a politização de enormes setores da
sociedade. Permitem um
contato com milhões de trabalhadores, além de ser um importante espaço,
para os revolucionários, de disputa com a burguesia
Porém,
ao contrário do PT, os parlamentares do novo partido deverão prestar
contas ao partido. Deverão estar subordinados às decisões
democraticamente tomadas pelo partido, de sua base e de sua direção.
E não o contrário. Isso significa não só um controle financeiro
dos mandatos do partido, como também um controle político das ações
dos parlamentares. Conquistar postos no parlamento brasileiro – seja
ele em nível federal, estadual ou municipal – pode ter um peso
muitas vezes decisivo na conjuntura política brasileira, vide o caso
dos chamados radicais. Por isso, o novo partido será uma alternativa
real para a classe se disputar esses espaços. Mas isso será uma tática,
e não um fim em si mesmo.
Para
organizar a luta, e atuar sobre os parlamentares, a participação da
base é fundamental no novo partido. É necessário o funcionamento de
núcleos de base por cada local de trabalho, estudo, moradia ou área
de atuação. A base deve participar ativamente deles. Será nesses
espaços que se discutirão a construção de novas ações políticas
do partido em cada um desses setores. Além disso, os núcleos terão
um papel de formação política, além de garantirem a circulação
das informações fundamentais da vida interna, sem as quais a
democracia torna-se mera formalidade.
Esses
núcleos de base farão a ponte de ligação de cada luta, de cada
atividade com a vida do partido através da direção que deve ser
eleita por congressos que discutam a fundo a política e a estratégia
do partido. Serão esses núcleos também que permitirão um maior
controle sobre os parlamentares. Os núcleos são uma conquista democrática
da origem do PT e não por acaso foram gradualmente extintos pela direção.
A
existência de correntes internas é um fator de tensionamento
positivo, extremamente positivo.São as correntes que permitirão ao
partido um maior controle sobre si mesmo, discutindo e apontando
divergências. Ademais, o novo partido surgirá da unidade de diversos
setores, com distintas tradições ideológicas e táticas. Será a
unidade de militantes e ex-militantes do PT, do PSTU, de outras
organizações, além de militantes e intelectuais independentes com
distintas opiniões. O novo partido, se quiser acumular em sua construção,
deve perceber que a necessidade de correntes de pensamento permanentes
é fator decisivo para alcançar essa unidade.
Para
não concluir, já que a discussão do novo partido deverá ser uma
construção de todas e todos queremos tocar num dos pontos
importantes dessa discussão: a questão da legalidade. Nós
defendemos que o novo partido deve ser legalizado desde já. Isso para
nada significa que as discussões de funcionamento, caráter e regime,
do novo partido já estejam concluídas. Acreditamos que estas discussões
devam ocorrer paralelas à disputa por legalizar o novo partido, não
só utilizando as eleições de 2004 para essa árdua tarefa, mas
utilizando o espaço que se abre com as expulsões dos parlamentares
radicais. Legalizar desde já, também não significa necessariamente
que não haja um prazo mínimo para que entremos em acordo sobre o
nome e os elementos programáticos básicos já elencados. Mas isso
deve ser feito no menor prazo possível, para que entre todas as
organizações e demais protagonistas desse processo, alcancemos a
legalização dessa nova alternativa. Esta não é uma mera
formalidade, mas uma condição necessária para garantir um processo
em que haja igualdade de condições para os debates fundamentais que
teremos que enfrentar. Do contrário, iniciaríamos mal esta caminhada,
estabelecendo um espaço no qual uns têm a estrutura legal garantida
e outros ficariam indefinidamente dependentes desta. Um processo que
se iniciasse de forma tão desigual teria francamente comprometida a
possibilidade de ter resultados positivos para a classe trabalhadora
brasileira.
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